A Invenção do Tempo

O tempo, realmente, é uma coisa que não existe, pensou, enquanto, mais uma vez, se preparava para dormir.

Conhecia de cor a rotina do sono, conhecia todas as rotinas, e as mais perturbadoras eram as do dormir e do acordar, momentos difíceis comparáveis ao entrar e sair de um mar escuro, um mar grego e cheio de mistérios.

Sobreviver, acordar no dia seguinte era questão de confiança, e ele confiava como se ainda fosse criança.

Rezou, não que fosse religioso, mas porque era rotina, fora condicionado desde pequeno a rezar e dormir.

Lá fora o mundo continuava a rodar e o sol a brilhar, e em algum lugar um buraco negro estaria engolindo toda a matéria e energia circundante e invertendo tudo o que se considera estável e colocando o universo ao contrário, novo e revigorado, do outro lado do funil, e reinventando o tempo, e este passaria a escorrer como se o cosmos tivesse sido recriado a partir do nada, novinho em folha, isento de pecados e de sofrimento.

E ele dormindo.