CONTO DE ESCOLA

Minha escola era pequena e só tinha um professor, que desdobrava-se dando aulas para todos os alunos do primário. As várias séries se distribuíam pela manhã e à tarde. Aos sábados só havia aula na parte da manhã, o que obrigava todo mundo a apinhar-se na mesma sala, enquanto o mestre fazia o que podia para dar atenção diferenciada a quem dele precisasse.

Havia alunos que vinham de longe, do meio rural, e eram verdadeiros heróis. No tempo em que nem se cogitava de transporte escolar, tinham de caminhar muitos quilômetros através de matos e campos cultivados, numa rotina diária e resignada.

Num daqueles sábados, acabando-se a aula, dois desses meninos foram-se juntos para casa, como era seu costume. Até a certa altura iam acompanhados de mais alguns colegas, que não moravam tão longe. Em dado momento um deles sacou do bolso um pedaço de giz, que apanhara no quadro-negro à hora do recreio. O outro, revelando-se igualmente esperto, tirou também do bolso um giz, e ambos riram-se contentes da proeza.

E a ideia, com o giz na mão, era escrever qualquer coisa. Já saindo do perímetro urbano e passando por um velho galpão abandonado, um deles escreveu na parede esta frase: A rua é pública. O outro quis também escrever e, sem ter melhor ideia, simplesmente imitou o gesto do colega, escrevendo alguns metros mais além o mesmo pensamento. A rua é pública. E os dois seguiram adiante sozinhos, pois naquele ponto os demais colegas separaram-se deles.

Na segunda-feira pela manhã já havia alguém denunciando ao mestre o ato dos dois moleques. Um deles estava presente, o outro viria à tarde. O professor, bastante contrariado, chamou o garoto e cobrou-lhe explicações pelo procedimento. Enérgico quando necessário, o homem sabia muito bem castigar seus alunos a golpes de vara de marmeleiro. O menino sentiu medo, mas a surra não veio ainda naquela hora. A intenção do mestre era agora ouvir a outra parte, o outro "vândalo".

À tarde ele veio, e o interrogatório e a repreensão foram os mesmos. O mestre perguntou-lhe como arranjara o giz, quem escreveu primeiro, quem lhe ensinou a escrever na rua, e por aí adiante. O menino sentiu medo, mas a surra não veio ainda naquela hora. O mestre queria mais uma conversa com o outro, na manhã seguinte.

E de novo repreendeu-o severamente, dizendo que era malcriação e mau exemplo para os demais. "Foi teu pai que te ensinou a escrever com giz aí pelas ruas?". O menino não conseguia entender a gravidade do problema, não tinha uma explicação convincente e pedia ao mestre que perguntasse ao outro.

Mas com o outro era a mesma coisa. Durante a semana inteira o professor chamava um pela manhã, outro pela tarde, tentando arrancar de um e outro uma justificativa e talvez querendo fazê-los entender que o crime fora realmente bárbaro.

Eu tinha apenas sete anos e não captava a razão daquele inquérito diário, mas acho que consegui compreender um bom tempo depois. O professr queria fazê-los sentirem-se culpados e, no sábado pela manhã, dar o desfecho ao caso, castigando-os a ambos à frente de todos.

E não foi outra coisa o que se deu. Os dois garotos levaram cada qual uma dúzia de golpes na mão direita. Foi um castigo para nenhum deles esquecer e para servir de exemplo aos demais.

Assunto encerrado, depois daquilo os dois não mais se meteram a escrever na rua, nem nas paredes. Suponha-se que tenham ficado tão traumatizados que, por conta própria, não escreveram nem mais uma frase na vida.

Os castigos eram realmente eficientes.

Egon Werner
Enviado por Egon Werner em 11/07/2011
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