A OFICINA DO TIO ZETE

A OFICINA DO TIO ZETE Davy F. Almeida

Meu tio Donizete é marceneiro e carpinteiro. ele faz carrinhos de madeira,

trenzinho, caminhãozinho e até carrinho de rolimã. Eu adoro andar de

carrinho de rolimã com meus primos. Meu tio falou que ele faz todos os

brinquedos com madeira tipo MDF, é pratico e rápido.

Ele também faz bichos de madeira Arara azul, arara vermelha, tucanos e

até papagaios. Ele é um marceneiro artista. A marcenaria é uma arte.

Quando eu crescer quero ser igual a ele. Gosto de cortar madeira, pegar na

madeira, sentir o cheiro da madeira. Gosto de lixar, pregar, pintar e

envernizar.

Minha tia Doralice falou que criança não trabalha, criança dá trabalho.

Meu tio Zete fala que ele começou a aprender marcenaria com dez anos

de idade. Aprender cedo é bom.

A gente aprende brincando. Eu gosto de brincar de marceneiro.

“ tio Zete me ensina a fazer isso? Me ensina fazer aquilo? Me ensinar a

serrar, pregar, colar, pintar e desenhar?” gritavam os quatro primos. Ele

dizia : “ meu Deus ! Quanta criança isso aqui parece uma creche !” “

Depois vocês se machucam e a mãe de vocês vai brigar comigo, seus

pestinhas”, “ mas eu quero, quero, quero, quero e quero” e “ por favor, por favor, por

favor, por favor, por favor, só um vez, só desta vez... por favor” e lhe

agarravam a camisa. Lhe puxavam pela camisa.

Lá na oficina ficam três gatos olhando ele trabalhar, além de um cachorro.

Lá tem muitas ferramentas. Serras, serrotes, alicates, arco de pua, pregos,

lixas, parafusos, tintas, vernizes e muita madeira. Um gato se chama

Amadeu, outro Greg e outro Fred. O cachorro se chama Godofredo. O

cachorro é um pastor alemão. Godofredo é nome de alamão. Eu sei que se

deve falar alemão, mas eu gosto de falar alamão, é engraçado. Sabe me

dizer se errado falar alamão? O Godofredo é um pastor alemão. Não tem

nada haver com religião. Não é pastor de igreja. É cão da raça pastor.

Meu tio me ensina o oficio e arte da marcenaria. As vezes a gente se

machuca. Fui martelar e martelei o dedo. Doeu um pouco. Sem calos nas

mãos a gente não dá valor ao produto nosso trabalho. Eu não chorei. Eu

não sou mais criança, eu já tenho dez anos de idade. Agora eu sou um

homem. Sou um adultero. Eu sei que é adulto, mas é engraçado falar

adultero. Eu não sei porque os adultos reclamam do trabalho. Trabalhar é

divertido. Eu acho que os adúlteros são todos preguiçosos. Criança não

consegue ficar parada. A gente tem muita energia. A gente tem muito o que

fazer. A gente não pode perder tempo porque a vida é curta.

Eu já decidir quando crescer quero ser marceneiro e carpinteiro.

Os marceneiros são artistas. Artesãos. Fazem além da vaidade da arte

coisas úteis, coisas de engenharia. Sim arte é vaidade dos olhos. arte é

vaidade dos humanos. Arte é poesia com madeira de marcenaria. Arte é

xilogravura. Os marceneiros projetam coisas de engenharia móveis de

todos os tipos. Guarda roupas, armários de cozinha, gabinetes de pia,

estantes. Os carpinteiros fazem a estrutura de telhados e até casas com

madeira.

Marcenaria é a arte e oficio. Carpintaria é a arquitetura com madeira. A

arte e a engenharia se misturam em um coisa só.

Todo artista é engenheiro, mas nem todo engenheiro é artista.

Estava frio e chovendo, fiquei olhando da janela. Estava cinza. Eu não

podia brincar ir brincar lá fora. Eu não gosto de ficar preso aqui dentro de

casa. Eu não sou assim. Estava frio e chovendo. Eu estava calmo e sereno

vendo a chuva cair. Não era tristeza, antes fosse, era melancolia. O tempo

mexe com o humor da gente, foi o que me disseram. Era assim toda tarde

inverno.

Depois chegava a noite e eu tinha que ir dormir. Eu não gostava da noite.

Eu gostava do dia. A noite era escura. A noite demorava a passar. Eu

olhava a noite pela janela. Não era tristeza, antes fosse, era melancolia. Eu

sempre ouvia gritos a noite. Meu tio Zete era nosso vizinho. Dizem que os

gritos eram da mulher dele. Eles brigavam muito. Dizem que ele bebia.

Dizem que ele era mau. Dizem que ele usava drogas. Dizem que ele batia

na mulher. Dizem que ele batia nos meus primos. Para mim ele era só meu

tio Zete. Um homem bom, honesto e trabalhador. Ele era marceneiro, ele

era carpinteiro. Ele era o cara que eu queria ser. Ele me levava para pescar.

Ele era divertido. Ele tinha um carro velho e e engraçado. Nunca o ouvi

falar mal da vida dos outros. A gente brincava. Ele chamava a gente de “os

pequenos marceneiros”. As vezes eu sonhava brincando de marcenaria. Me

dá um aperto no coração quando me lembro de tudo isso. De toda essa

vida. Era muita vida. Era vida para dar e vender. Era felicidade de dar

inveja. Era alegria de viver. Era sorrisos. Era muita saúde. Eramos

crianças. Era o sol que brilhava sobre a vida num dia de céu azul.

Nas tardes de verão, nós brincávamos de marceneiros. Depois agente

tomava suco de laranja. Era assim toda a tarde na oficina do tio Zete.

Agora, vem chegando o inverno. Minha mãe não deixa eu sair para

brincar. Eu ainda ouço seu martelo, suas serras elétricas, sinto o cheiro das

tintas e vernizes.

Um carpinteiro nas tábuas

De tábuas tão secas e tão duras e não tão secas quanto sua dura

vida. Pelas mãos físicas, esculpindo a mais nobre sinfonia.

A cada toque o pão de cada dia. Nasce o sol mais um dia, ele já

velava antes que fosse dia. Suas mãos cantam nestas tábuas frias.

A obra começa a florir, um vivo raio de calor, sol e luz vida

ilumina toda a tela, aquece a estátua e ressoa a música. Pronta está

a escultura, a obra dos sonhos é realidade. O artista de vistas

fatigadas, de mãos doloridas e vida sofrida. Sonha docemente

entre flores nos braços de Jesus.

FIM

Davy Almeida
Enviado por Davy Almeida em 23/11/2024
Código do texto: T8203732
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