O PERIGO MORA AO LADO
Se conheceram no baile fanque. O cara lourinho ficou louco com a menina morena de saia preta curtíssima, cheia de correntes, cabelo empastado de gel. Ela deu mole e ele chegou junto. Ficaram! O tempo todo se agarrando, se esfregando. Um vexame, diria quem não gosta de ver aquilo. Se jogaram mesmo! Contudo, para os dois, álcool transbordando pelos poros, estava tudo em cima. Clima a favor. Ambiente escuro, labirintos, música alucinada e outras coisas mais que a sua imaginação possa alcançar. Deitaram e rolaram, como se diz. Aqui você não deve considerar a palavra deitar no sentido etimológico, porque seriam pisoteados pela multidão que se aglomerava, se movimentava e se contorcia no ritmo louco da música.
No final da noite, quer dizer, de manhã, o rapaz propôs deixá-la em casa. Ela aceitou. Contudo, não queria dar o endereço, afinal, se conheceram na balada.
Assim, já chegando ao bairro, a menina encontrou uma solução para despistá-lo.
- Aí brô, pare aqui... valeu! Moro ali! - apontou para uns casarões que se mostravam imponentes, quase uma afronta às humildes casas vizinhas e à favela a algumas ruas adiante.
- Uau, gata! Aqui? “Cê tá com tudo e não tá prosa”. Onde? Diga lá! – o lourinho caiu na gargalhada sem motivo aparente. Exalava puro álcool, mas ela sobreviveu porque o seu conteúdo etílico estava bem superior àquele bafo.
- Lá! – apontou vagamente para uma das casas, tipo condomínio fechado, numa rua sem saída. Depois, explicando melhor:
- De boa! Não é legal meu pai me ver chegar com você. E mamãe é um chute! Sacou, véi?
- Só... gata!
Eram 5 da matina. O rapaz estacionou, concordando.
Os dois ainda deram mais uns amassos. Depois, a garota mordeu o lábio dele e saiu apressada do carro. Como a rua não tinha saída, o rapaz deu ré, subindo no passeio, fez a manobra e desapareceu.
Constatando que agora estava mesmo sozinha, a garota, puxando a minúscula saia pra baixo e tirando as correntes que refletiam intensamente os raios do sol, fez meia volta, entrou num beco e se encaminhou pra casa, que ficava na boca da favela, bem distante dali.
Andou muito. Caminhava com dificuldade porque a sandália arrebentou, mas valeu à pena. O cara não ficou sabendo que ela morava naquele lugar horroroso. Por fim, exausta de tanto andar, chegou na rua onde morava.
Foi então que viu um tumulto. Carros da polícia estacionados e policiais “armados até os dentes”, prontos para entrar em ação. Parecia que o Batalhão havia se mudado para o outro lado da rua. Surpresa, ela reconheceu o rapaz louro, algemado, queixo enfiado no chão, de maneira que não enxergava nem um palmo diante do nariz. Quase desmaiou de susto.
Na sequência, um policial ergueu o cara e encaminhou-o para uma viatura estacionada transversalmente sobre o passeio; outros policiais saíam de dentro da casa carregando caixas de papelão.
Apressadamente, ela abriu o pequeno portão de madeira e entrou. E disfarçadamente, atrás da cortina, passou a observar tudo que ocorria lá fora, não perdendo nenhum detalhe da operação.
A cena que se apresentava aos seus olhos lhe trouxe uma constatação: tão cedo não veria o cara lourinho com o qual botou pra quebrar na balada.
Ei você! Fala aí!!! Tu acha que depois dessa, a guria ainda vai dar mole na balada? Xaqueto!
Estou esperando sua visita no Canto do Escritor.