O Caminho da Verdadeira Páscoa.
Na cidadezinha de São Esperança, onde o tempo parecia andar devagar, os preparativos para a Páscoa já estavam a todo vapor. As vitrines exibiam coelhos sorridentes, ovos gigantes e papéis coloridos que brilhavam sob o sol do meio-dia. No centro da praça, a antiga igreja, embora esquecida por muitos, ainda guardava histórias profundas.
Arquimedes, um homem simples e de fala mansa, era conhecido por caminhar todas as manhãs até a padaria, mas naquela semana, sua rota mudou. Passou a visitar a igreja, sempre com um livro antigo em mãos e o olhar distante, como quem procura algo que o tempo escondeu.
— Arquimedes, trocou o pão pelo sermão? — brincou Demétrio, dono do mercado local, enquanto ajeitava uma pirâmide de ovos de Páscoa no balcão.
— Troquei o que passa pelo que permanece — respondeu com um leve sorriso, sem perder a gentileza no olhar.
Do outro lado da praça, Joaquim, menino de doze anos, carregava no rosto a curiosidade típica da idade. Observava Arquimedes em silêncio. Um dia, tomou coragem e o seguiu até a igreja.
— Senhor Arquimedes, o que tanto o senhor lê aí?
— Venha, sente-se comigo. Vou lhe contar uma história que nem sempre cabe dentro de uma embalagem dourada.
Ali, sentado nos bancos de madeira gastos pelo tempo, Joaquim ouviu falar de um homem que foi amor mesmo diante da dor, que não teve marca famosa, mas deixou marcas eternas. Um homem que perdoou quem o feriu, que abraçou sem esperar nada em troca. Que morreu por amor, mas não ficou na morte.
— Essa é a verdadeira Páscoa, Joaquim. Não a que se vende, mas a que se vive — concluiu Arquimedes.
Na manhã de domingo, Demétrio abriu o mercado como de costume. Esperava a correria de sempre, mas notou algo diferente. Joaquim entrou com um pequeno cesto de papel, feito à mão, com flores do quintal e uma cartinha dentro:
“Nesta Páscoa, quero repartir esperança. Porque o amor não vem com etiqueta, e a fé não se embala em plástico.”
Demétrio sorriu, tocado. À tarde, foi à igreja pela primeira vez em anos. Encontrou Arquimedes e Joaquim acendendo uma vela ao lado do altar. Sentou-se, em silêncio, e deixou que a chama lhe falasse.
Naquela cidadezinha, entre vitrines brilhantes e palavras esquecidas, três gerações se encontraram no caminho da cruz — e descobriram que a ressurreição começa dentro do peito, quando se escolhe amar sem medida.