EXPERIÊNCIA TRAUMÁTICA (?)
Vovô veio me pegar em casa para levar-me com ele e eu lá, trancado pelo lado de dentro, sozinho... Minha mãe saíra para dar aula em outra cidade fazia uns quinze minutos. Meu avô, não se soube por que cargas d’água, não carregava nos bolsos a tal chave da porta. Bateu-lhe o desespero (ah, se houvesse celular naqueles tempos...) e, sem maiores dilemas, avaliou a situação como grave e convocou o corpo de bombeiros. Quem melhor do que os especialistas em situações de perigo? Logo que eles chegaram e tomaram pé da situação, procuraram a solução menos traumática para arrancarem-me logo de lá - como se eu estivesse me afogando no fundo de um poço escuro! Acho que resolveram que o melhor a se fazer seria arrombar alguma janela ou porta. Nem passou pela cabeça de ninguém simplesmente chamar um chaveiro. Para realizarem a “operação resgate” sem me assustarem, teriam que me acordar. Bateram com jeitinho na janela do quarto em que eu dormia. Acordei com dificuldade, totalmente ensonado e, do alto de meus quatro anos de existência, nem te ligo. Levantei-me só de meias aos modos de um sonâmbulo, fui ao potinho de vidro da sala de estar, encontrei num piscar de olhos a chave-reserva da porta dos fundos e entreguei pelo vão do vitreau ao bombeiro do outro lado. Automático, voltei para minha cama sem um desalento, um choramingo. Os bombeiros entraram logo em seguida, tomaram-me ao colo no meio do meu caminho de retorno ao quarto e ergueram-me nos ombros como fosse eu o herói da inconfidência mineira. Esse rompante desatinado dos brutamontes assustou-me muito mais do que todo o resto. Amedrontado, chorei por isso... Até hoje, depois de mais de quarenta anos, ainda não entendo o porquê daquilo tudo. Com certeza, havia raríssimos incêndios à época...