Katiele, a índia da terra

Nada no rio, livre, como um peixe. Os cabelos negros molhados, escorridos, chegam quase à cintura; os olhinhos pequenos vivos abarcando o verde a sua volta, ouvindo o murmúrio das águas.

Nada todas as manhãs para estar ali, olhando o sol chegando de mansinho e brincando dentro da água; o voar dos pássaros e o desabrochar das flores na beira do rio. Ela vê nessas horas subir do lago uma fumacinha para o céu. Não entende bem o que é. Deve ser o calor da água subindo. Apenas observa. Um sentimento de que é parte de toda aquela natureza a envolve.

Seu mundo tem a índia Ailã com seus potes de barro pintados; os amigos maiores que a ensinam a fazer colher de pau, pilão e gamelas. Seu pai a dizer sempre que a melhor madeira para artesanato é piquiá e jatobá. Acredita nele. Ele sabe de muitas histórias.

Seu mundo tem dias ricos e pobres. Na falta das chuvas quase não têm alimentos. Nesses meses, gosta das tapiocas e beijus nas farinhadas de macaxeira colhida da terra e dos doces de cajus feitos nos tachos pelas mulheres da aldeia. O milho e feijão são colhidos quando as chuvas banham a terra, como hoje.

Vez por outra katiele corre na chuva e depois termina o banho no rio. Nesta manhã, começara a chover cedinho. Ela acordara com as pancadas das águas nas palhas de sua casa de taipe. A menina sorri da mãe brigando com ela em dias assim quando passa por baixo da rede dos irmãos menores e foge para banhar no rio. A casa só tem uma porta e já tivera de pular a janela para o pai não perceber suas saídas logo cedo. Ela se sabe livre como os pássaros.

Vez por outra conversa com os mais velhos. Eles falam de outra língua de seu povo. Ela não conhece. Apreende que é da tribo Tabajara. Vieram do Ceará para o Piauí. Muitas coisas que lhe contam parecem sonhos. Seriam? O homem já vivera sem lutar por terras? Não se encanta com os segredos dela e não a ama? Ele assente o ar no peito quando o vento sopra das montanhas? O que há de complicado para entender a natureza?

Todo caminho que ela ouve falar é difícil. Mas existem estradas. O homem é livre para amar a terra e seguir suas trilhas.

Todo caminho que lhe falam pode ter pisadas dos homens livres.

Teresa Cristina flordecaju
Enviado por Teresa Cristina flordecaju em 10/07/2009
Reeditado em 10/07/2009
Código do texto: T1691626
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