ONDE O VENTO SE ESCONDEU

ONDE O VENTO SE ESCONDEU...

Meu pai brinca comigo quase todo dia. Às vezes é só brincadeira em casa mesmo. Ele me joga para cima, aperta minha barriga e faz muitas caras engraçadas. A gente ri muito. Ele gosta de brincar comigo. Eu gosto de brincar com meu pai. Ele usa óculos e é bem grande. Meu pai é o maior pai do mundo, eu sei.

Ontem ele chegou do trabalho mais cedo. E trouxe uma pipa enorme. Ela parecia um morcego com olhos gigantes. Foi a pipa que eu pedi. E fomos nós soltar a pipa lá no campinho. Mamãe não quis ir, disse que ia fazer a janta. Meu pai beijou minha mãe, eu beijei minha mãe e saímos correndo.

Lá no campinho, eu segurei a pipa com minhas mãozinhas enquanto meu pai se afastava desenrolando a linha. Ele ficou lá longe e falou para eu só soltar a pipa quando ele mandasse. Ficamos assim, parados, um tempão. Eu vi que ele olhava para o céu e para as árvores toda hora. “Pai, corre”, eu gritei. Ele disse que estava esperando o vento chegar. Mas o vento não vinha. Cansei e baixei a pipa. Então ele mandou eu levantar de novo, levantei e ele saiu correndo do jeito engraçado dele, puxando a pipa e dando arranques de vez em quando na linha. Não adiantou. Não tinha vento. Ele enrolou a linha e veio até mim com um sorriso na boca. “Por que você ta rindo, pai?”, eu perguntei. “O vento sumiu, ta escondido, vamos procurar onde ele está.” Aquilo me deixou muito feliz, ele pegou na minha mão, eu segurei na mão dele e fomos embora atrás do vento, brincando e rindo como se o mundo fosse todo nosso.

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Isso aconteceu já faz tempo. Naquele dia, nós fomos em muitos outros locais abertos, não me lembro direito. Mas sei, sim, eu sei, que fizemos aquela pipa de morcego voar e a gente ficou gritando com ela, mandando virar ou subir mais. Lembro que voltamos para casa e minha mãe estava brava porque havíamos demorado. “Onde vocês estavam? A janta já esfriou”, ela disse. Meu pai fez aquela cara de olhar para baixo quando minha mãe dava uma bronca nele e não falou nada, então falei o óbvio:” - Ué, mãe, a gente tava procurando o vento.” Meu pai deu uma gargalhada e me abraçou. “E nós achamos, filhote”. Minha mãe riu também e tudo ficou bem.

Naquele momento eu não sabia, mas foi nesse dia que encontrei Deus e o que era ser feliz. E toda vez que a vida me roubava o vento da pipa, eu revisitava esse instante com meu pai e minha mãe me abraçando e tudo ficava bem.

Hoje eu procuro o vento com meus filhos e eles me olham como eu olhava para meu pai. Compreendi que encontrei Deus de novo com eles.

Olisomar Pires
Enviado por Olisomar Pires em 09/03/2022
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