Uma menina em um velório
Rosângela Trajano
Igual a todos ela trouxe seu raminho de flores, fez sinal da cruz, fingiu olhar o morto e foi sentar-se junto à janela.
Cada gente que chegava ela observava curiosa: gente da família que nunca tinha visto. Gente vestida de preto, gente chorando alto, baixo e algumas apenas com o rosto triste. Se era para chorar, não sentiu vontade.
Não sabia quem era o morto. Como havia de saber? Ninguém falou nada para ela e o rosto dele estava coberto. Apenas mandaram colocar roupa branca e calçar sapatos novos.
Acanhada encostou-se mais ainda à cadeira enquanto todos choravam em lamento pelo morto. Veio padre benzer morto.
À noite, quando todos foram dormir a menina levantou-se, foi ver o morto. Não teve coragem de olhar para o seu rosto. Pegou as mãos dele. Estavam frias. A menina sentiu arrepio. Pobre morto, passar sua última noite sozinho em casa de desconhecido ainda mais. Ela fez companhia para ele. Cantou-lhe canções que aprendera com alguém mais velho do que ela, contou-lhe histórias de cavaleiros corajosos que aprendera com alguém mais velho do que ela.
A manhã já vinha nascendo quando a menina pela primeira vez teve curiosidade de saber quem era o morto e foi tirando o lencinho devagar do seu rosto.
Oh! Que pena! Se soubesse que era seu avô não o teria cansado com as canções e histórias que ele conhecia mais do que ela. Caiu em prantos.
Em raiva de saber-se nunca, tirou todas as flores de cima dele, descalçou seus pés porque era a única pessoa que sabia dele não gostar andar calçado, foi buscar chapéu de palha e tentou colocar na sua cabeça. Mexeu pra lá e pra cá. Aconteceu o que não esperava. O morto do caixão caiu e a casa toda acordou.
Oh! Será que o vovô machucou a coluna?
O funeral terminou às quatro da tarde. Em casa, a mãe, o pai, a tia e o primo da menina sorriram da sua travessura.
Rosângela Trajano
Igual a todos ela trouxe seu raminho de flores, fez sinal da cruz, fingiu olhar o morto e foi sentar-se junto à janela.
Cada gente que chegava ela observava curiosa: gente da família que nunca tinha visto. Gente vestida de preto, gente chorando alto, baixo e algumas apenas com o rosto triste. Se era para chorar, não sentiu vontade.
Não sabia quem era o morto. Como havia de saber? Ninguém falou nada para ela e o rosto dele estava coberto. Apenas mandaram colocar roupa branca e calçar sapatos novos.
Acanhada encostou-se mais ainda à cadeira enquanto todos choravam em lamento pelo morto. Veio padre benzer morto.
À noite, quando todos foram dormir a menina levantou-se, foi ver o morto. Não teve coragem de olhar para o seu rosto. Pegou as mãos dele. Estavam frias. A menina sentiu arrepio. Pobre morto, passar sua última noite sozinho em casa de desconhecido ainda mais. Ela fez companhia para ele. Cantou-lhe canções que aprendera com alguém mais velho do que ela, contou-lhe histórias de cavaleiros corajosos que aprendera com alguém mais velho do que ela.
A manhã já vinha nascendo quando a menina pela primeira vez teve curiosidade de saber quem era o morto e foi tirando o lencinho devagar do seu rosto.
Oh! Que pena! Se soubesse que era seu avô não o teria cansado com as canções e histórias que ele conhecia mais do que ela. Caiu em prantos.
Em raiva de saber-se nunca, tirou todas as flores de cima dele, descalçou seus pés porque era a única pessoa que sabia dele não gostar andar calçado, foi buscar chapéu de palha e tentou colocar na sua cabeça. Mexeu pra lá e pra cá. Aconteceu o que não esperava. O morto do caixão caiu e a casa toda acordou.
Oh! Será que o vovô machucou a coluna?
O funeral terminou às quatro da tarde. Em casa, a mãe, o pai, a tia e o primo da menina sorriram da sua travessura.