CABO DE PANELA QUEIMADO
Assim que o galo cantava pela primeira vez, seu Jaime se levantava. Botava água na chaleira para passar o café. Acendia o rádio de válvulas e sintonizava no programa de moda de viola. Só então, limpava as gaiolas e tratava de seus canários. Reinava esta rotina há mais de vinte anos. Até que um dia, uma manhã de inverno igual a tantas outras viu a vida do velho sertanejo tomar um rumo sem volta. Naquelas paragens agrestes, a noite caiu suave e gélida. Seu Jaime permaneceu o dia todo parado sob o batente da porta de entrada de seu casebre. Sob os pios do coro dos pássaros agitados que se misturavam ao Guarani solene da Voz do Brasil, a lua cheia mirava um homem mergulhado no outono de sua vida, refém de um surto de Alzheimer. Enquanto isso, a fumaça emanada pelo cabo da panela queimado empestava o ar e defumava aquele cenário inesquecível.