Diabruras I (conto em 3 partes)
"- Ô mãe, hoje eu não vou pra escola. Vou é namorar!"
E antes que a jovem e corpulenta senhora, de passos curtos e apressados, pegasse a vara de marmelo e alcançasse aquele pequeno demônio de oito anos, o jovem já se encontrava na porteira do sítio, ainda enfiando sua melhor camisa de domingo pelo cós das calças.
Bento não tinha jeito. Era arisco, respondão, inteligente e engraçado.
Nascera de oito meses e, talvez por isso, sempre andasse apressado - justificava sua cansada mãe.
Era conhecido de todos no interior de Minas Gerais, e o vilarejo amargava suas diabruras. O padre tentara de tudo: joelhos no milho; pintura da cerca; cuidado com os porcos... Castigos que talvez pudessem domar aquele gênio incontrolável, sempre inclinado a fazer besteiras.
Nas reuniões escolares, os pais das outras crianças sempre tinham queixas contra ele, que iam de puxões de cabelo ao sumiço dos lanches - todos os lanches.
Bento estava bem longe de ser um menino abençoado, mesmo tendo passado pelo batismo e iniciado a catequese. Tudo pra ele era chato, exceto quando o assunto era Maria.
Maria era a filha do açougueiro. Tinha sete anos e longas madeixas castanhas que lhe caiam generosas pelos ombros.
Foi amor a primeira vista, a primeira missa e ao primeiro dia de aula.
Não havia nada que Bento não fizesse para chamar a atenção daquela que lhe ocupava os pensamentos dia e noite.
Todos os castigos tinham valido a pena, porque Maria o havia notado e Bento tinha certeza de que seu amor era correspondido.
- Bento, foi você quem roubou as flores do velório?
- Claro que sim. Foi pra dar a Maria, uai!
- E o porquinho do Seu Nicolau?
- Bem, a Maria queria muito um bichinho, e não pode com gatos. Ela é alérgica, sabia não?
Tudo tinha um porque e nenhum talvez quando se tratava de atender aos caprichos de Maria. A professora já havia chamado os pais de ambos, num esforço para controlar aquele "amor" infantil que causava tantos dissabores, quanto boas risadas. Até que era bonitinho, pensava.
Porém, nada é tão ruim que não possa piorar, e uma coisa Bento não podia tolerar. De jeito nenhum, mas não mesmo!
Certo dia, numa das inúmeras reuniões a que a mãe de Bento e o pai de Maria foram chamados, os pequenos repararam uma aproximação mais que necessária de seus "idosos" pais. Notaram que os viúvos também passaram a conversar muito depois da missa e, vez ou outra, o pai de Maria presenteava a senhora com um quilo ou dois de sua melhor peça de carne.
- Você notou como teu pai olha pra minha mãe, Maria? Parece que ele tá pronto pra devorar uma bisteca saída da churrasqueira.
- Você está exagerando Bento, eles ficaram amigos por causa da gente.
- Sei não Maria, melhor não arriscar. E se eles resolverem se casar? A gente não vai poder mais namorar. A gente vai virar irmão, e isso é sacrilégio! Né não?
A ideia estava incomodando tanto o menino, que ele matutava dia e noite um plano que pudesse afastar os dois.
Eis que ele teve uma iluminação.
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Continua...