JÁ É TEMPO DE NATAL – Parte 2

— Fareco, por que você ficou tanto tempo olhando pra dentro daquele banco? Você está me assustando, você está pensando em roubar?

— Tá loco brodi?! Fica assim não Pepê, é uma coisa triste sabe... Meu pai antis de mim nascer trabaiava naquele banco.

— Isso não é triste, é legal trabalhar em banco, Fareco.

— Triste é o resto Pepê, minha mãe num quis eu e queria tirar eu, meu pai que pediu ela pra ficar comigo, mas depois ele arrependeu e bebeu tanto que mandaro ele imbora do banco.

— A Isolda não queria você?

— Não, aquela num é minha mãe, meu pai juntô com ela e teve mais seis fio.

— E onde está sua mãe?

— Num quero sabê, ela num quis eu, ouvi meu pai dizê que ela quiria um homi muito rico pra casá, e dexô eu com ele, e foi embora com o ricaço.

— Isso é triste...

— Pepê, cê reparô aquele homi ali, parece que tá siguino a gente, já vi ele hoje treis veiz.

— Sabe quando eu fiquei aqui e você estava no sinal, fazendo malabarismo, ele veio aqui e perguntou o meu nome e o seu.

— Bora daqui brodi, isso num tá bom.

Os dois amigos sumiram na multidão, alguns transeuntes os olhavam com cara de assustados, mas eles seguiam brincando e vivendo em um mundo alheio a tanta incompreensão. Jantaram e tomaram banho em um abrigo para menores, onde faziam passagens costumeiras, recusaram o convite para pernoitar e voltaram às ruas. A escadaria onde dormiam estava molhada, chovia intensamente, mas ficaram espremidos em um canto embaixo da pequena marquise, Pedrinho sorria para um Papai Noel, que Rafael insistia em dizer que não via.

Às onze da noite um carro para em frente à escadaria, descendo dele, os pais de Pedrinho e o detetive que os seguia há dias.

Pedrinho piscou para o Papel Noel imaginário e desceu a escadaria em disparada para o colo do pai.

Depois do longo e emocionante reencontro, Pedrinho insistiu que levassem Fareco junto. A mãe consentiu a contra gosto e todos voltaram para casa.

— Qui quarto manero brodi! Qui parada legal... Que cê procura nessa gaveta, Pepê? Sua mãe disse pra durmi, tá tardi, qui festa manera brodi, eles gosta mesmo docê.

— A festa foi legal mesmo Fareco, eu já vou deitar, estou procurando uma foto, do meu avô, ele era igualzinho ao Papai Noel que está sempre na escadaria e você não vê.

— E purquê ele num veio na festa?

— Ele já morreu, era um vô legal demais, Fareco, você ia adorar ele.

— Olha ele é este aqui e este sou eu... Ele é mesmo o Papai Noel.

— Melhó durmi Pepê, cê tá ficano loco, brodi... Seu vô, Papai Noel?

Assim que Pedrinho dormiu, Rafael se levantou e andou pela casa, chegando à sala, ouviu uma conversa entre a mãe e a avó de Pedrinho, quando ela discursava a indesejável permanência do menino criado nas ruas em sua casa.

Corriqueira manhã chuvosa, faltando seis dias para o natal, Pedrinho acorda e ao perceber que Rafael não estava mais na casa, decidi voltar ás ruas, e viver em companhia do amigo.

Lilia Costa
Enviado por Lilia Costa em 05/12/2011
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