O PASSARINHO FEIO

O PASSARINHO FEIO

Eu sou o Passarinho Feio. Um Curió desajeitado que nasceu numa gaiola velhinha com ninho de palha. Meu canto era cheio de falhas e eu tossia demais por causa de uma asma; com isso, eu fui desprezado pelos criadores de passarinho que ganhavam muito dinheiro conosco nos campeonatos de canto.

Os criadores faziam apostas para ver qual dos passarinhos cantava por horas e horas sem desafinar.

Minha mãe era linda! Quanta saudade eu tenho dela!

Chamava-se Charmosinha. Tinha cor azulada que brilhava com a luz do Sol e um canto praia que parecia de uma soprano de ópera.

Mas eu só conheci minha mãe por poucos dias, pois as pessoas só nos queriam se tivéssemos um canto que pudessem explorar nos campeonatos.

Minha mãe cantava tão bem, mas tão bem, que o dono dela, Zelão, a vendeu ao Seu Ricardinho, que foi prefeito da cidade e sabia do valor do nosso canto – já que tinha contatos na cidade grande com empresários de aves.

Zelão não via muito bem por causa da diabetes que tinha desde criança: nem óculos dava conta.

Era ingênuo e morava com suas filhas. Não conseguia ver maldade em Ricardinho, que o enganava com mentiras.

Zelão criava os passarinhos para tentar se distrair, enquanto Ricardinho ficava rico vendendo meus irmãos, primos, tios e tias.

Ricardinho oferecia fêmeas e machos de Curió, para Zelão, que ele capturava no mato: uma coisa proibida e maldosa.

Ricardinho roubava ovos nos ninhos da floresta e Zelão não sabia disso.

Um dia eu comecei a chorar por saudade da minha mãe, Charmosinha. Mas não era choro na cabeça de Zelão e Ricardinho: eles entendiam como canto.

Ricardinho disse:

- Zelão, abre a gaiola para esse Passarinho Feio sair e ir embora. Não vale um tostão.

Prontamente, Zelão atendeu a ordem de Ricardinho: soltou-me, este Passarinho Feio que aqui vos fala.

E eu saio voando.

Eu bati asas e voei desesperado em busca do Sol.

Sai desajeitado da gaiola e nem disse adeus a Zelão pelos alpistes que me deu.

Cansado de voar, pois minhas asas eram fracas demais, sentei num muro perto. Mas senti uma pata passando perto de mim, com garras afiadas. Dei um pulo enorme: era um gato preto e esfomeado. Fugi dele, afff.

Antes ficasse com Zelão, pois lá tinha proteção.

Certo dia, o Juiz da Cidade, Dr. Caxias, fica sabendo da criação de passarinhos que Zelão tem em sociedade com Ricardinho. Isso por meio de uma denúncia do vizinho de Zelão, que não gostava dele.

Manda o juiz que a Policia Ambiental vá e prenda todo mundo e mande os animaizinhos para um viveiro. Isso para que os ajude a voar novamente e irem para Mãe Natureza.

Zelão está preso. Suas filhas choram na frente da delegacia.

O Passarinho Feio que vos fala voa ali perto e conhece as meninas. Curioso, ele ouve uma das meninas de Zelão falar:

- Como soltaremos o papai, um homem tão bom?

Foi ai que eu pensei. Como eu voo, eu poderia entrar de noite na cadeia e soltar Zelão.

Esperei o delegado e o carcereiro dormirem.

Voei bem devagar, quase que pulando a passos pequenos.

Fui junto à fechadura, dei 10 bicadas com meu biquinho no ferrolho; Zelão viu então a porta aberta e saiu bem de fininho, enquanto eu voei pela janela da cela, no vão das grades, pois sou pequenino.

Zelão pegou sua mulher e filhas e foi morar num sítio muito distante da cidade e de Ricardinho, que havia sido inocentado. Foi inocentado Ricardinho por contratar um advogado bem caro para defendê-lo, colocando toda culpa em Zelão, que não teve outra saída que não fosse desaparecer.

O processo contra Zelão foi esquecido depois de 5 anos pelo Juiz Caxias, mas Zelão nunca mais esqueceu o Passarinho Feio que havia desprezado.

Nunca mais prendeu e vendeu Curiós.

Chegou até a compor uma música em minha homenagem, pois tocava violão muito bem, que você pode ouvir no YOUTUBE:

https://www.youtube.com/watch?v=GC2_jlFwVnQ

LUCIANO DI MEDHEYROS
Enviado por LUCIANO DI MEDHEYROS em 29/06/2018
Código do texto: T6377119
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