FRAGMENTOS - ÚLTIMO DESEJO
...Por favor, ouça-me. Vês o semblante triste da natureza que nos cerca? Não atribuas a mim, este vermelho-alaranjado que grinalda esta tarde agonizante nos braços de um amante que a abandona todos os dias; a melancolia que se esparrama dos pardais que nos rodeiam, em seus gorjeios crepusculares prenunciando, admita, a sentença fatídica que dependurada em tua úvula será varrida garganta afora como um ciclone, levando-me aos ares em louco abandono. Poupe-me mais um pouco, por instantes, antes que decepe meu sonho de possuí-la, com a cimitarra afiada do desengano. Assista-me o desejo de, pela última vez, ofuscar-me nestas duas esmeraldas que relampejam em tuas faces; de estar perto destas margens vermelhas que emolduram tua boca e não tê-las tocado; do teu colo, onde erguem-se as gêmeas, desejadas por este infortunado, vê-las seguindo inexpugnáveis. Rogo-te, seja breve em tua execução. Anda, degola-me e aos meus sonhos, antes que o sol se ponha. Não suportarei um outro amanhã. É triste morrer-se duas vezes, de desprezo, de solidão..."