Joãozinho e Joaninha
“O mundo já é espetacularmente maravilhoso,
mesmo sem mágica nele”.
(Joãozinho)
Em uma singela casa de madeira morava Joãozinho, uma criança faceira.
Quando sentia que pequena sua casa parecia, a janela da sala sorrindo ele abria, e, assim, maior o seu mundo ficava. Da janela o sinal da escola ele ouvia, cheirava o doce aroma da sorveteria, sentia na pele o afável calor do sol, e podia ver os amigos na praça jogando futebol.
Joãozinho gostava da escola, gostava de sorvete, e gostava de jogar bola.
Também gostava de desenhar. Desenhava tudo o que via. E do que ele mais tinha esperança era de poder desenhar qualquer coisa mágica que tivesse visto um dia.
Um dia, enquanto na sala Joãozinho desenhava, pela janela livremente entrou ela – uma adorável joaninha que por ali passava. E se uma joaninha comum já deixaria qualquer um contente, imagine essa que era bem diferente! Mais parecia uma fada – era uma joaninha dourada.
Nada parecido com o que Joãozinho já conhecia. É certo que ele já tinha visto de perto joaninha vermelha com pintinha preta e joaninha verde com pontinho violeta. Também já tinha visto joaninha alaranjada com pontinho amarelo e até joaninha cor de caramelo. Mas uma joaninha toda dourada ele nem sabia que existia. Tudo era dourado naquela pequena. Das pintinhas às patinhas. Das asas às antenas.
E tendo entrado pela sala elegantemente, a joaninha decidiu pousar no braço do sofá educadamente, circulando de lá para cá, parava e depois rodopiava, escalava e descia, ia e voltava, suavemente, como se fosse um sininho, tilintando as asinhas brilhantes igual purpurina e fazendo brilhar também os vítreos olhos de Joãozinho, que imaginou que talvez estivesse o sol tão feliz àquele dia que tivesse rido e rido, até chorar de tanto que ria, e aquele divertido ser pequenino bem que seria um pinguinho caído do sol, um confete de pura alegria.
Joãozinho já estava bastante contente por receber a joaninha tal qual recebesse um presente, até que ela foi chegando pertinho de Joãozinho. Foi chegando e foi chegando, e pousou confortavelmente na palma de sua mão que nem uma radiante gotinha de ouro. Joãozinho sentiu-se com sorte, como se tivesse encontrado um tesouro.
O que a joaninha queria ele não sabia de fato, só sentia que aquele momento mais parecia mágico. Um sentimento tão agradável e perfeito que não podia ser bem explicado, mas que podia voltar a qualquer hora do dia sem precisar ser convidado.
Algo aconchegante feito poesia.
Sem perda de tempo, Joãozinho decidiu desenhar a joaninha dourada para contar aos amigos da escola sobre a mágica visita alada. Pegou logo seus lápis coloridos e uma folha branca de papel para retratar o mágico encontro com sua amiga cor de mel. Começou a desenhar com atenção, procurando não inquietar sua pequena visita, que reluzia em sua mão como uma delicada pepita. Mas, tal qual estivesse atrasada, a bela joaninha dourada voou da mão de Joãozinho de volta à janela, e, tremulando as asas com graça, igual a um cometa apressado que passa, do mesmo jeito que viera, se fora, talvez indo visitar outras casas.
Sem poder ver mais sua amiga, o coração de Joãozinho ficou inquieto, seu desenho, incompleto, e em sua mão uma coceirinha bem onde pousara a joaninha. E se perguntava como podia aquela tão pequenina surpresa ter deixado em sua mão uma saudade acesa de querer mais uma vez reencontrar-se com aquele pontinho dourado e poder mostrar aos amigos da escola seu desenho inspirado.
Então, Joãozinho teve uma ideia. Na beirada da janela deixou para a joaninha um pedaço de pão com mostarda e mortadela. E em um canto do sofá, com folhas e barbante, construiu em um instante um hotel acolhedor para a joaninha ficar.
Mas disso nada adiantava. A hora passava, e passava o dia. E a Joaninha não aparecia.
Joãozinho até colou para ela um convite na parede: “Para a joaninha linda”. Com papel verde e tinta amarela, escreveu: “Seja bem-vinda”.
Na sala passou a dormir. Do lençol fez um telhado entre as estantes e a cadeira, e passava a noite inteira em seu acampamento engraçado esperando a amiga vir.
Mas disso nada adiantava. A hora passava, e passava o dia. E a Joaninha não aparecia.
Enfim, Joãozinho, de bom grado, refletiu que aquele momento mágico não voltaria, e levaria para a escola seu desenho a contento, mesmo que inacabado.
E sendo assim, na escola, antes que a hora do recreio chegasse, a professora pediu que Joãozinho contasse do seu jeito sobre seu estranho feito para toda a classe.
Joãozinho começou sua história entusiasmado, mostrando a todos o que havia desenhado: uma criança a sorrir com um lápis de cor na mão, pronta a tudo colorir.
— O que é – o que é – um pontinho invisível na minha mão? É uma joaninha mágica que saiu voando e deixou uma coceirinha – explicou.
Os amigos de Joãozinho não viam mesmo nada. Portanto ele continuou a contar sua história inusitada:
— Eu nunca tinha visto uma joaninha dourada, e queria tanto – tanto – desenhar alguma coisa mágica! Mas a joaninha, sem demora, voou e foi embora. Então passei a procurar por ela a toda hora. Quando vinha da minha casa para a escola e da escola para casa, eu procurava e procurava por aquele pontinho dourado. Eu olhava a grama, eu olhava as árvores, eu olhava os muros das casas, até que eu percebi uma coisa linda – mas não era a joaninha –, era uma coisa tão linda quanto minha amiga joaninha, uma coisa que estava diante de mim todos os dias. Eu percebi que a grama cresce rápido quando chove, que tem um ninho de passarinho na árvore em frente de casa, e que o sol pinta o céu de muitos rosas e azuis. Eu não vi mais minha joaninha dourada, mas, enquanto eu procurava por ela, eu vi todas essas outras coisas. Foi aí que eu parei de procurar, porque eu descobri que o mundo já é espetacularmente maravilhoso, mesmo sem mágica nele.
Assim Joãozinho terminou de partilhar o que aprendeu, enquanto seus amigos viam o que com ele aconteceu. A professora percebia também, mesmo que um pouquinho, que um tanto diferente estava o aluno Joãozinho.
E chegada a hora do recreio, enquanto amigos dividiam seus lanches ao meio, algumas crianças foram brincar de pique, outras, de piquenique.
De repente, uma pedrinha amarela de giz caída das mãos de uma menina que jogava Amarelinha foi rolando distraída pelo caminho até quicar nos pés de Joãozinho. E, dando uma olhadela para a menina que também o olhava, foi devolver gentilmente a ela o giz cor de canela com o qual ela brincava.
Acontecia que a menina também gostava de desenhar, e inventara de desenhar uma Amarelinha diferente com aquela pedrinha de giz. Joãozinho achou tão criativo o desenho cheio de novos e graciosos caminhos que brincar com a menina ele logo quis.
E riam jogando e pulando, indo e vindo eles riam.
— Qual o seu nome? – Joãozinho lembrou-se de perguntar.
— Joana – respondeu sorrindo a menina, e os dois se cumprimentaram apertando as mãos pequeninas.
Foi então que Joãozinho sentiu mais uma vez uma coceirinha na mão. Não sabia o que era de fato, só sentia que aquele momento mais parecia mágico. Um sentimento tão agradável e perfeito que não podia ser bem explicado, mas que podia voltar a qualquer hora do dia sem precisar ser convidado.
Algo aconchegante feito poesia.
Algo que Joãozinho sentia no peito, como um pontinho.
Um pontinho dourado.