Cama Fria
Os transeuntes andavam e transpiravam como tampa de chaleira. E sentado naquele bar bebericando a quarta garrafa de cerveja bem gelada, escolhida do fundo congelador, observava a todos. Não era todo dia e muito menos para qualquer um. Desde a adolescência, seu Romualdo lucrou com seu dinheiro – ainda que mísero – se gabava. Olhou novamente em volta e os transeuntes continuavam na lida: indo e vindo; em meio aos carros; enxugando a testa com as costas da mão; abanando agendas defronte ao rosto...
Não tardou, pediu a quinta cerveja. Melhor que a quarta; o que ensejaria provavelmente a sexta. Bebeu-a como aspirante a degustador. Afinal, tinha poucas folgas - o duro labor não o permitia.
Como imaginara pediu a sexta que lhe pareceu melhor que a quinta. Ou podia ser apenas ilusão de ótica; mas e o paladar? Ah, este era apurado, apesar do tempo... “ Estava muito melhor que a quinta – murmurou com os olhos fechados, deliciando-se. ”
O fluxo de transeuntes já raleava, mas isso não o incomodava. Não precisava de nenhum deles, ou precisava? Pouco importava se precisasse ou não. Precisava, sim, cuidar de sua lascívia naquele momento.
Envolto ao paladar, as saudades, olhou demoradamente não só os transeuntes, mas a paisagem que outrora o encantou; sentiu que a visão não o atendia como antes. Alguns objetos já rodavam a sua frente. Precisava estar inteiro; a rotina o aguardava.
- Garçom, traga-me a conta, por favor? Falou com voz arrastada.
- Sim senhor! Respondeu o magricelo rapaz.
Ganhou a rua e, em instantes, sentiu-se pronto para laborar:
- É um assalto, senhor! Passe-me tudo sem se queixar! Alterando a voz, numa tentativa de abafar a embriaguez.
Antes de dormir, já em suas acomodações, se põe a pensar: “ sou mesmo um incompetente, irracional... – a primeira investida tinha que ser justamente a um policial? Eu sempre erro tudo...” Ajustou-se à gélida cama e dormiu.
FIM