O Menino Encantado - republicado
Houve um casal de fazendeiros que possuía filhos saudáveis e felizes, mas havia um que era uma razão de sofrimento para eles, pois tinha uma doença rara que não lhe permitia se locomover como uma criança normal. O menino ficava triste ao ver seus irmãozinhos brincarem alegremente, correndo de um lado para outro e ele, sem poder se movimentar, passava os dias em uma cadeira de rodas. Seu passatempo consistia em alguns brinquedos que ele montava e desmontava, mas ao cansar-se deles, lançava-os a um canto e caía em depressão, chorando, deixando todos muito abalados com sua penosa situação. Apesar de tudo, eram as noites dessa criança muito alegres e divertidas. A mãe lia para ele, à cabeceira de sua cama, histórias que pertenciam a um mundo de fantasia, mas que para o menino pareciam reais. Eram contos de fada, duendes encantados, tapetes voadores, seres vindos de outros planetas. Tudo isso mexia com a imaginação daquela criança ao ponto de não conseguir ficar um dia sem ouvir os relatos da mãe. Ele já não conseguia dormir sem, antes, viajar na imaginação pelo mundo fantástico a que as histórias lhe conduziam.
Numa noite, em que os pais precisaram se ausentar e, cheios de preocupação, sabiam que não chegariam a tempo de contar para o filhinho uma das histórias que ele tanto amava. Certamente o encontrariam dormindo ao chegarem à casa tarde da noite. Mas, não foi isto o que aconteceu. O menino andou pelo quarto empurrando, de um lado a outro, sua cadeira de rodas, pois não conseguia conciliar o sono. Todos os irmãos já dormiam na casa, o silêncio era total. De um quarto ao lado ele ouve uma voz que chama por ele. Apesar de todo o seu medo, se dirige à porta e, em silêncio para não acordar os irmãos, gira a maçaneta e passa para o outro cômodo que é um quarto vazio e desocupado. Da janela, uma luz azul e branca emitia flashes para o interior do aposento. Ao se aproximar, novamente a voz se fez ouvir.
- Aproxime-se mais; não tenha medo. Você me conhece, pode se aproximar.
Ao chegar à janela, ele vê, flutuando no ar, ainda do lado de fora, o duende famoso das histórias que tão bem conhecia.
- O que faz aqui, como sabe onde eu moro?
- Eu sei de todas as coisas; conheço tudo e vim aqui hoje para pegar você para passear comigo.
- Eu não posso sair com você. Mamãe vai ficar muito zangada e triste se não me encontrar em casa. E mesmo que eu quisesse não poderia. Não posso me locomover.
- O que você mais gostaria nessa vida?
- Seria a pessoa mais feliz do mundo se pudesse andar, brincar e correr assim como meus irmãos.
- Mas é claro que você pode fazer isto, veja.
E fez um gesto com a mão ao dizer estas palavras. Imediatamente, a uma ordem sua, o menino levantou-se de sua cadeira e começou a andar pelo quarto com muita desenvoltura. Uma nova ordem e ele pôs-se a pular, dar cambalhotas em cima da cama e correr pelo quarto, incontido da mais pura felicidade.
- E agora, podemos sair?
- Para onde você quer me levar? - ele perguntou apreensivo.
- Ao meu mundo encantado, onde tudo é possível. Não vê o que fiz por você?
- Sim, estou muito feliz. Mas, e a minha mamãe? Ela vai sofrer muito se chegar e não me encontrar em casa.
- Não precisa se preocupar, isto não vai acontecer. Iremos sair para passear e podemos ficar o tempo que você desejar, até se enjoar de tanto se divertir. O tempo não é problema para mim, eu consigo dominar o tempo. Quando sua mamãe voltar para casa vai encontrá-lo dormindo como se nada tivesse acontecido.
O menino era muito inteligente e sabia que aquilo seria impossível de acontecer. Mas, ao mesmo tempo, não compreendia como aquela criatura conseguira fazê-lo andar e correr como qualquer criança normal. Só podia estar sob o efeito de algum encantamento. Sendo assim, disse ao duende que não iria sair com ele. Foi quando o duende ameaçou-lhe fazer voltar sua condição de criança deficiente e que ele nunca mais recuperaria os seus movimentos. Com essas palavras e tendo sentido o gostinho de ser uma criança normal, ele cedeu e aceitou ir com a criatura, mas fê-la prometer que o traria de volta o mais rápido possível.
- Já disse que não precisa se preocupar.
Assim, num gesto de mão do duende, o menino flutuou no ar, passou para fora da janela e dali, desapareceram. Surgiram em outro ambiente, repleto de seres encantados, coloridos, duendes de todas as cores, cavalinhos alados, porquinhos também voadores, tapetes mágicos que iam e vinham em ondulações harmoniosas. Por todos os lados, ao olhar para baixo, jardins espalhavam-se, enfeitando as casas, perfumando as ruas. Rios formosos, de águas azuis corriam suavemente; em suas águas mansas, peixinhos multicoloridos bailavam em harmonia. Circos apresentavam espetáculos com palhaços, malabaristas e todas as ruas enchiam-se de bailarinas ao som de bandas, espetáculos de marionetes e espelhos d’água que, no seu todo, brilhavam, exibindo luxo, harmonia e felicidade. Todas as criaturas mágicas, todos aqueles seres encantados que povoavam sua imaginação nas histórias que ouvia da mãe ali estavam a se apresentar para ele. Quando desceu, com seu duende que lhe servia de guia, um a um, todos os seus amiguinhos de ficção passaram por ele, cumprimentando-o e dando-lhe as boas-vindas.
Muito brincou, se divertiu e não viu o tempo passar. Como havia-lhe prometido, o duende conduziu-o de volta para a casa e para a realidade, ou melhor, num gesto, já lá se encontravam. Os pais, ao encontrarem a criança tranquila, entregue a um sono gostoso, sentiram-se aliviados ao constatarem na fisionomia dela um ar tenro de paz e de felicidade. Na manhã seguinte foram muitas as gargalhadas dos pais e dos irmãos ao ouvirem, do menino, o relato de sua experiência maravilhosa. Ainda pensam que tudo não passara de um sonho. Mas, o menino especial sabe o quanto foi real sua experiência. Não importa o que pensam. Ele foi feliz e conheceu o lado maravilhoso da existência. Todas as noites dorme, agradecendo a papai do céu por ser uma criança tão privilegiada.