Mar de Confidências
Esperava que lhe dissessem o que seria o certo naquele exato momento. Foi quando se descobriu sozinha. Não pela criação da própria formalidade que possuía volta e meia. Mas pela utopia que diariamente tentava fingir viver. Não, não ouve um lançamento nesse mar, acordava sempre pensando que pressentia algo maior. Naquele dia, sem muitos devaneios, precisava se encontrar com a terra e com o céu. Saiu de casa lá pelas 4 da manhã, e começou a andar na praia. Junto de si, apenas possuía a vontade de não mais querer e uma garrafa de vinho italiano. Se quisesse, teria pra si, toda aquela paisagem, poderia respirar ou interiorizar em um gole só, todas aquelas sensações. O vento batia forte em sua face. Descobria-se cada vez mais inteira, podia sonhar em arriscar de modo diferente. Mas havia uma melancolia que fora recalcada pelo tempo, uma nostalgia que por não saber de onde vinha a transformava. Não sabia mesmo explicar se era de todo bom ou ruim, mas percorria-lhe a espinha num friozinho que era puro êxtase. Pelo temperamento diriam que não pertencia a esse mundo. Por um instante apenas, ainda com a claridade guardada pelo escuro, pode ouvir o mar sem vê-lo. Aquela sensação era mesmo mais intensa, que todas que havia vivido, porque a sua decisão já estava tomada. O coração palpitava, indo e vindo parecendo-lhe saltar peito afora, prestes a romper com a mente. De tão misterioso, aquele momento tornou-se o mais prazeroso de sua vida. Num vazio de gente pelas areias, jogou a sua garrafa por ali, e foi entrando mar afora. A água era demasiadamente gelada, foi seguindo e os pés se misturavam na areia daquelas ondas calmas. Subiu a saia e foi entrando mar afora. Subia-lhe entre as pernas nuas uma sensação de aprofundamento. Foi-se tornando rígida, as pernas se anestesiavam. Precisava daquilo, precisava mais uma vez, marcar seu encontro direto com a vida, esse era o segredo. A água já lhe batia na cintura, sentiu ali, naquele instante que a sua vida tinha mudado. Não pelo fato do contanto com a junção do mar e o céu. Nem mesmo pela areia gelada em que pisava. Mas porque depois de ali estar, se entendia. Era talvez mais que isso, o mar lhe entendia, a vida lhe passava por entre as entranhas, e existia uma confidência de sentidos. Já lhe bastava. Saiu da água quase a flutuar, era de todo leve e sua, pela primeira vez na vida, havia se encontrado com uma outra metade de si.
Sentou na beira do mar, e tomou sozinha aquela garrafa de vinho. Não mais poderia se embriagar, o mar já lhe havida concedido sem esforços isso. O vinho lavava a sua alma, purificava o sangue e tinha certeza que dali por diante podia amar. Mas era um amor até então desconhecido esse que os Deuses davam-lhe agora. Olhava ternamente o horizonte, e sem maiores sobressaltos, caminhou devagar até a sua casa. Tomou um banho, vestiu a sua melhor camisola. E sentou-se em um pequeno sofá que ficava no quarto. Ficou a admirar o companheiro. Apenas para poder dizer a ele o que a muito não dizia. Ele acordou, ela sorriu e disse: EU TE AMO.