SEU JOAQUIM

Naquele dia, Seu Joaquim amanhecera mais taciturno e impaciente que o de hábito. Seus oitenta e sete invernos deveriam ter sido mais gentis presenteando-o com lapsos de esquecimento, como acontece com outros. Este era o problema: tinha a consciência viva de suas limitações e de seu limite. Naquele dia, mais do que nunca, a névoa se tornava mais opaca, mais fria, mais densa... Sentado à mesa, observava os movimentos de Francisquinha, que lhe punha gentilmente o café, ainda tonta das ilusões que a vida oferece. Menina, movimentos lépidos e destros contrastando com aquele espetáculo particular: uma mão decrépita que, oscilante, tateava em busca da xícara. Alcançou-a, não sem deixar cair algumas gotas de café sobre a toalha de croché. O líquido que restou descia quente pela garganta de Seu Joaquim, enquanto este esperava que aquele dia – mal começara – acabasse junto com todos os outros que se lhe viessem. Era mais um dia de angústias e de nulidade, mais um argumento a defender o fim, mais um motivo para não comemorar: era seu aniversário.

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