Mila e o Sol
Mila e o Sol
Maju Guerra
No centro da Floresta Verdencantada morava Mila e sua família. Mila era uma menina bonita e simpática, com seus olhos cor de mel e uma grande trança castanha. Era amiga das pessoas, dos animais, das plantas, das pedras, do Sol, da Lua, das Estrelas, das Nuvens, do Rio, da Chuva, enfim de tudo o que existia. Como era do conhecimento de todos, para morar na floresta o respeito a tudo e a qualquer ser vivo era necessário, caso contrário não se poderia ali morar.
Mila gostava bastante de conversar com as flores, eram tão cheirosas, gentis e educadas, dava gosto. A Cachoeira, às vezes a Lagoa, contavam histórias de outras terras banhadas pelo Rio, os lugares eram bem diferentes e ela aprendia tanto, nem precisava viajar para lugares distantes. As Nuvens diziam do quanto era bom viver no Céu sempre azul, bem perto de Deus. As Estrelas e a Lua falavam como era prazeroso iluminar o Céu à noite. A Árvore das Folhas Coloridas, a maior e a mais frondosa de todas, fivaca sempre em silêncio ao emprestar sua sombra para Mila descansar e dormir. O Cavalo Baltazar se alegrava quando Mila pedia para passear, ele gostava de conversar com ela, era divertido e o tempo passava ligeiro. Ele voava quando queria, havia um par de asas nas suas costas, mas elas ficavam escondidas. Até o pântano era diferente, sempre muito limpinho, as águas claras refletiam a Estrela Dagmar, a mais querida e a mais amiga. O sapo Salomão cuidava do lugar com sua família que era das maiores que um sapo poderia ter, por isso davam conta de todo o serviço, feito com carinho, como não poderia deixar de ser. Ele dizia que não se fazia necessário que o lugar fosse sombrio e sujo só porque era um pântano. Cuidando tudo reluz e tem muita vida e graças a oferecer.
As crianças iam à escola, estudavam sobre todos os assuntos, brincavam de todas as brincadeiras que criança gosta, e em noite de lua cheia costumavam ficar em volta da fogueira para ouvir as histórias da Vó Dorinha, era cada história de dar água na boca.
Mila, porém, passava por um sério problema: não conseguia cumprir seus compromissos na hora marcada, além de ser um pouco desorganizada. Ela até pensava em mudar, mas pra falar a verdade não achava importante esse negócio de ordem e de hora marcada, era coisa mais de adulto, quando crescesse ela aprenderia, tinha certeza. Seus pais já não sabiam mais o que fazer. Conversavam com a filha, explicavam e explicavam, porém de nada adiantava.
Certo sábado de verão, Mila e os amigos marcaram uma pescaria bem cedo, era pescar e colocar o peixe de novo na lagoa, coisa muito divertida. Lugar de peixe é na água, lá só pescavam a comida necessária. E depois, um bom mergulho no rio e um banho de cachoeira. Os amigos apostaram se ela chegaria na hora, poderia ser que sim, poderia ser que não, quem saberia dizer? Mas a pescaria certamente aconteceria. Se Mila se atrasasse, iria depois como estava habituada a fazer.
O Sol, grande amigo da Mila, quando soube da pescaria, decidiu que lhe daria uma lição pra valer. Ele tinha certeza de que ela iria tomar jeito dessa vez, a lição seria inesquecível, para ela e para todos os habitantes da floresta.
No dia seguinte, o Sol não nasceu na hora que deveria. A noite continuou mesmo já sendo tempo do dia. Foi uma confusão só, ninguém entendia nada, o galo não cantou, as flores não se abriram, a bicharada ficou nas suas tocas, o padeiro não entregou o pão e nem o jornaleiro o jornal, ninguém apareceu na igreja pra rezar pela manhã, a criançada não sabia o que seria da pescaria... O Sol nasceu na hora que bem quis e não deu satisfação a ninguém, simplesmente fez o que lhe deu vontade, se bem que com a permissão divina.
Aquele sábado foi muito diferente, o silêncio e a apreensão reinavam. Os moradores da floresta, fosse gente, planta, pedra ou bicho, achavam que o Sol tinha enlouquecido.
Na hora certa ele se pôs. À noite todos foram conversar com a Lua e com as Estrelas e elas não sabiam o que poderia ter acontecido, ficaram muito intrigadas e atônitas também. Era um mistério, enfim. E todos foram dormir com muito medo de que o Sol não nascesse de novo na hora certa, aí o caos estava instalado.
No dia seguinte, porém, na hora certinha, lá surgiu ele no horizonte, o astro-rei majestoso e brilhante. Foi um alívio geral. Mila, amedrontada, acordou cedo naquele domingo e suspirou de alegria como todo mundo.
Assim que chegou ao céu da floresta, o Sol falou bem alto que, ao meio-dia em ponto, desejaria que todos estivessem na pracinha da cidade. Ele contaria o porquê de não ter nascido na hora certa no dia anterior.
Meio-dia em ponto estavam todos, mas todos mesmo, no lugar marcado, inclusive Mila. Assustados e curiosos ouviram a explicação do Sol, que olhou bem para Mila e falou com seu vozeirão:
- Mila, não nasci na hora que deveria por sua causa, como gosto muito de você queria que aprendesse. Você viu o que aconteceu por causa do meu atraso? Você já pensou o que aconteceria se cada dia eu nascesse em um horário diferente? Tudo no Universo tem uma ordem, precisa de organização. Então o mesmo você deve fazer, cumprir seus compromissos na hora certa e se organizar. É uma lição que se aprende desde pequeno. Eu aprendi a minha quando criança, quando Deus criou o Universo, e nunca a descumpri, é minha obrigação dar certeza às pessoas de que elas podem contar comigo, assim o Senhor me fez. E assim é.
Fez-se um silêncio geral, nem as abelhinhas voaram. Todo mundo olhava para Mila que estava bastante envergonhada. Ela agradeceu ao Sol o que lhe havia ensinado, compreendera tudo muito bem e ele estava certo. Pediu desculpas pelos problemas que havia criado e prometeu que, daquele momento em diante, seria pontual e colocaria ordem no que fosse preciso. Todos a desculparam e agradeceram também ao Sol, ele ensinara uma preciosa lição não só para Mila, mas para todos os seres. E assim, viva o Sol!
Mila cumpriu o prometido como deve ser, e gostou bastante da mudança, ficou satisfeitíssima com os resultados. Passou a ser conhecida como a menina mais pontual e organizada de toda a floresta, para alívio geral.
Maria Julia Guerra.
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