O Mistério dos Ovos
Na fazenda viviam quase todas as espécies de animais imagináveis dentre aqueles que, direta ou indiretamente são de auxílio indispensável ao homem. As vacas produziam o melhor leite, as ovelhas a melhor lã, as abelhas o mais puro e delicioso mel e os porcos a carne de melhor qualidade. O único e grande problema eram as galinhas; elas viviam pelos cantos, desanimadas e não punham mais ovos. A venda de ovos e frangos representava para o proprietário uma boa parte de sua renda e toda a pequena cidade dependia daquela produção que agora se via extinta.
Eis que, num belo dia, as galinhas ouviram, sobre a cobertura metálica de sua casa, um barulho que não lhes pareceu familiar. Uma delas, superando a preguiça, esticou para fora de seu poleiro o fino pescoço e teve tempo de avistar uma águia alçando o seu voo. Cochicharam entre si e decidiram, por fim, investigar o que uma águia estaria fazendo sobre sua casa. Todas, reunidas e em círculo, discutiam uma forma de averiguar o ocorrido.
- Vamos aproveitar o nosso passeio da tarde pelo quintal e ver o que ocorre lá em cima – disse a mais velha do galinheiro.
- Mas como faremos isso se não conseguimos voar? – indagou desanimada uma outra.
- Isto não deve ser problema para mim – disse um dos galos – darei o meu jeito – concluiu.
À tarde, enquanto distraiam-se em seu banho de sol, lembraram ao galo de sua promessa. Ele estudou as chances de chegar ao topo do galinheiro ou pelo menos de avistá-lo. Deu voltas por ali, avaliou as distâncias e viu que a potência do seu salto não o levaria até o local desejado. Divisou então a caixa de eletricidade colada ao muro; saltou sobre ela e dali para um galho de uma árvore próxima. Qual não foi a surpresa do galo ao ver sobre o teto do galinheiro um belo ovo de águia.
- Você precisa averiguar de perto. Algo me diz que aquele não é um ovo qualquer e nem foi colocado ali por acaso – disse a veneranda galinha.
No dia seguinte, empreenderam nova reunião para se decidirem sobre o próximo passo. Mesmo sendo o esforço do galo superior a sua própria capacidade e natureza de galo ele aceitou a isto se entregar e, naquela mesma tarde, lá estava a ave em um dos troncos da árvore do quintal.
Dali para o teto do galinheiro lhe bastava um impulso; mas deixou-se dominar pelo medo. Decidiu então subir mais dois estágios da árvore e, lá do alto se jogar para o seu objetivo. “De cima para baixo não há como errar o alvo; embora possa me custar umas pernas quebradas”, pensou. Decidido a não pensar muito mais do que isso, passou para a ação. Conseguiu cair inteiro e sem ferimento e lá estava ele ao lado do ovo de águia.
Chamou-lhe logo a atenção um bilhete bem ao lado do objeto. Os próximos pensamentos a lhe intrigar a cabeça foram como sair dali com a carga, pois para isso é que ali se encontrava. Não o haviam preparado nem orientado para esta a situação. Depois de pensar um pouco encontrou uma solução prática que funcionou a contento. Fez do bilhete uma sacolinha, jogou dentro o ovo e conseguiu assim retornar, carregando no bico a encomenda.
Mal entra no galinheiro é cercado por todos os seus habitantes. Encantaram-se com o tamanho e formato do ovo de águia e, tomadas pela curiosidade, estenderam no chão o bilhete e puseram-se a lê-lo. Dizia o seguinte:
“Sabemos do seu desespero em voltar a fornecer ovos para a fazenda. E estamos por isso, trazendo a solução para o caso. Quebre este ovo dentro de um vasilhame grande e desfaça a casca em tantos pedacinhos quanto possível; cada pedacinho representa um ovo de galinha se deixado em seus poedouros. Quanto ao vasilhame cubra-o e não mexa nele até que meus filhotes nasçam e comecem a emitir pios; mas aí já estarei por perto. Boa sorte”.
Passaram-se algumas semanas e aí começou o alvoroço dentro do galinheiro. Muitos pedacinhos da casca, que deveriam ter sido espalhados de acordo com o número de galinhas, esparramaram-se pelo recinto e originaram ovos muito além da quantidade normal e possível. O dono, mesmo atarantado e sem entender o que ocorria, não conteve a alegria de ver tantos ovos e tratou de colhê-los e expedi-los.
Depois foi a vez dos filhotes de águia; eles nasceram às dezenas e, com o seu movimento, antes que algo pudesse ser feito para impedi-los, lançaram no chão a tina que lhes servia de abrigo. O homem, ao ver isto na manhã seguinte não conteve o espanto. Munido de vassoura para varrer a sujeira e de um cesto para colher os ovos, preparou-se para entrar no galinheiro, mas qual não foi o seu susto ao ver uma águia se aproximando. Ela vinha em fúria em sua direção e o teria seriamente ferido se ele não tivesse fugido para outro canto e se abrigado.
Trazia firme em seu bico uma bolsa com alça e foi recebida com toda admiração e respeito pelos donos da casa. Um a um foram colocados os filhotinhos dentro da bolsa e a águia partiu feliz e satisfeita com a sua magnífica ideia que deu certo em todos os sentidos.
- O que iremos fazer quando esgotarem-se os pedacinhos da casca do nosso ovo? Eles já estão no final! – disse preocupada uma das galinhas.
- É melhor que não nos preocupemos. Por que não confiar na providência da dona águia? É certo que virá outras vezes – disse a veneranda.
- Ela já conseguiu o que queria; por que voltaria outras vezes?
- Não existe apenas uma águia no mundo. Não se esqueça disso. É a
forma que encontraram de terem a são e salvos os seus filhotes com tantos predadores andando a solta.
E parecia certa a veneranda. Passados alguns dias a mesma cena se repetiu e outro ovo foi visto e resgatado de cima do galinheiro. Quanto ao proprietário, nunca descobriu o que de fato ocorria, pois a águia o vigiava e atacava no momento certo, impedindo que penetrasse no galinheiro até que fossem todos os filhotes recolhidos e postos em segurança pelo bico da mãe zeladora e atenciosa. Não faltaram ovos, não houve perdas de vidas, tampouco de freguesia; tudo por um entendimento, colaboração e empenho que fazem toda e qualquer história ter um final feliz.