Uma casa na árvore.

De todas as crianças da segunda série, Tadeu evoluiu mais rápido, tinha um senso de bondade sem igual; apanhava dos meninos das outras séries, mas não planejava vingança. Seu irmão mais velho, um garoto de 12 anos, alto e encorpado demais para sua idade era bem diferente do magrelo de dentes grandes envoltos por aparelho de borrachas azuis, era o preferido, mas Tadeu não se sentia inferiorizado. Ele queria viver num mundo bonito, como nos contos de seus livros.

Certo dia , num passeio escolar, ele foi ao museu. E antes de entrar viu um homem sentado na calçada, na frente de um imenso prédio comercial. Com roupas sujas, pés encardidos e olhar distante, era invisível para os homens e mulheres bem arrumados que passavam apressadamente por ele, e Tadeu não conseguia parar de olhar, sua tiveram que chamá-lo três vezes até ele atender. No museu a professora mostrava os quadros, os esqueletos, os animais empalhados e nada disso tirava o olhar triste de Tadeu. Ele pensava no pobre homem, queria que ele também tivesse biscoitos amantegados e chocolate quentinho toda tarde.

No caminho para casa não disse uma palavra, todos comentando sobre o passeio e Tadeu no seu canto quieto, pensativo. Era um garoto decidido e queria uma solução para sua preocupação. Ao chegar em casa continuou mergulhado em seus pensamentos.Pegou seu livro favorito, o menino do dedo verde, e releu pela décima vez. Acabou por adormecer...

O caminho não parecia distante, não precisou pegar um ônibus e esperar uma hora até chegar ao centro da cidade. Ele simplesmente apareceu em frente ao pobre homem, morador da calçada movimentada, sentou-se ao seu lado. Da mochila vermelha dos power rangers, tirou um um sanduíche, envolto por papel alumínio. Com um sorriso de dentes podres, o homem pegou o lanche e o devorou em poucos segundos, em seguida Tadeu pegou sua garrafinha térmica azul e a passou para o homem, que por sua vez bebeu vagarosamente, se deliciando do suco de manga preparado por dona Angélica, a cozinheira da casa.

No dia seguinte o garoto acordou mais calmo e sereno, decidido a fazer o sonho virar realidade. Tomou seu café da manhã e saiu para a escola. No seu quintal tinha uma árvore bem grande e seu pai, havia contratado pessoas para construir uma pequena casa em cima dela. Tadeu pediu de aniversário e a data ja estava se aproximando, as obras começaríam em breve.

Antes de ter visto aquele homem, Tadeu não pensava em outra coisa a não ser na sua casa na árvore,um lugar para ficar sossegado e ler seus livros sem ninguém para perturbar. Mas nesse dia o menino sequer se lembrou de seu pedido, passava os minutos ocupado demais pensando em ajudar o morador de rua. Ao atrevessar o quintal em direção a porta principal, Tadeu olhou para sua futura casa na árvore e teve um estalo. " JÁ SEI O QUE FAZER!" - gritou Tadeu, fazendo todos os trabalhadores pararem para olhá-lo. Agora com a solução de seu problema, saltitava a caminha da escola. A cada cinco minutos olhava para o relógio, como se assim o tempo passasse mais rápido.

Ao chegar em casa, foi direto ao escritorio de seu pai, um advogado de meia idade com cabelos grisalhos, olhos rígidos. Dono de um corpo robusto e forte. Era um bom homem, mas sempre sentira que não era justo com Tadeu, pois sua preferência por Lucas, o filho mais velho, era nítida.Por mais que tentasse esconder sempre estava babando pelo filho que era a sua cara, tinha sua personalidade e seu jeito de encarar as coisas. Tadeu era mais como sua mãe, sensível, educado e sonhador, para Pedro ele era um fraco, mas tinha que amar o caçula também.

-PAI, PAI , PAI - Gritou eufórico, abriu a porta sem lembrar de bater na porta, como exigia seu pai.

- Volte e bata na porta, Tadeu.- Disse Pedro asperamente, olhando por cima dos óculos. E o garoto refez o caminho,com permissão entrou devagar no escritorio,sentou na cadeira em frente a mesa de seu pai e calmamente disse:

-Pai, eu queria mudar o meu presente de aniversário.... Não o presente, só o lugar.

- O que você quer dizer com isso ? Você ja viu quantas pessoas estão lá fora trabalhando naquela casa boba ?

- Eu sei, pai... - Tadeu encolheu os ombros e passou a olhar para o chão,- é que eu queria apenas que mudasse a casa de lugar, não quero mais que seja no quintal.

Pedro olhou para seu filho com curiosidade, para onde o menino queria levar esta casa? Se perguntou; retirou os óculos, colocando-os em cima da mesa, empurrou a cadeira para trás e num gesto carinhoso, convidou o filho para sentar-se em seu colo. O menino deu a volta na mesa e obediente fez o que o pai mandara.

-Explique-se- Alisando os curtos cachos de Tadeu, Pedro olhava-o com atenção.

- É que no outro dia eu fui ao museu e tinha um homem dormindo na calçada, aí queria ajudar, até sonhei com isso. E hoje de manhã quando estava indo para a escola, tive essa idéia...

-Que idéia, fiilho ?

- Eu quero que leve a casa lá pra cidade, e coloque numa árvore de lá para o moço morar, aí ele vai ter uma casa e não vai mais dormir na rua !

Antes mesmo do menino terminar de falar, seu pai começou a rir. O entusiamo de Tadeu passou no mesmo instante, com medo de mais uma vez sofrer uma repreensão do pai.

-Entendi a sua idéia,mas as cosias não são faceis assim, não podemoa sair construindo casas em cima das árvores, principalmente no centro da cidade, antes mesmo de começar a construir os policiais vão impedir. Você entende isso ?

- Entendi, mas será que a gente não pode fazer isso de noite ? - perguntou Tadeu, esperançoso. Pedro negou com a cabeça e retirou o filho do colo, colocando-o de pé a sua frente.

-Não podemos, Tadeu. Sinto muito, não tem como colocar sua casa da árvore na cidade.

-Então como vou ajudar o moço da rua ? - Tadeu perguntou entristecido, desviou seu olhar do pai, porém quando o olhou novamente viu que o seu semblante havia mudado, seus olhos estavam num misto de sarcasmo e deboche.

- Tadeu, tive uma idéia. - O tom de Pedro fez Tadeu prender a respiração, seu coração acelerou , sabia que algo de bom não viría de tanto entusiasmo. - Que tal você dar o dinheiro da casinha e da sua festa para o homem da rua. Você não quer tanto ajudá-lo ? - Ao terminar Pedro assumiu uma postura aliviada, achou um jeito de sair daquela situação e de não ter que explicar ao filho como a vida era dura para algumas pessoas. Entretanto, ao ver a reação do filho e seu ânimo diante de tal idéia, o grosso e robusto advogado ficou intrigado :

-Ótima idéia, aí ele pode alugar um quarto em algum lugar e morar lá !

O garoto ficou tão feliz com a idéia que seus olhos encheram de lágrimas, como não pensei nisso antes? Se perguntou Tadeu.

Comovido pela bondade do filho, na mesma tarde foi guiado pelo menino até a calçada onde o Mendigo dormia. Ao chegar bem perto, filho e pai puderam perceber que aquele homem não passava dos 20 anos. Seu rosto encardido e a barba por fazer o fazíam parecer bem mais velho. Pedro sugeriu que o rapaz fosse até o hotel mais proximo para tomar um banho, o advogado comprou roupas limpas e novos sapatos. E toda vez que olhava para seu pequeno sonhador, sentia algo remoer seu peito. Ele sabia que era culpa, por desprezar uma criança tão adorável, para se redimir Pedro decidiu dali por diante ouvir sempre com atenção as idéias de alguém que tinha um coração tão bom.

Sérgio era o nome do mendigo, que vinha de outra cidade para arranjar uma grande oportunidade e nada havia conseguido, então Pedro decidiu contratá-lo como seu office boy. Pagou algumas diárias do hotel e o resto o rapaz poderia pagar com seu novo emprego. O pequeno sonhador nunca sentiu tanto orgulho de seu pai como naquele dia, sabia que não esqueceria tal bondade.

E assim Tadeu conseguiu seu melhor presente de aniversário de todos os tempos...

Tainã Nunes
Enviado por Tainã Nunes em 06/01/2011
Reeditado em 12/01/2011
Código do texto: T2713202
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