A menina que roubava lixos *

Conheço uma menina que anda pelas ruas à cata de lixos. Eu sei, você vai pensar que ela é muito pobre e sobrevive do que encontra no lixo dos outros. Bem, com Liliane não é bem assim que acontece. Ela não é rica, mas também não é tão pobre. Liliane, na verdade, não precisa do lixo para sobreviver, no entanto, a sua criatividade é que se alimenta e sobrevive do que a menina encontra no lixo.

O lixo que é produzido em sua casa tornou-se insuficiente para abarcar toda a criatividade e empenho da menina na realização de suas ideias. Foi por isso que, aos nove anos de idade, Liliane começou a roubar o lixo dos vizinhos.

Os vizinhos mais conscientes e organizados facilitam a vida da Liliane, pois quando ela ataca suas lixeiras na surdina, ali encontra já separadinhos todos os materiais que ela precisa para criar seus artefatos.

Quando, de outro modo, há nas lixeiras comuns objetos imprescindíveis para o exercício de suas habilidades artesanais, o jeito é colocar uma luva e, apesar do nojo, separar do lixo orgânico aquele o qual para Liliane chega a ser uma necessidade.

É claro que a mãe de Liliande não sabe dessas suas contravenções, pois ela sempre tem uma desculpa convincente para justificar sua coleção de bujingangas. Ela também as lava com muito cuidado e as organiza em caixas separadas com adesivos. Depois, cada objeto advindo das lixeiras vão se agrupando e se tornando arte.

Além de artista, Liliane também é uma empreendedora. Muitas de suas criações ela consegue vender para os colegas em sala de aula. Com o dinheiro, a menina consegue mais tintas e materiais importantes para o aprimoramento de seus trabalhos.

Apesar da pouca idade, Liliane conseguiu obter uma compreensão muito maior do que a de muitos adultos em relação ao lixo. Um dia, quando todos alcançarem essa mesma consciência, vamos finalmente entender o sentido de existir uma menina tão fabulosa quanto Liliane, mas que tem o estranho costume de roubar lixo.

* Kelly Vyanna. Membro da ACEIB/DF. Disponível em: www.aceib-gremioliterario-df.blogspot.com ou http://kelly-literatura.blogspot.com/