SAUDADE DO MEU PAI DO TEMPO DE CRIANÇA

Neste dia dos pais de 2011

pensei em fazer uma homenagem ao meu pai

meu grande amigo e companheiro Edízio Mendonça.

E, ao tentar dormir ontem, pensei nisso.

E, buscando algumas lembranças da minha vida,

resolvi homenagear um outro pai,

aquele outro pai dos meus tempos de criança.

Aquele pai ainda jovem, ainda com seus cabelos pretinhos.

E, voltando no tempo, vieram-me muitas lembranças,

gostosas e saudosas lembranças de um tempo feliz.

Lembrei do meu pai indo comigo pra roça,

um dia, a tardezinha, fomos ao encontro do meu avô Ezequiel.

A princípio, não sei o que levou meu pai a fazer isso,

pois ele, sempre ocupado com os trabalhos da prefeitura,

nunca tinha tempo de um descanso na roça.

Mas,hoje,tantos anos depois, sei que meu pai sentia saudades de mim,

eu morava com meus avós adotivos, eu era o seu primeiro filho,

e ele queria mostrar-se presente,ser pai, ser amigo e companheiro,

queria que eu percebesse isso, que eu tinha um pai também.

Pois bem, chegando na roça, a pé, pois ficava perto da cidade,

ele ficava observando o juazeiro perto do tanque,

talvez lembrando dos seus tempos de menino, da sua infância,

com bodoquinho no pescoço, ali naquele ambiente rural.

E, andando comigo dentro da roça, ele parou em frente a uma cerca.

Era uma cerca velha, com um grande buraco,

que dava para passar pra roça de Rui Pacheco.

De repente, vejo meu pai, passando pelo buraco da cerca,

e indo pegar os umbus na roça do velho Rui.

Pensei: se meu pai passou, vou passar também.

Nos nossos pés de umbu já não tinha mais nada,

O jeito foi saborear aquela fruta gostosa da roça vizinha.

O senhor se lembra disso meu pai? Enchemos a capanga de umbús...

Poxa pai, que saudade! O senhor tão jovem, tão forte,

e aquele garotinho ali ao lado cheio de admiração,

vendo-o tão saudável, tão ativo e tão forte,

um pai tão presente em minha vida.

Mais tarde voltamos pra casa, eu, meu pai, e meu velho Ezequiel.

Passando pelo famoso “caminho da raposa”,

meu velho avô e meu pai, iam conversando,

falando sobre as coisas do Governo Castelo Branco,

estávamos nos anos 60, tempos da boa política,

e eu, como não entendia de nada, ia pela beira da cerca,

atirando balas de cascalho nos passarinhos.

Este caminho saudoso não existe mais, tudo foi cercado,

a nossa antiga roça fica agora bem perto da rua Oscarino Campos.

Meu velho avô também já se foi,

deixando um grande rastro de saudades em nossos corações.

Um dia, com o peito carregado de tanta saudade, ainda fui la na roça.

Fui ver se ainda via alguma coisa deixada por meu velho Ezequiel.

Até um rastro meio apagado já servia pra mim, mas não vi nada.

A roça hoje não nos pertence mais, já têm outros donos.

Pra mim e pra meu pai, restaram apenas grandes fardos de saudade.

Quando chegamos na entrada da rua Juracy Magalhães,

encontramos vários meninos, felizes, na maior algazarra,

respondendo os refrões do palhaço borrachinha:

"ô olha o sol e olha a lua", e, a criançada respondia:

"É o palhaço no meio da rua"...

"E a cachorra o que é que tem?"...a criançada respondia:

"carrapato no sedém"...

E o palhaço cantava, e o palhaço pulava, fazia suas trapalhadas,

andando em cima de duas pernas de pau gigante,

chegando a ficar com a mesma altura dos postes de madeira.

A criançada o acompanhava pelas ruas esburacadas,

para depois entrar de graça no espetáculo circense.

e la ia o palhaço, cantando e as crianças respondendo,

todas ansiosas para ter o braço pintado e ganharem os ingressos.

Em outros anos, eram outros palhaços, lembro-me de alguns,

a exemplo de pindura, mazagão, pirulito, ratinho, etc.

Poxa que maravilha, tinha circo na nossa cidadezinha,

meu coração batia em disparada de tanta alegria.

Pensei em correr atrás do palhaço também,

mas confiava no meu amigo que estava ali ao meu lado,

eu tinha certeza que meu pai levava-me pro circo...

Toda vez que chega um circo aqui, ele não me deixa de fora,

pensava todo feliz e orgulhoso, tamanha era a confiança em meu pai.

À noite, que maravilha, o Circo do Borrachinha tocando as músicas,

me lembro até da canção Adelita,que me deixava muito emocionado,

aliás, a cidade inteira ficava comovida ao ouvir esta música.

E quando o locutor do circo anunciava:

daqui há pouco vai começar o espetáculo.

Nossa, aquilo deixava-me estremecido, ansioso, nervoso,

Pois meu pai sempre se atrasava pra me levar pro circo.

Corria, todo aflito pelas ruas esburacadas da minha terra,

Como a luzes dos postes de madeira eram fraquinhas,

eu não tinha tanta visão e muitas vezes acabava caindo,

tinha alguns buracos no começo da rua Maria da Glória,

na mesma rua onde ficava o prédio da antiga prefeitura,

e não tinha como não cair com minhas perninhas magras e frágeis.

A aflição era muito grande, a vontade de entrar no circo

ultrapassava qualquer coisa, nada me servia a não ser ir pro circo.

E meu pai la embaixo, ainda na prefeitura, trabalhando.

Chegava correndo, de tão cansado, a voz quase não saía:

Pai, anda ligeiro o “circo já vai começar”.

Não sabia falar a palavra espetáculo, falava circo mesmo.

As vezes ele me respondia de modo grosseiro,

Talvez atrasado com os trabalhos da prefeitura,

ficava estressado e eu, tão menino não sabia entender,

so queria saber de ir pro circo, meus amigos já tinham ido,

so faltava eu, nossa, que situação, se eu perdesse o espetáculo,

poderia até morrer de tanta ansiedade,

de tanta vontade de ver os palhaços.

E meu pai la, sentado na mesa, com um monte de papéis em volta,

Eu entrava na sala, olhava e voltava pra rua,

e quando ouvi as músicas do circo, o nervosismo aumentava,

com medo de tocar a música de abertura do espetáculo.

Na sala de pai, acho que eu entrava e saía umas 50 vezes.

Mas o que eu não sabia, meu pai sabia,

ele sabia direitinho o horário do espetáculo,

o locutor do circo apenas fazia pressão pras pessoas irem logo,

Pra lotar as arquibancadas, pra vender mais ingressos.

Mas toda criança é assim, ingênua e ansiosa demais.

De repente meu pai aparecia, pegava na minha mão

e me levava pro circo, enfim, o meu desejo era realizado.

Nossa, que alegria, passando pelas ruas todo orgulhoso,

sentindo o dono do mundo, seguro na mão do meu pai,

quando eu chegava na antiga Praça Militão Coelho,

via os ônibus do circo parados no encostamento,

Ao lado do circo, aquilo pra mim era mágico, maravilhoso,

ônibus na minha cidadezinha era novidade,era um fato raro.

Faltava arrancar os dedos do meu pai ao entrar dentro do circo,

não dar pra descrever a emoção que eu sentia

quando entrava dentro daquele mundo encantado...

O circo pra nós, crianças, naquela época era coisa do outro mundo,

Teve a mesma importância que teve a televisão

quando chegou aqui no começo dos anos 1980.

Meus olhos brilhavam de tanta alegria,

tão pequenino, por entre os braços do meu pai,

sentado nas cadeiras do camarote,

meu pai, por ser Secretário Municipal não pagava ingresso,

e tinha direito de sentar nas cadeiras, dentro do camarote,

bem pertinho dos artistas circenses.

As vezes eu observava meu pai me olhando,

com aquele semblante de um pai orgulhoso e feliz,

afinal, naquele momento, seu filho era a criança mais feliz do mundo,

vendo tanta coisa bela e encantadora,

tantas coisas de difícil entendimento,

a exemplo das mágicas que os artistas faziam.

É, pai, não era pra menos,

estou aqui com os olhos molhados de tanta emoção,

de tanta saudade, muita saudade mesmo,

saudade daqueles tempos felizes que os anos não trazem mais.

hoje, meu pai está envelhecido, cabelos brancos,

rosto enrugado, pernas bambas, um caminhar já lento,

braços cansados, mente cansada, mas ainda ativa,

cheia de sonhos ainda, cheia de saudades ainda.

Eu sei pai, o senhor não pode mais ser o mesmo,

não tem mais tanto tempo pra estar ao meu lado,

como eu também não tenho pra estar perto do senhor,

mas, jamais esqueço de ti meu pai, todas as noites me lembro de ti,

e até fico preocupado com a tua vida, com o teu futuro,

com a tua saúde, hoje o senhor está com 73 anos,

e ainda me preocupo com tuas noites mal dormidas.

Mas ainda está la, como nos anos 60, ainda trabalhando à noite,

ainda servindo à nossa terra e ao nosso povo,

não mais dentro da prefeitura, mas numa casa ao lado,

agora num canto só dele, num prédio só para ele,

na atual Secretaria de Cultura e Turismo.

Estou terminando este texto à 01h08min da madrugada,

e, tenho certeza que nesta hora ele está la, no seu cantinho,

com a mesa cheia de papéis e documentos,

mas agora com um moderno computador ao lado,

acessando a internet, feliz com o avanço tecnológico,

talvez tão feliz como eu era nos tempos de criança...

Ainda está la, organizando fotografias antigas,

revisando textos de futuros livros,

e, ainda com a mesma vontade de servir a nossa terra,

e ao nosso povo, como sempre o fez.

Hoje, feliz com a internet, com tantos recursos para pesquisas,

falando com os amigos pelos quatro cantos deste país.

Eu, continuo por aqui, também com meus milhares de arquivos,

convertendo centenas de fitas de vídeo em dvd,

também preocupado com a história e com a cultura da minha terra,

organizando meus textos para apresentar na rádio amanhã,

também organizando as milhares de fotografias antigas,

para postar no orkut ainda esta semana,

e, com o peito carregado de saudade dos tempos infantis,

saudade dos circos de antigamente,

saudade daqueles artistas maravilhosos, meus heróis inesquecíveis,

saudade dos palhaços Pindura, Polegar, Mazagão,

Borrachinha, Ratinho e tantos outros,

tantos outros que me alegraram nos anos 1960 e 1970.

Hoje, raramente vem um circo à minha terra,

mas já não tem o mesmo encantamento, a mesma mágica

de tempos passados, hoje a televisão mudou tudo.

E, quanto ao senhor meu pai, felicito-o por mais um ano de vida,

por mais um dia dos pais, que Deus te proteja e te dê mais saúde.

Ainda esta semana tenho outras lembranças pra ti,

lembranças em forma de amor, de carinho, de amizade e gratidão.

Obrigado meu pai por me fazer tão feliz

no meu distante tempo de criança.

Eduardo Mendonça
Enviado por Eduardo Mendonça em 12/08/2011
Reeditado em 12/08/2011
Código do texto: T3154917