O colosso
Lenphyr era um colosso de pedra que abrigava uma sociedade em cada ombro. Providenciava todos os recursos naturais necessários para que ambas as sociedades vivessem em paz. Seus pelos eram as árvores, as bactérias que ali viviam eram os animais que serviam de alimento para aquelas cidades, seu suor e lágrimas formavam rios e cachoeiras, e seu olhar era a visão de futuro para aquelas duas civilizações.
Andava errantemente em busca de um semelhante, porém colossos havia muito tinham sido extintos. Ele era o último, ao que parecia, mas acreditava não ser; e por isso nunca cessava andar, de forma que continuava a suar e prover água para aquelas pequenas pessoas que ali viviam.
As duas civilizações eram pacíficas e jamais fizeram agressões mútuas. E assim seguiram por séculos.
Certo dia, Lenphyr, após caminhar por todo o mundo conhecido e não encontrar nenhum outro colosso, entristeceu-se e desanimou. Pensou por alguns meses que, de fato, era o único colosso andando sobre a terra e começou a chorar copiosamente enquanto andava. Por alguns anos, suas lágrimas foram tão constantes que encheram lagos e permitiram que aquelas duas civilizações progredissem enormemente, todavia, isto não durou para sempre. O colosso, certo dia, resolveu descansar e abandonar a busca por seus semelhantes. Seu suor acabou e os rios foram secando aos poucos de forma que se tornaram insuficientemente provedores para aquelas sociedades, agora, enormes. Lenphyr ficou sem lágrimas e não mais choveram bênçãos para aquelas pequenas pessoas. Era o início do fim.
O que era paz mútua, tornou-se agressão. Com a escassez de alimentos, ambas as sociedades passaram a guerrear entre si pelo monopólio das riquezas naturais que ainda restavam naqueles, agora, pobres territórios. Morte e caos se instauraram e a civilização mais forte subjulgou a mais fraca. Com o grande número de mortos, o problema da fome estava sanado; mas não a questão da água. Os civis sabiam que as nascentes dos rios vinham de debaixo das rochas, portanto não demoraram a decidir explorar o interior do colosso. Equipes de implosão se puseram a trabalhar e de mineiros a explorar. Não tardaram a encontrar água e, claro, a extraí-la para sua própria subsistência. A civilização soberana, que agora controlava as duas cidades, voltou a prosperar. E o colosso começou a desmoronar.
Como uma doença silenciosa que vem a lhe enfraquecer lentamente, aquelas pessoas foram destruindo a saúde do colosso aos poucos de forma que, após algumas décadas de exploração, Lenphyr não possuía mais forças para se erguer ou movimentar os braços para se defender. Sua saúde estava debilitada e aquelas civilizações também.
O sangue que escorria do colosso tornou o chão seco em fértil, criou mares e gerou vida. A que lhe era retirada, dava vida onde não havia uma. E assim ele foi morrendo. Aos poucos. Até que o colosso desmoronou completamente ao chão, formando uma imensa cadeia de montanhas. Dali, do chão, Lenphyr avistava outras cadeias de montanhas longínquas, as quais outrora foram os colossos que ele sempre estivera procurando. Estavam ali o tempo todo, apenas tão fracos que não conseguiam se erguer ou responder aos seus chamados. Não conseguiam dar sinal de vida, pois ali já não havia mais nenhuma.
E, da cadeia de rochas gigantes, saíram os humanos com um mundo quase infinito ao seu dispor diante de seus olhos. E não tardaram a explorá-lo assim como fizeram com Lenphyr, tal qual outras civilizações mais antigas em chão fizeram com seus colossos quando ainda estavam no ar, no alto de seus ombros.