Uma amizade Improvável
Há poucos dias assistia a um desenho animado na tv, com a minha netinha. Eu não prestava muita atenção no filme. Divagava sobre qual animal eu poderia escrever um conto. Quando desisti, devido à completa falta de inspiração, quis saber dela do que se tratava o filme. Era sobre um ratinho que sonhava ser um fino cozinheiro. Pobre ratinho! Sofreu horrores com o preconceito dos humanos e da sua própria família. Cada um no seu quadrado, era a lição que lhe impunham a todo momento. Imagine um restaurante requintado, tendo como o seu melhor cozinheiro, um rato! Porém, como em todo filme infantil que se preze, os mocinhos venceram no final e os preconceituosos sucumbiram. O filme me lembrou uma canção sobre um ratinho, o Ben, composta por Michael Jackson, lá pelos anos 70, e a procurei na internet para mostrá-la à minha neta, que não a conhecia. Ela, então, me disse: “Vó, por que você não inventa uma estória sobre um ratinho? Acho que ficaria legal, bem diferente, que tal?” De repente, eu me lembrei de um rato, sim, e não precisaria inventar uma estória. Ela aconteceu de verdade e foi muito significativa para mim:
Há muitos anos, quando a minha filha, hoje mãe desta neta, era ainda adolescente, apareceu com duas ratinhas brancas, destas chamadas cobaias, e as enfiou dentro de casa. Pensei morrer de nojo e medo. - É o fim do mundo, é o cúmulo da rebeldia, é o modo mais rápido de matar uma mãe, suma com isso daqui, ai-que-nojo... As ratas ficaram. A primeira providência que elas tomaram como novas donas da casa foi a de destruírem as capas dos meus melhores discos de vinil. – Bom, ratos vivem, no máximo, dois ou três meses, então, tudo o que eu tenho a fazer é esperar que esse tempo passe rápido... Fiz uma prateleira, com uma tábua, na parede da despensa e coloquei comida e água, na esperança, não muita, que elas permanecessem só ali. E, para minha surpresa, elas se comportaram exemplarmente. Faziam menos sujeira quando comiam, que a minha própria filha. A outra sujeira, a da saída, não era assim um sacrifício tão grande (para a filha) limpar, Passamos a conviver pacificamente mas, sem intimidades, por favor.
Um dia, quando cheguei do trabalho, exausta e aborrecida, me sentei no sofá, perto da minha filha, sem perceber que ela estava com as duas ratinhas no colo. – Ai! Tira isso de perto de mim! – Calma, mãe, olha, passa a mão nelas, sente a maciez dos pelos... Vai, mãe, coragem... Não passei, mas não resisti quando a minha mão foi levada até uma delas. – Tá, passei, agora tira daqui.
Num outro dia, a minha filha: - olha, mãe, que legal! – batia com um dedo no chão e as ratinhas vinham correndo até ela. – Tenta, vamos ver se elas vão até você. Tentei. Elas vieram. Passei a mão nelas e senti-lhes a maciez dos pelos.
Ah! Vamos resumir essa história: todos os dias, quando eu chegava do trabalho, lá da porta mesmo, eu já tamborilava os dedos no chão e, de onde estivessem, vinham correndo em minha direção, e todos os dias era uma festa. Eu me sentava no sofá e elas passeavam pelos meus ombros, pescoço, cabeça, emaranhavam meus cabelos e ganhavam muito, muito carinho. Aprendi, por elas, a andar com passos lentos dentro de casa, a não fazer movimentos bruscos para não assustá-las, a fazer e a me permitir afagos, a não ter mais preconceitos de espécie alguma. Hoje, não há criança ou bicho, sejam de quais tamanhos forem, que eu não saiba como dosar a minha força e os meus gestos, para deixá-los seguros diante de mim.
Não viveram dois ou três meses como supunha a minha ignorância, mas quase dois anos. Ainda assim, lamentei profundamente a vida tão curta de ratinhas brancas, cobaias de laboratório e gente. Uma delas morreu de causa não identificada, simplesmente a encontramos morta. A outra foi atacada por um gato, que não sei de onde surgiu, e morreu acariciada, na palma da minha mão. Pena esta história não ser infantil. Gostaria que fosse. Nas histórias infantis não se conta a morte dos mocinhos. Só contei porque achei importante dizer quem desembruteceu a palma da minha mão.
Imagem da Internet
Há poucos dias assistia a um desenho animado na tv, com a minha netinha. Eu não prestava muita atenção no filme. Divagava sobre qual animal eu poderia escrever um conto. Quando desisti, devido à completa falta de inspiração, quis saber dela do que se tratava o filme. Era sobre um ratinho que sonhava ser um fino cozinheiro. Pobre ratinho! Sofreu horrores com o preconceito dos humanos e da sua própria família. Cada um no seu quadrado, era a lição que lhe impunham a todo momento. Imagine um restaurante requintado, tendo como o seu melhor cozinheiro, um rato! Porém, como em todo filme infantil que se preze, os mocinhos venceram no final e os preconceituosos sucumbiram. O filme me lembrou uma canção sobre um ratinho, o Ben, composta por Michael Jackson, lá pelos anos 70, e a procurei na internet para mostrá-la à minha neta, que não a conhecia. Ela, então, me disse: “Vó, por que você não inventa uma estória sobre um ratinho? Acho que ficaria legal, bem diferente, que tal?” De repente, eu me lembrei de um rato, sim, e não precisaria inventar uma estória. Ela aconteceu de verdade e foi muito significativa para mim:
Há muitos anos, quando a minha filha, hoje mãe desta neta, era ainda adolescente, apareceu com duas ratinhas brancas, destas chamadas cobaias, e as enfiou dentro de casa. Pensei morrer de nojo e medo. - É o fim do mundo, é o cúmulo da rebeldia, é o modo mais rápido de matar uma mãe, suma com isso daqui, ai-que-nojo... As ratas ficaram. A primeira providência que elas tomaram como novas donas da casa foi a de destruírem as capas dos meus melhores discos de vinil. – Bom, ratos vivem, no máximo, dois ou três meses, então, tudo o que eu tenho a fazer é esperar que esse tempo passe rápido... Fiz uma prateleira, com uma tábua, na parede da despensa e coloquei comida e água, na esperança, não muita, que elas permanecessem só ali. E, para minha surpresa, elas se comportaram exemplarmente. Faziam menos sujeira quando comiam, que a minha própria filha. A outra sujeira, a da saída, não era assim um sacrifício tão grande (para a filha) limpar, Passamos a conviver pacificamente mas, sem intimidades, por favor.
Um dia, quando cheguei do trabalho, exausta e aborrecida, me sentei no sofá, perto da minha filha, sem perceber que ela estava com as duas ratinhas no colo. – Ai! Tira isso de perto de mim! – Calma, mãe, olha, passa a mão nelas, sente a maciez dos pelos... Vai, mãe, coragem... Não passei, mas não resisti quando a minha mão foi levada até uma delas. – Tá, passei, agora tira daqui.
Num outro dia, a minha filha: - olha, mãe, que legal! – batia com um dedo no chão e as ratinhas vinham correndo até ela. – Tenta, vamos ver se elas vão até você. Tentei. Elas vieram. Passei a mão nelas e senti-lhes a maciez dos pelos.
Ah! Vamos resumir essa história: todos os dias, quando eu chegava do trabalho, lá da porta mesmo, eu já tamborilava os dedos no chão e, de onde estivessem, vinham correndo em minha direção, e todos os dias era uma festa. Eu me sentava no sofá e elas passeavam pelos meus ombros, pescoço, cabeça, emaranhavam meus cabelos e ganhavam muito, muito carinho. Aprendi, por elas, a andar com passos lentos dentro de casa, a não fazer movimentos bruscos para não assustá-las, a fazer e a me permitir afagos, a não ter mais preconceitos de espécie alguma. Hoje, não há criança ou bicho, sejam de quais tamanhos forem, que eu não saiba como dosar a minha força e os meus gestos, para deixá-los seguros diante de mim.
Não viveram dois ou três meses como supunha a minha ignorância, mas quase dois anos. Ainda assim, lamentei profundamente a vida tão curta de ratinhas brancas, cobaias de laboratório e gente. Uma delas morreu de causa não identificada, simplesmente a encontramos morta. A outra foi atacada por um gato, que não sei de onde surgiu, e morreu acariciada, na palma da minha mão. Pena esta história não ser infantil. Gostaria que fosse. Nas histórias infantis não se conta a morte dos mocinhos. Só contei porque achei importante dizer quem desembruteceu a palma da minha mão.
Imagem da Internet