O QUE ROLA NOS TRILHOS DA CENRAL
O trem da Central, rola nos trilhos, tal comprida serpente, onde
tudo de imaginável se passa no seu interior: Pingentes pendura-
dos escorregam para a morte, tragados pelos postes, no veloz
trajeto aglomerado, sem deixar escolha. – No último vagão, co-
mo consequência de nada ter nos bolsos,uma vítima descansa ( varada por uma bala no coração,sem vela acesa, nem lençol cobrindo o rosto), aos olhos dos presentes, com o sangue escorrendo pelas bre-
chas da porta corrediça. – A dois carros acima, completamente
alheias ao que se passa no último, senhoras vestidas de branco,
desenvolvem rituais para retirar o espírito mau de uma passa-
geira. O culto só é interrompido pelos gritos dos vendilhões de
de balas, amendoins, giletes jornais e uma variedade de obje-
tos de uso doméstico. – Muitas fisionomias depauperadas pela
luta cotidiana, ressonam nos bancos de madeira,atirando lon-
gos suspiros e tirando dos outros o direito de não se fazerem
travesseiros seus.- Em outra composição, uma mocinha u-
niformizada - louca fugitiva do hospício constantemente ameaçando atirar-se pela janela.. Pessoas, já as cinco da ma-
nhã- embriagadas, gesticulando, incomodando, contando his-
tórias fantásticas de mulheres, assaltos, policiais, especulado-
res e outros assuntos que despertariam a atenção de policiais
que ali viajassem conjuntamente. Logo à minha frente, uma se-
nhora deu uma bolacha na cara de um aproveitador que se em-
balava no seu traseiro; enquanto que, a que me caiu como
companheira de aperto, fazia questão de se comprimir con-
tra o meu corpo, necessitada dos embalos rejeitados pela sua
colega. – No final do itinerário fui jogado para fora do trem,
sem querer. –“ Quando se viaja no trem da Central, não se
pode impor desejos ou alternativas: Entra-se ali, para o que
der e vier.”