Saciado

Saciado

Por Ramon Bacelar

A leitura alimenta a escrita, a escrita a leitura, ciclo infindável neste abismo de troca e retribuição: quanto mais se sabe menos se conhece, mistério atrai mistério, excesso de luz ofusca e na escuridão já se está perdido de antemão: a saída que não é saída.

A fome continua, as palavras enfileiram ansiosas para o momento da execução, o carrasco abre os dentes e afia as lâminas. Enganadoramente saciado as regurgita, revisa o texto, não se satisfaz, luta por controle autoral mas, rebeldes que são, caem pela tabelas, modificam a pontuação, se disfarçam como meros borrões de tinta, rearranjam parágrafos e nesta guerra de identidades entre criador e criatura, o papel em branco espera por algo que lhe ofereça algo mais além da alvura e vazio.

Não saciado prossegue, guerra-relâmpago continua, enche-se de palavras, enche, "se enche...", não preenche, transborda e vomita, tenta novamente e em meio a troca sente

a energia vital se esvair, os dedos enfraquecem, a mente vacila e com a visão turva, consumido pela misteriosa força vampírica composta de 23 substâncias, ainda tenta porque vive, porque precisa...não está saciado.

FIM

Ramon Bacelar é contista, crítico e ensaísta. Mantém um blog sobre cinema, quadrinhos, literatura e cultura underground (Maquinário da Noite: www.maquinariodanoite.blogspot.com) e publica contos no Recanto das Letras: http://www.recantodasletras.com.br/autores/ramonbacelar e em seu site pessoal Miragens Ofuscantes: http://www.miragensofuscantes.blogspot.com

Ramon Bacelar
Enviado por Ramon Bacelar em 17/05/2010
Reeditado em 19/05/2010
Código do texto: T2262115
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