Sentado num ramo, o passarito via o sol subir no céu.Ensaiara o canto da manhã, comera uns tricos-tricos e meditava feliz.

Pilm!

Arrepiou-se todo o passarito novito, que já se esquecera da chuva de primavera, quando nascera.

- Que será isto?! Encolheu-se, estremeceu e abanou-se todo, aliviando a tensão.

Olhou para o céu, mas nada viu!

Plim! Plim!

- Ai que morro afogado! Gritou do cimo do ramo enxuto, céu azul, sol subindo… Espanejou-se todo, incomodado e aflito.

- Passarada doida! Bêbados de néctar até esta hora!

Refilou, apesar do silêncio:

- Seus morcegos vadios!

Plim! Plim! Hihihihi!

Ai, era demais!
… Agitou as asas e levantou voo… Num ápice estava longe, sentadinho e quieto. Agora, com a calma, vinha-lhe o sono.Fechou os olhitos e assim esteve até que, de novo, sentiu:

Plim!

De onde estava agora, alargava-se o horizonte.

Semi-serrou os olhos e virou a cabeça em todas as direcções. Um caule subia a pique, e lá de cima, sentiu:

Plim!

Pôs a cabeça de lado, indeciso.

- Céu azul, o sol subindo… que será isto?!

Deslizou o olhar para cima, seduzido pelo mistério.

No alto, uma melena amarela agitava-se contente e, de vez em quando, salpicos saltavam dela, que ria deliciada.

- Ó tu lá de cima! Chamou, ansioso por conhecê-la e ensaiando uma cantoria ensurdecedora.

A flor de melena amarela, mirou o pequenito, emproado que nem um peru do mato, e piscou-lhe o olho.

- Falas comigo, passarito dorminhoco?

- Dorminhoco, eu?!

Ora esta! Já tomara banho, cantara e comera, estava a tentar meditar enquanto o sol subia no azul do céu… E aquela cara de lua chama-lhe dorminhoco, a ele, um passarinho diligente e cumpridor?!

- Quem és tu, ó presunçosa?
- Eu?! Sou o espelho do sol na terra, não vês?

O passarito, de olhos em fenda, viu uma cara redonda com a barba mal feita e uma enorme cabeleira amarela que nem gema, recortada, abanando com toda a força.
- Sou um girassol, seu tolo, onde andas que não me conheces? Toda a gente me adoraaaa… E aos meus irmãos também!

Pequenino, pequenino, o passarito suspirou… 
- Que grande injustiça me aconteceu!

- Que resmungas aí em baixo, ó bico fino?

- Estou farto de ser molhado, sua flor orelhuda! Não sabes tomar banho sem fazer bagunça?

- Hihihihi… escangalhou-se em riso a flor.

Pois não! O meu pé não sai daqui… é a noite quem me lava e é o sol quem me enxuga.

- Sortuda!…Desavergonhada e vaidosa! Ia dizendo consigo o passarito.

Farto de conversa, voou alto, muito alto, tanto quanto conseguiu.Ficou assombrado, planando por um momento:O que via eram milhares de melenas brilhantes, desafiando o sol e aspergindo gotas de água por todo o lado.
Cansado, deixou-se levar pelo vento até uma árvore, num bosque bravio, onde se aninhou num ramo e, de novo, adormeceu.