CENAS DE UM CASAMENTO

Eu era muito namorador. Acho que foi por essa razão que ela não acreditava que estivesse apaixonado. Assim, levei bastante tempo para conquistá-la. Quando consegui, tive que provar diversas vezes a minha fidelidade, provar que a amava, que ela era a mulher da minha vida. As outras já não tinham mais lugar no meu coração. Imaginem o trabalhão que isso me deu!

Noivamos durante dois anos. Fizemos planos. Aí ela já confiava em mim. Ela fez o enxoval, fez compras dos utensílios para a casa. Eu fiz cálculos. Juntamos os salários e fizemos o financiamento do imóvel. No final das contas, estávamos fazendo coisas como se já fôssemos um casal.

No dia do casamento, o dia marcado à consolidação de tudo isso, vacilei, questionei se era aquilo mesmo que eu queria. Minha cabeça fervilhava. Pensava o tempo todo nela me esperando no altar. Quase que automaticamente, me vesti e me dirigi para a igreja. Antes, parei o carro num estacionamento e entrei um bar. Ocupei uma mesa num canto, na penumbra, atrás de um monte de caixas de cerveja. Eu não tinha pregado os olhos na noite anterior, pensando o quanto hoje seria o grande dia.

O garçom me trouxe água mineral. Bebi demoradamente. Fiquei longo tempo pensativo, refletindo. Por fim, com os olhos cansados, debrucei sobre o braço direito. Já era tarde, pois o casamento fora marcado para as nove horas da noite. O escuro do ambiente e o silencio do bar, quase vazio, me proporcionaram um relaxamento como se eu estivesse flutuando.

Peguei no sono. Acordei algumas horas depois, sem saber onde estava. Em seguida, reconheci o bar, mergulhado no escuro. Procurei me adaptar à escuridão e vi que realmente estava sozinho ali. Olhei o relógio e percebi que havia se passado mais de três horas desde que cheguei àquele lugar. E agora? E o meu casamento?

Sobre as emoções que me invadiram nos momentos seguintes, nada sei explicar. Só sei que de repente senti um alívio tão grande, uma sensação de liberdade tão grande, que senti vontade de voar, como um pássaro. E o meu casamento? A noiva no altar me esperando? O que as pessoas estavam falando, pensando? E ela?

Sai tateando, procurando a saída. A porta do bar estava mesmo trancada. Teria que passar a noite ali dentro de qualquer maneira. Amanhã daria uma explicação, pensei. Depois dessa decisão, inexplicavelmente, uma sensação de liberdade me invadiu. Desejei que aquela porta nunca mais fosse aberta.

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