Era uma vez uma menininha muito esperta que gostava de chupar o dedo e mexer no próprio umbigo. Nas noites de Natal ela se prostava à janela do seu quarto e ficava a olhar para o céu. Via as estrelas, a lua, os cometas e as galáxias, mas o que ela buscava era o Papai Noel. Ele nunca aparecia para ela e isso já ia fazer mais de sete anos.
De tanto esperar acabava adormecendo pendurada à janela, levando vento e o sereno da noite. A mamãe já sabendo daquilo a levava para a cama carinhosamente e a colocava para dormir. A menina sonhava em sair de casa em casa, de rua em rua, de aldeia em aldeia, de tribo em tribo, de povos em povos junto com o Papai Noel distribuindo amanhãs para quem já não acredita mais que poderá viver um amanhã com felicidade e sabedoria.
A menina acreditava que o amanhã era a melhor coisa que alguém podia pedir para o Papai Noel, principalmente ela que apesar de muito nova tinha medo da morte porque sofria de Coarctação de Aorta que é caracterizada por um estreitamento da aorta que dificulta o transporte do sangue para o organismo. O fluxo de sangue diminuído pode acarretar insuficiência cardíaca nos primeiros meses de vida. O médico diagnostica a coarctação de aorta avaliando alterações do pulso e diferença de pressão arterial nos membros inferiores e superiores. Com isso, ela sentia muitas dores de cabeça e nas pernas impedindo-a de correr, pular, brincar de amarelinha, andar de bicicleta e ser feliz igual as demais crianças da sua rua e escola.
Então, desejar um amanhã com a cura era tudo de bom! Era tudo o que a menina mais sonhava! Viver com saúde e poder fazer as coisas que quisesse como correr atrás do sol, das nuvens, da meninada que ia sempre atrás dos vaga-lumes. Este foi o seu pedido de Natal para o Papai Noel. Um amanhã com um coração saudável em que ela pudesse sentir todas as emoções da vida sem se preocupar que, de repente, ele poderia parar.
Um amanhã para poder ir à casa da vovó, visitar a sua dentista predileta, pescar no rio da casa do titio Pedro, ir à escola e assistir a aula daquela professora dos olhinhos azuis que dizia não gostar de Deus e a menina ficava imaginando do que ela poderia gostar... não! Não queria mais assistir a aula daquela professora! Deus é a substância infinita do Universo! Aquele que criou tudo! E já tinha dito isso para ela umas cem mil vezes e cem mil vezes tirou nota zero e ficou de castigo, mas isso é outra história que eu conto para vocês em outro dia.
A menina dormiu a noite inteira naquele Natal bonito. Quando acordou abriu bem os olhos e viu Papai Noel no seu quarto estirando a mão para ela segurando uma boneca. Bem ficou chateada e desanimada. Certamente ele não leu a sua cartinha. E com cara de raiva a menina cruzou os braços e disse que não tinha pedido uma boneca, mas um amanhã. Papai Noel sem entender nada começou a chorar porque ele não entendeu o pedido dela
- Para que você quer um amanhã, menininha?
- Para poder viver mais a cada dia.
- Você já vive! Não tenha pressa para viver!
- É preciso ter pressa quando se tem um coração doente e sofrido, Papai Noel.
- Vamos fazer um combinado?
- Que combinado, Papai Noel?
- Eu lhe dou o meu coração de presente! Você quer?
- E como o senhor vai viver?
- Eu dou um jeito. Você vai ter um coração batendo aí dentro de um bom velhinho que gosta de gritar hô, hô, hô para as crianças e vai poder viver muitos amanhãs. Aceita?
A menina ficou com o dedo na boca, sem saber o que dizer, sem poder acreditar na proposta de Papai Noel e toda feliz da vida, balançando o pezinho, com um olhar tímido e cabisbaixa respondeu
- Quero, sim! É tudo o que mais quero na vida, Papai Noel! Eu quero um coração para poder viver muitos amanhãs!
- Então eu vou lhe dar o meu! Se arrume! Vamos logo para o hospital fazer o transplante!
A menina vestiu o seu vestido mais bonito, ajeitou a sua bolsinha e pegou na mão de Papai Noel. A mamãe como quem parecia já saber de tudo estava pronta na sala à espera dos dois. Entraram no carro e foram felizes para o hospital. Uma coisa era certa: a menina ganhou um coração novo e pôde viver milhares de amanhãs com o coração de Papai Noel batendo no seu peito. Só algo era engraçado o coração quando batia costumava fazer com que ela gritasse para todo mundo ao seu redor "hô, hô, hô, hô, feliz Natal!" e a menina vivia repetindo aquilo o ano inteiro. As pessoas achavam engraçado e a menina sorria contente, pois agora dormia cedinho na certeza de que viveria mais um amanhã. O amanhã espera sempre pela gente quando acreditamos que ele virá vestido de girassol ou de lírios, ele virá para mim e para você.