O Plano
Reunidos sob a sobra da mangueira, no quintal do seu Astolfo, alguns garotos deliberavam sobre um assunto delicado, um caso de vida ou morte.
- Chamei todos para esta reunião de emergência porque um membro do Clube Xis precisa de ajuda – começou Renato, presidente do clube – O Nhonho está apaixonado por uma garota e a gente precisa bolar um plano para que ela goste dele também.
- O Nhonho tá amando! O Nhonho tá amando! – brincou Jaiminho – E eu até acho que sei quem é a menina...
- Selminha! – responderam todos em uníssono.
O menino enrubesceu em meio às risadas dos amigos. Era extremamente tímido quando o assunto era a Selminha. O ar lhe faltava quando chegava perto dela na hora do recreio tentando oferecer um pouco do seu lanche. Sabia que o que sentia por ela só poderia ser amor, pois nunca antes pensara em dividir o lanche com alguém. Com o seu coraçãozinho apertado, resolveu apelar aos amigos.
- Pois bem, amanhã todos nos reunimos novamente aqui, no mesmo horário, e cada um vai trazer uma ideia para o Nhonho conquistar a Selminha. E começamos o Plano Todos por Nhonho.
Os meninos estavam empolgados com a missão. Foram para casa, pois já era aquela hora em que as mães costumam aparecer nas janelas fazendo ameaças caso eles não voassem direto para o chuveiro. No dia seguinte, a turma apresentou suas ideias.
Renato foi o primeiro. Ele havia pesquisado na internet e lera alguns artigos que revelavam que uma boa forma física costuma atrair garotas. Por isso, elaborou um programa de exercícios físicos para Nhonho perder uns quilinhos e deixar de ter aquela cara de amigão que ele tinha. Fizeram-no correr ao redor da quadra enquanto a turma gritava palavras de incentivo como “Força!”, “Você consegue!” e “Corre que o Matador está atrás de você!”. Matador era o pitbull do Cauê, totalmente inofensivo com os garotos, mas que Nhonho morria de medo. Depois o colocaram para fazer flexões (Nhonho, não o Matador), abdominais, levantamento de latas de tinta, entre outras coisas.
- Parece que o Nhonho não aguenta mais nada, gente. Tá todo molhado de suor e vermelho como um pimentão. Aliás, acho que a Selmiha pode gostar dele assim. Alguém aí sabe se a cor favorita dela é o vermelho?
- Há quanto tempo estamos treinando?
- Vinte minutos.
- Uau, o Nhonho é forte mesmo!
- Eu acho que está bom, já estou percebendo ele diferente, e vocês?
- Eu também.
- Puxa, ele até parece que ficou mais alto.
A próxima ideia veio do Jaiminho. Ele pediu ajuda do seu avô, o seu Astolfo, que sempre apresentava boas ideias para a turma. O seu Astolfo sugeriu que Nhonho usasse um amuleto da sorte quando fosse conversar com a Selminha. E por sorte, o avô do Jaiminho, havia viajado para muitos lugares e ajuntado muitas coisas legais que guardava em sua antiga oficina. Depois de revirar algumas caixas encontrou um chaveiro de pé de coelho meio encardido que disse ter pertencido ao próprio Pedro Malasartes. Todo garoto sabe que mais sortudo que Malasartes não existe. Assim, depois que o avô lavou o pé de coelho (e explicou que isso não tiraria a sorte dele), entregou para que Jaiminho emprestasse ao amigo. Os demais garotos ficaram impressionados com o talismã e Renato teve que fazer uma lista de espera para que todos pudessem usá-lo após o Nhonho.
Um dos garotos trouxe um livro de piadas para o Nhonho contar e fazer a Selminha sorrir, só porque vivia ouvindo o irmão mais velho dizer que fazer uma garota sorrir era meio caminho andado. Outro menino revelou que convencera o Matsuda a trocar de lugar com o Nhonho para que ele ficasse sentando ao lado da Selminha, tendo que se desfazer de algumas figurinhas de super-herói para isso. Mas o amigo valia o esforço. Ainda outro garoto fez um desenho muito bonito e escreveu um poema que conquistaria o coração da Selminha, como costuma dar certo nos filmes. Era assim:
Selminha linda do meu coração
Quando você aparece eu gosto muitão
Mas quando não aparece eu caio no chão
E machuco o dedão.
A turma toda considerou que era uma poesia bem bacana e que a Selminha só poderia amar. A última sugestão apresentada para o Plano Todos por Nhonho foi ele dar uma flor de presente para a amada. Como quem dera a ideia foi o Borges, cuja mãe tinha um quintal cheio de flores, ele pegou uma bastante colorida, mas como não teve coragem de arrancá-la, trouxe-a com o vasinho e tudo.
O treinamento finalmente havia chegado ao fim. Era chegada a hora de colocar em prática. Não tinha como o plano não funcionar: Nhonho estava confiante.