AS MANGAS-ROSA
Combalido de dor, o menino mal podia caminhar. Ainda lhe restavam muitos passos, até alcançar o lar, quando, afinal e definitivamente, daria cabo da traiçoeira fome. Estampava no rosto o misto de sofrimento e prazer: tecido lesionado e resquícios do ato recém-consumado sem traços de arrependimento. Pudera: o desfecho era imprevisível, mas, como resistiria a tão forte ímpeto? Tocou a sirene anunciando o término das aulas. Mochila ao dorso, o menino se adianta; toma o destino de casa. À mente, tinha bem claro: o primeiro dever seria por-se à mesa e quebrar o jejum que já o torturava havia algumas horas. Não resistiu: à beira do caminho, repousa a mochila, traspassa a cerca e escala uma árvore. Uma, duas ... eram deliciosas! Devorava a terceira manga, quando percebeu que sua intrusa presença havia sido descoberta pelos proprietários do pomar. Tratou de escapar. Foi então que, conspirando contra si a aproximação ameaçadora dos donos das terras e a viscosidade das mãos que tiveram as frutas com tanta avidez, escorregou: o tombo foi feio! Caiu com o rosto no chão. Mais tarde, refeito o susto, chegaria em casa, com hematomas no rosto tingido do objeto do desejo ... e o paladar das saborosas e cobiçadas mangas rosa.