AMOR DE ÍNDIO

Em uma Aldeia da tribo dos Bororós, duas crianças índias conversam. Vamos entender o que dizem:

CURUMIM= Lua Clara, meu pai, o Cacique Baraúna Negra, da grande tribo dos Tapuias, quer me mandar para a cidade aprender a ler e escrever a moda dos brancos. Ele quer que eu seja um grande Chefe, e com isso, grande tristeza está cobrindo coração de pequeno índio.

CUNHATÃIM= Não vejo porque Arara Branca precisa entristecer o coração. Meu avô, o grande Muaba, diz que na cidade, tudo é muito bonito; tem grande Taba que sobe para o céu! Coisas grandes que soltam fumaça, e boa comida.

CURUMIM= O grande Muaba mente! Ele nunca foi lá...

CUNHATÃIM= Foi sim! O padre missionário branco, no tempo da peste, levou ele pra casa de rezar bem lá no meio da grande cidade.

CURUMIM= Ele tava doente e magro; O grande Muaba tinha o corpo feito fogo.

CUNHATÃIM= Ele viu! Ele viu o grande pássaro de aço que parecia prata. Ele entrou no pássaro.

Eu sei, tiveram que amarrar o grande Muaba para que ele entrasse no grande pássaro;

ele gritava que o deus do vento ia castiga ele por ter se misturado nas vísceras do grande pássaro.

CURUMIM= Toda a aldeia Tupi conta essa história, de como ficou a cara comprida do grande Muaba.

CUNHATÃIM= A cara comprida do grande Muaba ficou tufada de pavor quando em vez de vísceras ele topou com bancos macios e mulher branca de cabelos cor de ouro ( risadas )

CURUMIM= É, na grande cidade está cheio dessas coisas que a gente não espera.

CUNHATÃIM= É por isso que Arara Branca está com medo?

CURUMIM= (zangado) Lua Clara se engana! Arara Branca, futuro chefe da grande tribo Tapuia, não tem medo de nada! Nunca ter medo de nada!

CUNHATÃIM= Então vai! Aprende as coisas dos brancos e faz de tua tribo mais forte ainda.

CURUMIM= Boas palavras as tuas Lua Clara. Boas e sábias, ditas pela filha do grande chefe dos Bororós, que um dia se unirá a grande Nação Tapuia.

CUNHATÃIM= Lua Clara não é sincera Arara Branca! Lua Clara está com o coração tão negro como o teu.

CURUMIM= agora Lua Clara sabe que não é medo que Arara Branca sente, é a tristeza de ter que deixar tudo isso; a pesca no rio que desce pra as largas águas do oceano, os banhos quentes quando a lua tá cheia no céu, a alegria das grandes caçadas, a peleja das corridas até o cimo dos morros, e, horas como estas, em que a mais linda das cunhantãim dos Bororós, arreia seu cavalo no pé de gravatá, tão bela como a flor que margeia o riacho, e se deixa cobrir pelos olhos tristes e anuviados de lágrimas do futuro chefe dos Tapuias.

CUNHATÃIM= que isso fique na tua cabeça mas que não sirva de empate pra tua longa viagem Arara Branca. A tua cunhatãim Lua Clara, vai te esperar até que tu voltes com toda sabedoria e ainda cheio de amor, pra que isso possa unir e fortalecer ainda mais as duas Nações.

CURUMIM=Escuta, o anú está cantando!

CUNHATÃIM= Para com isso, ave agourenta! ( abraça o jovem índio ) Não se apoquenta com isso Arara Branca, é o tempo de estiagem, o sol está muito quente!

CURUMIM= ( com um sorriso triste nos lábios ) Pobre Lua Clara, não te esforces tanto, nada vai tirar da cabeça do grande cacique, que seu filho Arara Branca deixe de ir pra cidade.

Agora vai, que a lua já se mostra no céu, logo estará noite e os perigos da mata se farão maiores.

CUNHATÃIM= Sabes que não tenho medo, também sou filha de chefe valente, minha tribo venceu muitas guerras; sei me defender.

(Curumim foi para a cidade e fez-se homem. Os anos passavam rápidos e Arara Branca, agora com seu novo nome Ailtom Brasil, com seu diploma de Agronomia regressava a sua Tribo, cheio de orgulho e satisfação. Seu irmão Toba, acompanha os passos apressados do índio doutor, que ia eufórico rumo ao tão esperado encontro.)

TOBA= Por que precisas te vestir assim? a maneira dos brancos?

Ailtom= Para mostrar a Lua Clara, quero que ela me veja do jeito que eu andava lá na cidade. Parece que estou vendo...ela vai sacudir as grossas tranças negras, mostrar os dentes de marfim, num sorriso divino e dizer: - Arara Branca virou branco! -

TOBA= Lua Clara não vai vim.

Ailtom= Não diga asneiras Toba! Ela deve estar ansiosa por me ver. Deve ter-se sentindo-se só aqui na mata. Ninguém puxava-lhe as tranças melhor do que eu. ( ri ) nem passava rasteiras para que caísse no lago...

TOBA= Lua Clara partiu para a terra dos mortos.

Ailtom= ( com os olhos arregalados segurando o indio pelo pescoço ) Que brincadeira é essa? Olhe, com isso não se brinca Toba! Diga que é mentira! ( empurra o outro que cai sentado ).

TOBA= Toba não mente! Que importa se o coração de Arara Branca vai estourar dentro do peito! Lua Clara se foi... está lá...está lá junto do pé de graviola!

Ailtom= ( esconde o rosto entre as mãos e chora desesperadamente. num ímpeto sai correndo,para no mesmo lugar que sempre estivera, ao se encontrar nas tardes de sol, com sua indiazinha. Grita gesticulando: )

Não vai haver festa ouviu Lua Clara! Nunca mais vai haver festa! Por que me deixastes? Não me esperou...vê como estou falando mais bonito? Esforcei-me tanto Lua Clara, pra te mostrar, só pra ti mostrar. Não me interessa mais nada agora. Lua Claraaaaaaaaa, precisas me escutar! Leva-me para onde te encontras.Que país encantado é esse? Que floresta mágica é essa que negas a repartir comigo, Lua Clara? Deixei meu coração preso nas paineiras junto com tuas promessas e agora deixas minha alma massacrada a vagar entre as árvores? Nunca te julguei tão perversa! Tu, que eras como o orvalho a refrescar a esperança que acalorava o meu futuro. Te foste, quando te imaginava aqui, amarrando teu cavalo nesse gravatá bandido, portador de todos os meus segredos. Lua clara, volta! Se não vieres como eu espero, juro que mergulharei até o fundo do rio e ficarei lá até que os espíritos dos meus antepassados me venham buscar, para me levar onde estás a zombar de mim, que despedaço agora...Lua Clara.

(Em meio aquela agonia, ele escuta a voz da índia suave e cristalina )

LUA CLARA= Não faça isso grande guerreiro tapuia!

Ailtom= Lua Clara!? Meu Deus, Tupã seja louvado! Lua Clara!

LUA CLARA= ( se mostrando inteira com uma luz de estrela azulada ) Adquiriste tanta sabedoria Arara Branca, e, no entanto, pareces um menino bobo que não sabe de nada. Olha pra mim! Não deixei minha tribo, mas deixei de ser tua Lua Clara. Sabes disso. Sei também que jamais serás o Chefe da Grande Nação Tapuia. Teu destino não está aqui, Arara Branca, tu agora és; Ailtom Brasil e serás mais útil como Ailtom Brasil do que como Arara Branca. Segue teu caminho, tens muito ainda a desbravar...

( Sentado na poltrona confortável de seu apartamento em Laranjeiras no Rio de Janeiro, o Professor Ailtom dizia pacientemente aos dois filhos, enquanto sua esposa Célia sorria em frente a TV.)

AILTOM= E assim termina a história, agora já para o banheiro escovar os dentes e cama, os dois, amanhã tem colégio cedo. ( As crianças vão para o banheiro, e Ailtom vai à janela; uma grande lua pairava no céu de setembro, ele pensou; onde quer que estejas minha Lua Clara, sei que velas por nós. )

Rose Arouck
Enviado por Rose Arouck em 07/12/2006
Código do texto: T311998