O Piau
Era uma vez o dia mais belo que já ouve no cerrado piauiense. As mais variadas espécies de plantas cobriam um chão rico em biodiversidade. Não havia outro lugar que se comparasse a esse. Mais para o norte, suas plantas e animais eram um bom exemplo de região ecológica.
Nessa paisagem, um tucunzeiro jogava sua sombra às margens de um riacho, rodeado de vegetação. Um piau escolheu neste justo dia colocar a cabeça para fora d’água. Era um peixe de porte médio, uns 28 cm, e de olhos serenos, porém curiosos. Do terno olhar, que abrigava o desejo de descoberta, foi que nasceu o sentimento de morar na terra. E eram tantos os sonhos que num piscar de olhos ele pulou na areia e concretizou a almejada fantasia.
Às margens do riacho, pelo mês de setembro, abrigava um capim rasteiro e umas poucas salsas, que rastejavam em direção às águas. Mas na margem direita, havia um frondoso ipê amarelo todo em flor – o maior ponto de encontro dos pássaros durante o dia ensolarado.
Essa árvore chamou a atenção do piau e, muito surpreendido, pela semelhança da coloração das flores com a luz do sol, pensou em passar um tempo por ali. Pois esse ipê, a natureza o formara de tal modo e tão desenvolvido que seus galhos caíam um pouco para dentro do riacho e, algumas flores encostando-se ao chão úmido produziam um efeito dourado no solo, que nem o desconhecido daquele tipo de lugar fez o peixe desistir – e foi explorá-lo.
Ora, o sol deixava os pássaros contentes sempre com seu tom brilhante, ora as flores do ipê produziam movimentos nos galhos como que acendidas de luz. E juntos, deixaram o peixe confundido, já não sabia a quem admirar primeiro. Entretanto de repente o animal pensou em comer um pouco daquelas flores e, assim, inspirado pela curiosidade, comeu com gosto.
Jamais se viu um animal mais satisfeito com a refeição, que na sobremesa, quis comer um pouco dos talos. Mas, sem gulodice, desistiu. E para fazer melhor digestão, tirou um cochilo ali mesmo onde estava.
O resto do dia correu calmo mas, quando o sol galantemente foi dormir, o piau ficou aterrorizado e perguntou às flores:
_ O sol foi para sempre embora?
As flores responderam com emoção:
_ Não, apenas é noite, amanhã ele estará conosco outra vez!
O piau quis dar a entender que estava com medo e mais sozinho ainda. Não havia mais banhos ao luar, muito menos podia levar amigos para conversas debaixo de uma pedra no fundo do riacho.
Enquanto isso a noite seguia carregada de escuridão. O solitário piau estendeu as nadadeiras à procura de um fluxo de água e, igualmente, mexeu-se de um lado para outro, mas apenas areia encontrou. Ficou sem saber como dormir, e pensou que os peixes deviam estar no maior descanso dentro do riacho. Finalmente julgou ter ouvido um movimento de chuva e até chegou a sentir água corrente nas escamas. Foi imensa a saudade!
E mal acreditando que passara o dia fora de casa, deu uns três suspiros e pulou para as águas.
Em meio à alegria do peixe, as flores disseram:
_ Bendito seja o filho que retorna a casa!