O Bebê Chorão
O herói favorito do avô Manoel, sabe Marquinhos, é O Fantasma. O herói é um homem comum, muito forte e preparado para lutar contra a pirataria e as injustiças do mundo. Mas somente os Pigmeus de Bandar que cuidam da Caverna da Caveira sabem disso. Nem a Patrulha da Selva conhece o comandante que parece ser o mesmo desde a fundação, a uns trezentos anos atrás. Os outros nativos da selva e até gente da cidade acreditam que o Fantasma não morre e tem mais de quatrocentos anos.
Uma vez, folheando um dos gibis da coleção do avô, o menino pediu:
—Vovô, conta a história do Bebê Chorão?
—Claro! Conto sim. Mas não preciso ler o gibi.
—Tá bom.
"O Bebê Chorão era o apelido e seu nome é Cecil — começa a narrar o avô Manoel ao atento Marquinhos — Ele tinha doze anos e era muito magro e fraco. Usava óculos e tinha medo dos outros moleques do bairro onde morava com a mãe em uma casa humilde. A mãe lavava roupa de outras famílias e era Cecil quem sempre ia entregar as peças lavadas e passadas. Um dia ele não conseguiu se livrar dos baderneiros. O mais valentão deles, um molecão de uns quinze anos de nome Mike, incitou os outros para azucrinarem Cecil. Eles o cercaram e bateram nele. Ele caiu na lama, sujou toda a roupa que deveria entregar e, na queda, quebrou os óculos que ainda nem estavam pagos. Desesperado, ele não teve coragem de voltar para casa e contar para a pobre mãe o que tinha acontecido. Ele começou a andar sem destino, a esmo, acabou entrando fundo na selva e se perdeu completamente. Veio a noite e ele, com medo de cada ruído da mata, sentou-se ao pé de uma árvore e chorou até adormecer.
É a noite que os grandes felinos saem para caçar suas presas. Mas nessa noite em que o menino está indefeso na floresta também o Fantasma saiu para caçar. Por sorte, ele chega no exato momento em que um tigre está prestes a saltar em cima do menino. Com sua lança certeira ele atinge o animal que tomba ferido ao lado do garoto. Cecil acorda assustado com todo o barulho. "O que faz aqui à noite no meio da selva, menino?" — pergunta o Fantasma. "Não me faça mal, por misericórdia, o senhor deve ser perigoso pois usa máscara e essa roupa estranha..." — choraminga o Bebê Chorão. "Não sou nenhum bandido, menino. — esclarece o Fantasma — Sou o protetor dessa selva e você pode confiar em mim." Cecil então, tranquilizado, conta ao Fantasma tudo o que lhe acontecera nesse dia e seu medo de voltar para casa e enfrentar sua mãe tão brava e infeliz. Fantasma então diz-lhe: "Vou levar você para sua casa, conversar com sua mãe e ajudá-la com o prejuizo das roupas e dos óculos, não se preocupe, sou muito rico."
Na casa de Cecil, o Fantasma, após explicar o que ocorrera com o menino, pede autorização à mãe para levá-lo para a selva e deixá-lo por um bom tempo entre os nativos. O herói mascarado garante à mulher que essa temporada na selva vai fazer muito bem ao garoto.
E assim Cecil vai para a Caverna da Caveira viver com os destemidos pigmeus da tribo de Bandar. A primeira coisa que o Fantasma exige é que o menino abandone as roupas da cidade e os sapatos e vista somente uma tanga de um couro grosso de javali. Nada mais. A princípio doem-lhe os pés descalços, o sol queima sua pele, os mosquitos picam suas pernas e braços e ele chora de dor. Mas à medida que o tempo passa seu corpo vai ficando acostumado e resistente a tudo isso. Ele corre pelo mato, arrisca-se a nadar nos rios, come muitas frutas colhidas diretamente das árvores e aprende a brigar com os pigmeus. Gurã, o chefe da tribo, ensina a ele como cavalgar, pescar e caçar. O Fantasma, em seu tempo livre, ensina algumas artes marciais ao menino que aprende a se defender, agora com seus músculos sadios e vigorosos de tanto exercício físico. Percebe com o Fantasma que todo valentão no fundo é um poltrão que só se aproveita dos mais fracos. E disso o menino teve prova ao ver o Fantasma vencer facilmente uma luta com um homem muito maior do que ele, o qual estava aterrorizando uma tribo protegida pelo Fantasma.
Dois meses e meio se passaram e agora o Bebê Chorão não tinha mais nada de bebê nem de chorão, muito menos de medroso. O Fantasma levou-o de volta para casa, e a mãe quase não o reconheceu de tão mudado que estava. Forte, corado, musculoso e gentil com ela. "Daqui para a frente teremos outra vida, mãe" — disse o rapaz, abraçando-a — vou trabalhar e ganhar nosso sustento sem a senhora precisar lavar roupa para fora. O Fantasma já me recomendou ao Comandante da Patrulha da Selva. Vou começar meu treinamento para ser Patrulheiro Mirim da Selva já na semana que vem.
Uma tarde voltando para casa, Cecil viu o molecão e outros desordeiros atazanando um dos meninos, o que havia se mudado para o bairro recentemente. Ele se aproximou do grupo e falou em alto e bom tom: "Aí covardão, sempre se aproveitando dos mais fracos e indefesos, não é?" "Olha quem apareceu! O Bebê Chorão! — zombou Mike, o valentão. — Vamos dar um sova nele pra ele deixar de ser atrevido e bocudo." O molecão se adiantou de punho levantado para socar a cara de Cecil, mas seu pulso foi contido no ar por uma mão de ferro. Cecil girou o corpo e o grandalhão voou por cima dele indo estatelar-se na areia da rua completamente surpreso pelo golpe. Cecil colocou o pé em cima do peito dele e disse com voz bem calma: "Nunca mais abuse de qualquer pessoa desse bairro ou vai se ver comigo, Tá entendido, covardão?"
—E assim foi, Marquinhos.
—Obrigado, vovô. Que história maravilhosa! Até eu gostaria de passar umas férias na Caverna da Caveira com o Fantasma e os Pigmeus de Bandar.