As quatro estações
Na primavera, ela perfumou-se com essência de rosas.Ele reclamou, dizendo que o aroma da colônia era deveras enjoativo.Ela pôs um vestido florido esperando por um passeio que eles haviam combinado há dias.Ele surgiu com uma reunião de trabalho na última hora: ela chorou forte naquela tarde, agarrada ao seu travesseiro; no verão, ela passava os dias ardendo por um carinho que não vinha e, à noite, acabava aos prantos por conta da indiferença dele; no outono, quando ela pensou que colheria o fruto dessa relação madura, perdeu o bebê que esperava havia poucas semanas: deixou-se cair, pouco a pouco, tomada pela tristeza; no inverno, ele fez-se mais frio do que nunca.Ela compreendeu, enfim, que o ciclo havia terminado.O casamento havia chegado ao fim.
Então a mulher decidiu abandonar aquele relacionamento instável. Fez uma mala pequena e embarcou no metrô rumo à casa da irmã mais velha.Quatro estações depois, em Washington, divisou, assim que a porta do trem se abriu, um homem trajando jeans, camiseta e boné de beisebol. De posse de um rico violino, ele interpretava uma encantadora música clássica.À exceção das crianças, o violinista era ostensivamente ignorado pela maioria dos usuários do metrô.
A mulher, impressionada com os harmoniosos acordes musicais, ficou ali, mala junto ao peito, assistindo ao exuberante espetáculo.Ao final, aplaudiu-o, emocionada.
O violinista agradeceu-lhe e antes de seguir seu caminho, a mulher ainda perguntou:
-Por favor, qual é o nome dessa belíssima canção?
- “Primavera”, de Vivaldi...São Quatro Estações.
Enquanto subia as escadarias do metrô,vento no rosto, ela sorriu e pensou que a primavera seguinte poderia ser suave novamente.Tudo dependeria de como ela conduziria sua orquestra pessoal.
(Maria Fernandes Shu- 03 de julho de 2009)
* Na foto, Joshua David Bell, um dos melhores violinistas do mundo.
Este texto faz parte do Exercício Criativo - As Quatro Estações
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