A Carta Da Despedida

Eu deveria ter me preparado muito cedo, se não a mamã vai falar muito. Fui a correr rapidamente para o quarto de banho. Ouvi minha mãe gritando o meu nome, talvez a voz dela estava vindo diretamente da cozinha, enquanto preparava o matabicho.

Subi as escadas depressa, fui para o meu quarto me preparar. Coloquei uma camisa branca e uma calça jeans preta, acompanhada de um tênis preto também.

— Onde estás Quinanga? — gritou a mamãe.

Ela estava a vir para o meu quarto. Eu tinha que terminar de vestir muito rápido se não estava ferrado. Então fiz de tudo para terminar e sair do quarto.

— Já estou a caminho, não vou demorar — respondi.

— Melhor mesmo, estou te aguardando embaixo baixo — disse a mamãe.

* * *

— Já estou indo mamãe mamãe — disse e me levantei ao mesmo tempo.

— Aguarde um pouco, iremos juntos — disse buscando a sua bolsa.

Nunca gostei muito de ir com a minha mãe na escola, sempre que os colegas vejam isso me chamam de filho da mamã e eu odeio muito isso. Ser tratado dessa maneira, eu detesto bastante.

Ainda mais nesse município em que vivo, aqui no município do Cazenga. Aqui os insultos são demasiados, lutas acontecem de dia para noite.

Aqui a delinquência juvenil está a crescer sempre, jovens a perderem-se com as drogas e as bebidas alcoólicas, que chega a ser muito triste.

Muitos deles as suas famílias têm a possibilidade de estudar sem serem expulsos por causa da propina. Mas eles não aproveitam, preferem matar aulas do que estudar.

A educação que a minha mãe me dava é muito diferente com a educação que muitas mães dão aos seus filhos. Eu tinha colegas com comportamentos que chegavam a ser mesmo terríveis.

Mas a minha mãe me ensinou muito a ser diferente, até agora ela continua a me ensinar coisas muito diferente com o que a maioria das pessoas fazem.

— Vamos — disse e abre a porta.

Começamos a caminhar, a minha escola ficava um pouco distante por isso que a minha mãe não gostava de me deixar ir sozinho.

Ela gostava sempre de me acompanhar, mas eu não gostava muito disso e ela não queria saber. Eu dizia sempre para ela, mas ela dizia que eu sou criança e que preciso ir na escola com um adulto. Por causa das coisas que acontecem na rua, por causa dos carros que passam. Então é aconselhável ir sempre com um adulto.

Talvez ela tenha razão, mas eu não gostava . Durante o caminho estamos a conversar bastante. A minha mãe me fazia rir e me contava várias piadas que eu me matava de rir pelo caminho, ela sempre foi boa nisso.

Eu sempre notei o amor que ela tem por mim, aquela vontade que tinha de me ver formado, de me ver a terminar os estudos. Apesar das dificuldades que enfrentamos,enfrentamos mas ela estava sempre me apoiando, dando sempre aquele suporte de uma ótima mãe.

Não importava se o meu pai tinha me abandonado, mas a minha mãe procurava sempre formas de me sustentar e de pagar os meus estudos. Ela ia na praça do Kikolo vender alguns produtos e o dinheiro que conseguia é que colocava na minha formação. Ela é foi uma ótima mãe disso sim eu não duvido.

— Chegamos — disse. — Não demoramos.

— Vamos para sala, vou falar com o seu professor.

— Não é necessário, já estamos mesmo na escola — olhei para mamãe.

Ela olhou para mim, como se tivesse algum problema quanto a ela ir para a minha sala.

— O que foi Quinanga? — indagou.

— Nada mamãe — respondi com a tentativa de fingir que tudo está bem.

— Parece que fizeste alguma coisa de errado, estás a esconder alguma coisa de mim que eu preciso saber? — disse e fita direitinho nos meus olhos.

— Não tem nada, podes esquecer tudo que eu disse. Não tem nada, acredite — disse com um sorriso para disfarçar.

— Está bem filho, você sabe que eu não gosto de confusão e que eu te ensino tudo que é correto. Eu estou indo, pode ir para a sala.

— Mas… não irias entrar comigo? — perguntei para saber o motivo que fez ela mudar de ideia.

— Não se preocupe Quinanga, pode ir , nos vemos depois em casa — disse se retirando.

Eu não sabia o motivo que fez a mamãe mudar de ideia, isso me deixou admirado, porque a minha mãe sempre me acompanhou até a minha sala de aula. Não entendo o porquê que ela mudou de idade.

Não poderia ficar a perder muito tempo e fui para a minha sala de aula, entrei e dei conta que cheguei mesmo cedo. Vi somente alguns colegas que estavam presentes na sala, mas o professor ainda não tinha chegado.

— Hoje você não veio com a sua mãe? — disse um dos colegas presentes na sala.

Ouvi o que um dos colegas acabou de dizer, mas faço de conta que não ouvi e ignorei, fui me sentar na minha carteira.

Eles são sempre assim, sempre que eu chegava eles começavam a me insultar, Fazendo-me sentir me sentir mal, mas eu ignorava sempre eles.

— Você não vai responder nada — disse um deles bem à minha a minha frente.

Ele não demorou e me deu dois socos no meio da cara, quebrou logo o meu nariz. Eu comecei a sangrar naquele momento, era tanta tontura que comecei a sentir e ele não parou e me acrescentou um soco novamente.

Eu não entendi o porquê que ele me atacou rapidamente, só pode ser mesmo os rancores que ele guardava de mim. Mas nada fazia sentido para mim, porque eu nunca fiz mal a ninguém, ainda mais para um colega da mesma sala.

Depois da tontura que senti, vi ele em cima de mim, eu já estava no chão tapando a minha cara, não conseguia ver completamente nada, ele só buscava formas de me acertar no rosto. Eu gritava de tanta dor, eu ouvia os colegas a gritarem Invés de me ajudarem.

— Biló — gritavam os colegas.

Eu assustei e vi que algumas pessoas vieram tirar ele de cima de mim. Eu estava a sangrar e estava muito tonto que não aguentava e caí em um desmaio.

* * *

Eu pensei que eu estivesse morto, até porque eu queria mesmo morrer. A vida não tinha sentido fácil para mim, a escola onde eu fui parar era um azar para minha vida.

Não que eu queria estudar mesmo lá, não é isso. Eu só estava lá porque é uma escola do estado onde um familiar me ajudou a fazer parte da escola.

Porque a minha mãe não tinha dinheiro suficiente para me colocar em um colégio. É mesmo nessa escola onde tudo não tinha sido fácil para mim, a minha vida estava sendo um, para um menino de apenas 13 anos de idade.

Talvez se tivesse morrido na barriga da minha mãe eu não deveria viver todo aquele sofrimento. Não sei se estaria no céu por ser um simples bebê inocente, ou se a minha alma estaria condenada a ir para o inferno.

Abri os meus olhos e notei que estava em um lugar diferente, sim, em um hospital.

— Você acordou filho — disse a mamãe com lágrimas com as lágrimas no rosto.

— O que eu estou a fazer aqui? — pergunto com a voz fraca quase sussurrando.

— Evite falar, aproveita descansar — diz me segurando no cabelo.

— Por favor mamãe, me diga o que aconteceu. Tem coisas que eu já não me lembro — disse sussurrando.

— Depois vamos falar filho, aproveita descansar.

Nunca me senti tão mal como estava naquele dia, senti dores em todo meu corpo. Achei que se eu estivesse morto não poderia sentir toda essa dor que estou a sentir, estaria em um lugar melhor que esse. Um lugar tranquilo e calmo, onde não existe a dor nem o sofrimento. Mas aqui tudo é o contrário, todo tipo de coisa acontece, coisas tristes e terríveis.

Depois de eu ter terminado de descansar, a minha mãe veio ter comigo.

— O que aconteceu Quinanga?

Eu sabia que ela deveria perguntar isso, mas eu não poderia dizer a verdade. A minha mãe é uma pessoa calma, mas quando é sobre confusão ela fica muito alterada. Então preferi não contar nada, porque se eu iria contar para minha mãe ela não ia querer que isso termine assim. Ela iria fazer confusão na escola e isso não deveria terminar bem.

— Ouviste a minha pergunta, filho? — insistiu depois de dar conta que eu permaneci em silêncio.

— Sim…

— Por favor me responda, foste assaltado? — perguntou me fitando. — Quem fez isso contigo?

Eu estava a formular respostas, eu não sabia o que deveria falar de concreto. Se eu dizer a verdade, a minha mãe não vai encarar isso de uma boa maneira. Vai ser algo terrível que eu nem quero imaginar como será.

— Sim, fui agredido — respondo.

— Sinto muito filho — diz me dando um abraço muito forte.

A minha mãe é uma ótima pessoa, mas eu não queria colocar ela na confusão toda. Ela já lutou muito por mim e não pode ficar preocupada com as surras que eu recebia na escola.

Eu não contava nada para não preocupar ela, deixei simplesmente passar. Até porque eles são delinquentes, a coisa não iria acabar bem.

Depois de alguns dias eu já estava a me sentir um pouco melhor, então, os médicos disseram que eu já poderia regressar às aulas.

Estava de regresso às aulas, as aulas começaram a correr muito bem para mim. Os professores me perguntaram o que se passou e eu respondi que fui assaltado. As aulas foram indo, até que um dia a aula terminou e eu estava a regressar para casa.

Eu estava em um corredor estreito e vi cinco homens que pararam em minha frente. Eu tentei fazer de conta que não conheço eles e passar, só que um segurou nos braços e me puxou para frente dele.

— Que droga é essa? — perguntei sem entender nada.

Ele apenas olhou para os meus olhos.

— Acabem com ele — deu as ordens e em seguida me largou para os companheiros dele me espancarem.

Vi todos eles a virem dar cabo de mim, começaram a me espancar com muita força. Eu fiquei deitado no chão enquanto eles me espancaram com tudo e com muita força.

Eu não sabia o que fiz para merecer isso, era muita tortura que eu estava a passar desde o dia que entrei naquela escola. Todos costumavam a dar cabo de mim, eles não queriam me matar, apenas queriam que eu fosse o saco de pancadas deles.

Eu comecei a sangrar muito, mas mesmo assim eles continuaram e não pararam. Ainda me chamavam de nomes feios só para me deixar mais irritado.

— Por favor parem — suplicava. — Por favor parem.

Mas mesmo assim eles não me davam ouvidos, eles continuavam e aumentavam ainda mais. Se eu dissesse para a minha mãe, será que tudo seria diferente?

Será que ela resolveria tudo que passei na escola?

Ou eu colocaria ela em perigo por minha causa?

Eu não conseguia responder essas perguntas. Eu não tinha uma razão para viver, é isso, para não causar muitos problemas para minha mãe, para deixar ela fora de toda confusão que eu estava, então eu preferi morrer e desaparecer totalmente deste mundo.

Só assim que a minha mãe ficaria bem, sem me pagar a escola, ficaria livre e sozinha e teria uma vida melhor sem mim. Invés de ficar a tomar conta de um perdedor que sempre é maltratado na escola.

— Me matem por favor — gritava de tanta dor.

Eles começaram a rir-se de mim, eles davam gargalhadas enquanto me batiam ainda mais forte.

— Não podemos te matar, você é nosso saco de pancadas e sempre serás — respondeu um deles com gargalhadas.

Eu chorava, eu pedia a Deus para que aparecesse pessoas para me acudir. Mas isso não aconteceu. Eles diziam que eu roubei e que merecia ser torturado, e que a minha vida não presta para nada.

Eles tinham razão, a minha vida não presta mesmo. Por isso que eu preciso morrer. Eles terminaram de me bater, eu estou muito mal, eu estou a sangrar muito.

— Não conte para a sua mãe, se não vais apanhar mais — disseram e foram-se.

Me deixaram estendido no chão enquanto estava a sangrar muito. Procurei forças e me levantei, limpei o sangue que estava no meu rosto. Olhei para o sol e vi que já estava a escurecer, dei logo um suspiro porque a minha mãe não poderia saber disso.

Comecei a andar, embora com o corpo dolorido e esgotado, mas comecei a caminhar calmamente até chegar em casa. Fiquei na porta e vi pela janela que a minha mãe estava a ver televisão, as luzes estavam apagadas e isso iria facilitar para ela não perceber do jeito que eu estava.

Bati a porta e ela veio abrir.

— Quinanga?

— Sim, eu mesmo — a minha voz saiu um pouco fraca.

Ela notou algo de diferente na minha voz.

— O que tem a sua voz?

Como estava um pouco escuro ela não se apercebeu, dei algumas desculpas, inventei uma mentira e disse que estava com um pouco de gripe.

Ela não demonstrou que acreditou em tudo que eu disse, mas eu só queria ir para o meu quarto e mais nada.

Ela foi para a cozinha colocar a minha comida no prato, naquele mesmo momento eu aproveitei e subi rapidamente para o meu quarto. Para ela não dar conta de que eu estava com dificuldades em andar.

Me tranquei com as chaves, fiquei a chorar logo que entrei no quarto. Fiquei a pensar como o mundo é cruel, as coisas que acontecem, os seus desafios. Eu não era alguém forte para suportar tudo que passei, então eu preferi morrer para que eu não esteja a passar nesse todo sofrimento.

— Quinanga já coloquei a comida! — gritou a mamã.

Permaneci ainda alguns minutos em silêncio, não dei uma resposta. Limpei logo as lágrimas que estavam no meu rosto. Porque não queria que a minha mãe me visse do jeito que eu estava, então me preparei e fui para a sala.

— Por que demoraste?

— Estava a arrumar as minhas roupas — respondi e segurei no meu prato.

Não falei mais nada e fui com o prato de comida para o meu quarto. A minha mãe notou alguma coisa estranha em mim, mas eu não contei nada para ela.

Logo que subi levei comigo uma faca para dar um fim na minha vida, mas antes de acabar com a minha vida queria escrever uma carta para a minha mãe, talvez eu chamaria uma carta de despedida, me doeu bastante, mas eu tinha mesmo que fazer isso.

***

Olá mãe, essa é a carta que eu escrevi antes de eu me suicidar, não sei se encontraste essa carta ou não. Mas por favor mãe, não se sinta mal ou culpada por mim, eu quem tomei essa decisão porque a vida nunca esteve ao meu favor. Eu nunca me senti bem em fazer parte dessa vida, por isso eu tirei a minha própria vida. Sinto muito por ter causado aquela tristeza no seu coração, lamento muito por isso ter terminado assim. Eu espero que a sua vida vá em frente, pelo menos tenha outros filhos melhores que eu. Sem ter alguém para pagar as propinas e gastar muito dinheiro, desejo tudo de bom para você mãe, saiba que eu te amo muito e que sempre te amarei. Eu levarei você eternamente no meu coração, todos os momentos que vivemos, os conselhos que me passaste. Um forte abraço mamãe, eu te amo muito.

*Beijos minha eterna mãe.*

Autor: Aniceto Atalaia._

Aniceto Atalaia
Enviado por Aniceto Atalaia em 24/08/2023
Código do texto: T7869561
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