A vendedora de bolos e Sartre
Todos os dias quando voltava da escola, a menina tirava a farda, largava os chinelinhos num canto e saía de casa para vender bolos pelas ruas da sua cidade. Sem comida em casa precisava ajudar a mamãe que sofria com dores nas costas.
Carregando uma bacia cheia de fatias de bolo, andava no seu passinho apressado dezenas de quilômetros.
Vendendo bolos conheceu muita gente diferente. Gente esquisita e outras bacanas. Até para gente de fala diferente da nossa vendeu bolo.
Havia o mecânico da oficina da rua de baixo que limpava as mãos cheias de graxa numa velha flanela e comia dez fatias de bolo de uma só vez.
- De quem é esse carro bonito?
- De uma madame ricaça, dizia ele de boca cheia.
Depois de receber as moedinhas do mecânico seguia seu caminho. Chegava à floricultura de seu Anastácio, um homem barrigudo e de bigodes enormes, que não tinha flores só o nome na placa, mas ele estava sempre à espera de um pedido. Seu Anastácio comprava cinco fatias de bolo todos os dias. A menina achava que ele comia as flores da floricultura porque quando falava da sua boca só saía cheiro de rosas e orquídeas. Era bem possível! Mais um que era esquisito!
A menina subia para a rua de cima e encontrava o que para ela chamava de “filófo” já que não conseguia chamá-lo pelo nome correto, ou seja, o filósofo Sartre que escrevia um livro há muitos anos sobre o Ser e o Nada.
- O que é o Ser e o Nada, Sartre.
- Para mim que criei o existencialismo o Ser seria a liberdade, ou seja, os homens são livres para fazerem as suas escolhas e o Nada seria a angústia formada quando o homem deixa de mentir para si próprio e passa a ser consciente das suas escolhas. Atribuímos as nossas escolhas a fatores externos, o que é errado para mim.
- Interessante o seu pensamento, Sartre.
- Pois é! Somos o que queremos ser, o que escolhemos ser; sempre podemos mudar. Isso é liberdade, menininha. Quem renuncia a própria liberdade sofre a consequência da má-fé que seria uma defesa contra a angústia criada pela certeza da liberdade.
- Então a má-fé seria a mentira para si próprio, Sartre?
- Sim, menininha! Quando o homem abandona a má-fé passa a ser consciente das suas escolhas, pois deixa de se enganar e ao fazer isso passa a viver num estado de angústia que seria o Nada. Isso explica o meu existencialismo.
- Existen... o quê? Não sei falar essa palavra. Ela é muito grande. Acho que é maior do que eu.
- Estou muito cansado e faminto. Me dê dez fatias de bolo, por favor. Ah! Separa uma para Simone!
- Quem é Simone, Sartre?
- A minha namorada! Simone de Beauvoir, também filósofa! Ela é muito bonita! Você precisa conhecê-la.
Sartre era bem diferente do mecânico. Lavava as mãos durante quase duas horas e as enxugava jogando-as no vento. Comia devagarzinho.
- Para mim o Nada existe de uma certa forma, seria a angústia gerada quando o homem deixa de se enganar quanto a sua liberdade.
A menina ao ouvir aquilo ficava curiosa para conhecer o Nada de Sartre com mais detalhes. Mas, ensinaram para ela que o Nada é coisa nenhuma. Aquele Sartre era muito estranho. Melhor não dar ouvidos para ele senão daria um nó no seu pensamentozinho. Já costumavam chamá-la de tontinha imagine se contasse a todos que o Nada existe.
No final da tarde, quando o sol já estava vestindo o seu pijama, a menina emborcava a bacia vazia, dobrava o seu paninho e feliz corria para casa com os bolsos cheios de moedas. Era hora de brincar. Afinal, crianças iguais a ela também gostam de brincar.
Todos os dias quando voltava da escola, a menina tirava a farda, largava os chinelinhos num canto e saía de casa para vender bolos pelas ruas da sua cidade. Sem comida em casa precisava ajudar a mamãe que sofria com dores nas costas.
Carregando uma bacia cheia de fatias de bolo, andava no seu passinho apressado dezenas de quilômetros.
Vendendo bolos conheceu muita gente diferente. Gente esquisita e outras bacanas. Até para gente de fala diferente da nossa vendeu bolo.
Havia o mecânico da oficina da rua de baixo que limpava as mãos cheias de graxa numa velha flanela e comia dez fatias de bolo de uma só vez.
- De quem é esse carro bonito?
- De uma madame ricaça, dizia ele de boca cheia.
Depois de receber as moedinhas do mecânico seguia seu caminho. Chegava à floricultura de seu Anastácio, um homem barrigudo e de bigodes enormes, que não tinha flores só o nome na placa, mas ele estava sempre à espera de um pedido. Seu Anastácio comprava cinco fatias de bolo todos os dias. A menina achava que ele comia as flores da floricultura porque quando falava da sua boca só saía cheiro de rosas e orquídeas. Era bem possível! Mais um que era esquisito!
A menina subia para a rua de cima e encontrava o que para ela chamava de “filófo” já que não conseguia chamá-lo pelo nome correto, ou seja, o filósofo Sartre que escrevia um livro há muitos anos sobre o Ser e o Nada.
- O que é o Ser e o Nada, Sartre.
- Para mim que criei o existencialismo o Ser seria a liberdade, ou seja, os homens são livres para fazerem as suas escolhas e o Nada seria a angústia formada quando o homem deixa de mentir para si próprio e passa a ser consciente das suas escolhas. Atribuímos as nossas escolhas a fatores externos, o que é errado para mim.
- Interessante o seu pensamento, Sartre.
- Pois é! Somos o que queremos ser, o que escolhemos ser; sempre podemos mudar. Isso é liberdade, menininha. Quem renuncia a própria liberdade sofre a consequência da má-fé que seria uma defesa contra a angústia criada pela certeza da liberdade.
- Então a má-fé seria a mentira para si próprio, Sartre?
- Sim, menininha! Quando o homem abandona a má-fé passa a ser consciente das suas escolhas, pois deixa de se enganar e ao fazer isso passa a viver num estado de angústia que seria o Nada. Isso explica o meu existencialismo.
- Existen... o quê? Não sei falar essa palavra. Ela é muito grande. Acho que é maior do que eu.
- Estou muito cansado e faminto. Me dê dez fatias de bolo, por favor. Ah! Separa uma para Simone!
- Quem é Simone, Sartre?
- A minha namorada! Simone de Beauvoir, também filósofa! Ela é muito bonita! Você precisa conhecê-la.
Sartre era bem diferente do mecânico. Lavava as mãos durante quase duas horas e as enxugava jogando-as no vento. Comia devagarzinho.
- Para mim o Nada existe de uma certa forma, seria a angústia gerada quando o homem deixa de se enganar quanto a sua liberdade.
A menina ao ouvir aquilo ficava curiosa para conhecer o Nada de Sartre com mais detalhes. Mas, ensinaram para ela que o Nada é coisa nenhuma. Aquele Sartre era muito estranho. Melhor não dar ouvidos para ele senão daria um nó no seu pensamentozinho. Já costumavam chamá-la de tontinha imagine se contasse a todos que o Nada existe.
No final da tarde, quando o sol já estava vestindo o seu pijama, a menina emborcava a bacia vazia, dobrava o seu paninho e feliz corria para casa com os bolsos cheios de moedas. Era hora de brincar. Afinal, crianças iguais a ela também gostam de brincar.