O SUMIÇO DE GIGI, A ARARINHA AZUL - I

Foi o maior rebuliço no Cerrado, quando dona Lola sentiu falta de Gigi, a sua filha caçula.

Aonde foi parar essa menina? Ela grasnava desesperada, pois já era fim de tarde e elas tinham que se recolher na macaúba para dormirem. Além do mais, ficaria difícil procurá-la na escuridão, já que estavam naquelas noites sem luar e, afinal de contas, arara não era coruja, não conseguia enxergar de noite, sem o auxílio de alguma luz.

As irmãs de Gigi, Mel e Lua, foram inquiridas, mas ambas desconheciam o paradeiro da irmã. Mel se recordava de que Gigi as acompanhara na visita a dona Inês, no velho ingazeiro ao pé do rio, logo após o almoço.

- Será que ela ficou lá, brincando nas galhas com uma das filhas menores de dona Inês? Perguntou para si mesma dona Lola, em voz alta, refletindo para tomar uma decisão rápida.

O velho ingazeiro ficava a uma meia hora de voo dali onde ela estava. Entre a ida e a volta, gastaria uma hora. O sol estava se pondo naquele exato momento e a claridade avermelhada deixada por ele no horizonte duraria aproximadamente uma hora, o tempo, pois, que dispunha para ir até a casa de dona Inês e voltar, trazendo consigo a filhinha desmiolada.

Resolvida, pediu para seu Lauro, um tucano idoso que morava na macaúba ao lado, tomar conta de Mel e Lua e desapareceu no meio da mata, num voo aflito e sem paradas.

Chegou ao ingazeiro no tempo previsto e, para aumentar ainda mais o seu desespero, percebeu ali uma agitação anormal. Enquanto dona Inês chorava a um canto, consolada pelas filhas, o marido dela, seu Alberto, conferenciava com sabiás e bem-te-vis na galha vizinha.

- Oh, minha amiga, nossas filhas foram capturadas pelos caçadores! Grasnou dona Inês para dona Lola, ao abraçá-la, entre soluços. O ar sumiu para dona Lola e ela ficou sem saber o que dizer e fazer.

- Foi assim que você se despediu, hoje à tarde. Mariana acompanhou Gigi até aquele ipê amarelo ali na frente, ó, e foram atraídas por pedaços de mamão maduro colocados estrategicamente no chão, ficando presas na rede dos caçadores. Elas gritaram assustadas tentando se soltar, mas os homens estavam amoitados ali perto e, antes que pudéssemos esboçar qualquer reação, tiraram as duas da rede e as puseram separadamente em gaiolas de ferro, recolheram a rede e saíram apressados, pela trilha. Entraram numa barca que os esperava na beira do rio e foram embora, Deus sabe para onde! Disse isso e uma lágrima rolou de seu olhinho negro, revelando toda a dor que sentia no momento e que lhe machucava o coração.

Seu Alberto, os sabiás e os bem-te-vis que acompanharam emocionados a cena aproximaram-se para consolar as duas mães aflitas.

- Acalme-se, querida! Disse seu Alberto para a mulher. E a senhora, dona Lola, volte tranqüila para casa. Amanhã eu e meus amigos sairemos em busca de Gigi e Mariana e as libertaremos.

- Promete? Inquiriu dona Lola, chorosa.

- Prometo! Agora vá, antes que anoiteça e a senhora não consiga chegar a sua casa. Lembre-se que a senhora tem outras duas filhas para cuidar e que também devem estar desesperadas com o sumiço da irmã.

Dona Lola concordou, despediu-se de todos e voltou para junto das filhas, na macaúba do açude, contando-lhes o sucedido. Todas choraram e só muito tarde conseguiram fechar os olhos, num sono agitado e repleto de pesadelos.

Acordaram cedo na manhã seguinte e, diferentemente das outras manhãs, não saudaram alegremente o astro-rei, quando este surgiu, dourado e brilhante, na borda do céu.

Depois de roerem silenciosamente os coquinhos maduros da macaúba, voaram imediatamente para o velho ingazeiro, de onde acompanhariam as buscas, ao longo do dia.

( C O N T I N U A )