Pequenino e falante
Ao entrar no ambiente sagrado da inocência, da vontade de vida; tive certeza que ali poderia mais que um pouco. Era a mesma sensação que já possuíra, quando por vezes estive nos mesmos lugares, mas a experiência me deixava mais íntima com minhas próprias crenças de que tudo acontecia por ali. Essas certezas, possuí, quando vi descer da escada uma senhorinha , já com as marcas da vida na face , e trazia consigo um belo sorriso que me lembrava minha avó na infância. A sensação, é que o coração daquela velha era maior que o meu, e que já havia realizado, o que ali eu tentava fazer tão pouco. Abraçava o mundo com aqueles bracinhos poucos, e minimizava as suas mazelas.
A festinha que organizávamos trazia consigo, uma vontade escondida de ajudar mais do que levávamos ali naqueles balões e balas. Era a vontade do palhaço que sorria em disfarce para trazer a alegria de quem se contentava com tão pouco. Mas de cada um dos rostos de que pude ver ali: menina que já era mulher, menino que já tinha modos de homem, criança que tinha os olhos lânguidos e trêmulos, rostos felizes, rostos com medos tão vastos e profundos. Um apenas me chamou a atenção.
Era um pouco franzino, pequenino e falante. Lembrava-me um daqueles personagens de desenho animado de minha infância. Mas tinha um olhar longe, leve e quase triste. O sorriso que contrapunha em sua face, fazia-me vibrar e querer para aquele menino o que eu possuía. Aquele corpinho pequeno fazia as atividades com tanta vibração, com tanta vontade. Era como se quisesse tomar num gole só, toda a alegria que sentia, como se quisesse ter tudo de uma vez, para que não lhe fugissem as oportunidades que estavam em frente a seus olhos. Pintava com tanta vontade, comia seu pão com tanta velocidade e falava como se pudesse externar toda a sua felicidade.
Não sei como, mas eu amava aquele menino. Olhava-o como se fosse alguém que quisesse para mim, para ajudar, para pender ao alto no topo do mundo. A felicidade que tinha, com tão pouco, foi me deixando tonta de nostalgia e remorsos. Encostei meu corpo na parede, e inteiramente inerte, passei a olhar somente aquele menino. Que me fazia sentir coisas tão viscerais, fazia brotar em mim sentidos inesperados. Chorei por dentro, e comecei a conversar baixinho, com a alma daquela criatura.
Não sei por quanto tempo, fiquei ali observando-o . E nem descreveria ao certo o que senti. Mas percebi, que daqui a algum tempo, aquele mesmo menino inocente e feliz; traria a brutalidade de quem poucas oportunidades tem nesse inferno de mundo. Endureci-me no lado esquerdo do peito. Não admitiria que aquele mesmo menino de uns 4 anos de vida, que amava ali sem pretensão, viraria e não teria as mesmas oportunidades que eu sentada ali tivera. Tive ímpetos de chorar.
Fui bem devagar até seu lado, desci para nivelar-me à sua estatura. E quase como um processo, sorri para ele e o abracei. Saí dali, pois não suportaria nem mais um minuto. Sozinha e feliz, chorei por dentro.