Os dias
Um dia ela acordou. Não sabia que seria assim. Após anos de sofrível lamento, deu-se conta de sua mediocridade. As paredes estavam sujas. A velha escada já não tinha o brilho de sua finada juventude. Olhou, não com desdém, mas o rancor dos acontecimentos a levou para tempos passados. À sua volta, não mais estavam todos aqueles a quem amara um dia. Teve um súbito pavor logo que tomou ciência de sua solidão. As velhas lembranças já não mais a confortavam. Suas antigas fotografias, já amareladas pelo tempo, escarneciam as poucas esperanças que lhe restavam. Absorta, percebeu naquela fatídica manhã algo estranho. Não à sua volta, mas sim nela mesma. Não se reconheceu no espelho. Os olhos. O cabelo. Não era ela. Talvez a mera projeção de seus devaneios. Não tinha cabeça para pensar nisso. Voltou para a cama. Era um lugar seguro. Podia sonhar sem medo. Caso não a agradasse, bastava acordar.