aventura em Jacareí

Na verdade nem sei como tudo começou. Estávamos sentados na porta da escola, esperando a condução chegar, que aliás estava atrasada só pra variar. Ana Clara, João Lucas, Jonas, Maria Cecília, Guilherme e eu. De repente alguém teve a ideia de atravessar a rua, como forma de aventura, só pra mostrar que era corajoso e esperto. Quando vi já estávamos todos do outro lado da rua. E como não apareceu ninguém para nos repreender, resolvemos dar uma voltinha no quarteirão, enquanto a condução não chegasse.

Conversando e dando risadas, andamos mais um pouco e descobrimos que não sabíamos voltar para a escola. Eu, mais velha, peguei firme na mão da Maria Cecília, a mais “pititinha” e seja o que Deus quiser. O Gui pulava e saltitava como um cabritinho. Ana Clara começou a chorar, Jonas e João Lucas não disseram palavra. No fundo, não estavam nem aí para o nosso desespero. Estavam adorando a aventura.

Entra rua, sai rua e nada de reconhecer o lugar onde estávamos. E nada de encontrar o caminho de volta pra escola. Alguém disse:

_Olha lá o Parque dos eucaliptos.

_Ah é mesmo, agora eu sei ir para minha casa - alguém disse.

_Me leva até sua casa? De lá ligo pra minha mãe vir buscar - disse Ana Clara parando de chorar.

_Boa ideia, vamos todos para sua casa de lá ligamos para nossas mães.

_Combinado, fechou, “belê”.

_Nossa!

_O que foi?

_A diretora da escola.

Olhamos todos e concordamos que era ela.

_Vamos nos esconder.

_Aonde?

_Naquele caminhão.

Havia um caminhão com as portas escancaradas. O Jonas entrou rapidinho, o João Lucas ajudou o Guilherme a subir e por ultimo a Maria Cecília e eu, entramos rapidinho e nos escondemos atrás de umas caixas, e esperamos até que a megera passasse. Aí escutamos um tranco, era a porta do caminhão se fechando por fora. No mesmo instante o caminhão começou a andar. Ana Clara voltou a chorar e o Gui perguntou:

_Para onde estamos indo?

_Sei lá - disse eu.

_Que massa, estamos perdidos e passeando dentro de um caminhão de margarina _ disse João Lucas.

_Como você sabe que é margarina, todas as caixas estão fechadas.

_Mas todas as caixas tem aquela menininha "xaropinha" da propaganda da televisão.

_É verdade, por isso tá tão frio aqui dentro - disse Jonas se achando muito inteligente, pela brilhante conclusão.

De repente o caminhão parou. As portas se abriram e novamente vimos à luz do Sol lá fora. Porque lá dentro estava muito escuro e o Guilherme estava entrando em desespero com medo do escuro.

_Já chegou? Perguntou a Maria Cecília abrindo os olhinhos apavorada.

_Sim querida, chegamos, vamos descer?

E enfileirados, como na escola descemos um por um, só que bem rapidinho para que ninguém nos visse.

Maria Cecília disse:

_Quero fazer xixi.

_Agora? Mas aqui não tem lugar.

_Tem sim, no tira-entulho - desta vez quem falou foi Jonas o sabe-tudo.

Olhei para Ceci que estava já trançando as perninhas, muito apertada. Sem tempo para pensar, Ajudei-a subir no tira entulho. Meio contrariada, desceu a calcinha e sumiu dentro do contêiner. O Gui também queria fazer xixi dentro do tira entulho, os dois mais velhos ajudaram ele subir. Enquanto isso tive tempo pra olhar as redondezas e reconhecer onde estávamos. Era a padaria do seu Zé Pontual, pertinho da minha casa, do outro lado da ponte.

_Gente, estamos salvos, minha casa é bem ali - apontei com o dedo numa direção do outro lado da rua.

Todos desceram correndo do tira entulho, menos o Gui que desapareceu no meio de uns papeis velhos.

_Guilherme! -gritei - ó Guilherme! - Não houve nenhuma resposta.

_Guilherme! - todos gritaram ao mesmo tempo e nada ninguém respondeu.

_Será que ele morreu? _ falou alguém

_Cala a boca, ralhei com eles.

_Guilherme! - insisti

_Estou aqui - apareceu contornando o tira entulho, todo sujo de areia, parecendo um bife a milanesa.

_Onde você estava moleque? - disse eu agora me achando a chefe da expedição. Afinal de contas estava pertinho da minha casa.

_Fui descer do tira entulho e caí naquele monte de areia.

_Porque não respondeu logo quando eu chamei?

_Eu estava rezando, estou com saudades da minha mãe - respondeu ele fazendo beicinho de choro.

Abracei-o com carinho e falei em seu ouvido:

_Não chore, já chegamos.

_Chegamos aonde? - Ele olhou em volta e acho que não viu nada familiar.

_Chegamos na minha casa.

_Aqui na padaria? Você mora numa padaria?

_Não, escuta só, moro naquela casa, do outro lado da rua.

_Não vou mais atravessar rua nenhuma, de jeito nenhum, nunca mais na minha vida. Atravessamos a rua da escola e agora não sei mais voltar pra casa buááááááá...

_Escuta aqui Gui, vamos até minha casa e de lá telefonamos para sua mãe vir te buscar, ta bom assim?

Os olhinhos de todos brilharam e eu como chefe auto denominada, dei as instruções:

_Temos que atravessar a rua de mãos dadas.

João Lucas e Jonas protestaram, não eram neném e nem bobos, pra andar de mãos dadas com ninguém.

_De quem é a casa? -gritei já sem paciência com aqueles dois sabichões que agora estavam sob meu comando.

_É sua né, - responderam ao mesmo tempo com muita má vontade.

_Então sou eu quem manda. Ou faz como eu quero, ou não deixo vocês entrarem. Não tinham escolhas, tiveram que concordar.

Atravessamos a rua de mãos dadas e ao tentar abrir o portão vi que estava trancado.

_Mãe - gritei a plenos pulmões - ô mãnhêêee - nada, ninguém respondeu.

_Minha mãe não está em casa, vamos pular o portão.

_Tem cachorro? - alguém perguntou:

_Não, nunca gostei de cachorro.

Ana Clara foi a primeira a pular. Subimos na caixa do hidrômetro, passamos a Maria Cecília e o Guilherme, o Jonas e o João Lucas pularam facilmente e por último eu.

Nossos pés sujos sujaram toda a varanda da minha mãe. Contornamos a casa e forçando o vitrô da cozinha, conseguimos uma abertura por onde passamos a Maria Cecília que abriu a porta por dentro e entramos com muita alegria. Finalmente um lar.

_Todos pro chuveiro! - Disse eu mostrando o caminho.

Tomamos banho um de cada vez, sem fechar a água do chuveiro. Invadi o guarda roupa e peguei roupas limpas para todos. Cada uma de um tamanho diferente. Depois comemos, frutas, doces e bolachas, pois estávamos famintos. Quando minha mãe chegou estávamos, limpos e alimentados, a casa estava de "pernas pro ar", mas estávamos salvos e saudáveis, isso é que importava.

Joana Aranha
Enviado por Joana Aranha em 06/08/2009
Reeditado em 06/12/2013
Código do texto: T1740549
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