O GALHO SECO
O senhor Aquiles, carinhosamente chamado de Quilinho pela população do vilarejo, era proprietário de uma pequena chácara onde cultivava árvores frutíferas de várias espécies. Recebera de um amigo um caroço de manga com a seguinte recomendação:
- Compadre Quilinho, eu trouxe especialmente pra você. Plante, regue, cuide bem quando ela nascer, e eu lhe garanto que sua chácara nunca viu uma mangueira igual a essa. Despediu-se e continuou o caminho.
Quilinho mais que depressa escolheu um lugar isolado, cavou a terra, deitou o caroço, empurrou com o pé a terra retirada para fechar o local, regou pela primeira vez, e saiu. Seu pensamento era um só:
- Severino nunca mentiu. Não é dessa vez que ele vai me enganar.
Passaram-se dias até Bituca germinar. Os cuidados acentuaram-se. Meses seguiram-se. Após dois ou três anos, Bituca floresceu. Abelhas, borboletas e pássaros tornaram-se seus visitantes habituais ou mesmo hóspedes. Sua folhagem, de um verde brilhante, chamava a atenção dos passantes. Quilinho estava orgulhoso de sua Bituca. Era linda!
Ao anoitecer transformava-se no quarto de dormir de sanhaçus, sabiás, pardais, golinhas, canários, xexéus, fura-mangas, e alguns outros pássaros que se hospedavam esporadicamente quando de passagem por ali.
- Aquela mangueira só pode ser mal assombrada – dizia um. Outro dava a sua opinião:
- Só pode ser um mistério.
E o assunto corria a solta pelo vilarejo
Tudo por causa de uma mangueira. Ela germinara, crescera, desenvolvera-se sob os cuidados de Quilinho. Na primeira floração os insetos – principalmente as abelhas – foram atraidas em virtude do néctar. Mais tarde, com a chegada dos frutos, pássaros e mais pássaros tomaram-na como seu abrigo e fonte maravilhosa de alimentação.
Até aí, nada que chamasse a atenção. Porém havia um galho que secava a cada dia. Enquanto os outros pululavam de pássaros, ele estava vazio. Sentia-se inútil e só. Continuava definhando pouco a pouco.
Certa manhã um casal de fura mangas pousou no galho seco. E começaram a cantar. A sinfonia era magistral. Apesar de pequenos, suas siringes vibravam produzindo trinados de beleza indescritível. E naquele galho inútil começaram a preparar o ninho. Tariscas, algodão, palha, folhas secas eram o material necessário. Uma semana de um trabalho intenso e quase sem descanso. Antes de dormir no galho seco, cantavam um pouco. Foi a maneira encontrada para agradecer ao galho semimorto. Durante a alvorada Xixo e Xixa aproveitavam o momento para soltar sustenidos e bemóis que encantavam a todos. Todos os dias – pela manhã e à tardinha – o galho seco recebia esse alento de vida.
Ninho concluído, Xixa tomou posse para esperar os seus filhotinhos. De vez em quando deixava o ninho para alimentar-se e Xixo tirava uma de vigia. Os dias seguiam-se rapidamente. Quilinho sempre vinha visitar Bituca. Certa tarde enquanto colhia algumas mangas...
- Não! Não pode ser! É um mistério, é um milagre o que estou vendo.
Do galho seco brotaram folhinhas verdes e brilhantes. O canto de Xixo e Xixa fez com que o velho galho renascesse.
Durante esse intervalo havia dois filhotes no ninho. Gulosos e inquietos não deixavam pai e mãe sossegados. Enquanto um buscava comida, o outro ficava “de olho.” Em duas semanas estariam prontos para voar.
O galho cobriu-se de folhas, pequenas flores tomavam toda a sua extensão. Tudo agora era diferente. O galho seco ganhara vida outra vez, graças ao Xixo e Xixa.
Na manhã seguinte, mal o sol despontara, era realizada a última alvorada. Fora do ninho e cobertos de folhas e flores, Xixo, Xixa e os dois filhotinhos, prontos para o primeiro voo, cantaram, cantaram, cantaram, para o galho, agora florido e cheio de vida. Depois despediram-se e voaram não se sabe para onde. O que se sabe porém, é que Quilinho quando viu aquele galho, caíram lágrimas dos seus olhos castanhos. Bituca estava completa. Linda. E em pouco tempo pendiam do galho, mangas de uma doçura sem igual. Graças a um casal de fura-mangas que encantou o galho seco com o seu canto.
21/02/2012
ALMacêdo