(Brasília, 07/10/2008)
O seu Antônio da padaria, havia acabado de sair do banco. Com gesto escondido, ainda contava as moedas do dinheiro que sacava todos os dias. Prevenido que era, em face das oscilações da economia, visando resguardar-se de uma possível crise, todo dia recolhia uma quantia para guardar num cofre que mantinha no quartinho do subsolo de sua casa. Na saída da agência bancária havia um pobre coitado a esmolar qualquer moeda. E o seu Antônio, como sempre:
- Perdoe, meu rapaz, hoje num tenho nenhum trocado.
-Ô Seu Antônio, ajuda um pobre coitado. Deus lhe dá mais!!
E saía o seu Antônio, como que sem ter escutado o pobre mendigo. Chegando em casa, pegunta à mulher sobre o almoço.
- Já matou aquela galinha, que num bota mais ovo?
A esposa, dona Serafina, mulher prendada, fazia milagres para ter uma refeição digna, pois mesmo com escassos temperos, ela conseguia fazer comida boa, pois que seu Antônio era gordo que andava arrastando os pés e quase todos os dias só se comia galinha que se criava no quintal. Carne nem pensar. Peixe, só quando se pescava no rio que cortava a chácara do primo do padeiro.
Certo dia estava seu Antônio na padaria, quando chegou um velho amigo, o seu Dimas. Ele era amigo de infância e sabia como era difícil conseguir dinheiro do seu Antônio. Mas a situação era desesperadora pro seu Dimas, e depois de recorrer sem êxito a todos os parentes, resolveu tomar coragem e foi até o amigo para tentar o empréstimo.
- Olá, amigo, como vai? Disse seu Antônio ao avistar o amigo.
- Pois é, vou indo. Disse seu Dimas com uma postura cabisbaixa.
- É, as coisas num vão bem pra ninguém, meu amigo. Hoje mesmo os homens do trigo vieram me cobrar uma promissória que eu estava devendo há mais de mês. Esquivou-se seu Antônio, já pressentindo que o amigo viera lhe pedir alguma coisa.
- Mas, meu amigo, você pelo menos tem um negócio sólido. É comerciante! Todo dia as pessoas comem pão e bebem leite, justamente as mercadorias que você vende. Pra você nunca falta dinheiro não. Ruim é pra mim, que fui desempregado pelo prefeito que ganhou. Ele é do outro partido. Sabe como é né? Eu votei no outro! Na política quando se escolhe o lado errado, a gente se ferra! (Seu Dimas tentou justificar a miséria).
- Mas amigo, volte lá e fale ao prefeito que agora você vai ficar do lado dele. Esse negócio de ética num vale nada não. O importante é você se garantir. Pense na sua família. O partido que perdeu num vai lhe ajudar em nada! (Aconselha seu Antônio, para se livrar da “facada”).
- Não amigo, num vou não. Eu morro de vergonha. Fiz a campanha do outro, fui aos comícios, distribuí santinhos... Não, prefiro morrer, mas esse vexame eu num vou passar não!
- Depois num diga que avisei.
- Mas amigo, eu vim aqui pra te pedir uma ajuda, pois me despejaram lá de casa. Eu já estava devendo o aluguel há três meses. O seu Otávio num quis mais esperar.
- Ê cumpade! O negócio tá difícil pra mim! Dessa vez eu num vou poder te ajudar não
- Mas como dessa vez? Em toda a nossa vida de amizade é a primeira vez que te peço um favor. É só um empréstimo e juro que vou pagar! Insistiu seu Dimas.
- Sinto muito amigo, mas não tenho. Arrematou seu Antônio.
Então, seu Dimas, desolado pela atitude ranzinza do seu Antônio, rompe com este, definitivamente, a amizade de uma vida inteira:
- Pois é certo que você, agora mesmo, perdeu um amigo, pois na única hora em que necessito da sua ajuda, você se esquiva. Como é que pode haver amizade assim, pois sei que você tem condições de me ajudar, e não o faz porque não quer. Portanto, nossa amizade aqui se acaba. Você perdeu um amigo!
- Num tem problema não, seu Dimas. Antes eu tinha um amigo e meu dinheiro. Perdendo o amigo, pelo menos eu fico com meu dinheiro. Se por acaso eu te emprestasse e você não me pagasse, eu perderia os dois. Pra não correr esse risco, prefiro perder só um.