DOLOROSO SILÊNCIO
Ela teve que passar em meio à multidão de cabeça erguida, para não demonstrar o que se passava no seu íntimo. Sentiu olhares curiosos cravados em si, balbucios, cochichos, murmúrios. Mesmo assim avançava pelos corredores aparentando uma tranqüilidade que só Deus lhe deu forças para adquirir.
Ao chegar ao final de um corredor, onde apenas uma fresta de luz iluminava o pequeno espaço entre as paredes, virou-se e empurrou uma porta à esquerda. Entrou. E mais uma vez sentiu olhares curiosos analisando-a.
Tranquilamente, postou-se diante de todos. Corpo ereto, queixo erguido. Procurou as palavras adequadas que pudessem sair de sua boca sem que causasse mais choque, sem que provocassem mais tumulto além do que a situação já havia provocado dois dias atrás. Nada encontrou!
Na realidade, seus olhos não enxergavam ninguém. Fixavam-se num vazio tal qual o seu coração se encontrava, mas o som de uma voz que tentou se erguer num canto da sala, fê-la voltar imediatamente à realidade. Sem hesitar, ela a interrompeu:
- Nada aconteceu... quer dizer, tudo acontece na vida da gente. Se estou aqui hoje, é por que não tive coragem de ficar em casa. Meu marido morreu... ele quis assim, mas a vida continua. Vamos tocar o barco. Abram os seus livros na página...
Só Deus sabe o quanto foi difícil dizer aquilo para os seus alunos. Falar assim para pessoas que queriam somente lhe dirigir palavras de consolo pela perda.
Quando percebeu que os olhares, obedientes, se desviaram para procurar a página indicada, ela sentiu a solidariedade invadir toda a sala. Seus alunos tornaram-se cúmplices daquele silêncio de dor.