Rei Juba o Leão Arrogante

Certo dia, um leão de nome Juba, descendente de uma linhagem de bravos leões que dominavam as planícies africanas, descansava sob a sombra refrescante de uma frondosa árvore, quando Dona Marreca aproximou-se apavorada pedindo por ajuda.

----Sr. Leão! Sr. Leão! Por favor, Sr. Leão!

Juba, o poderoso leão, transbordando sua arrogância, mediu Dona Marreca dos pés a cabeça e a interpelou de maneira áspera:

----Oh, mísero animal! Como ousas perturbar o descanso do mais nobre, do mais belo, do mais poderoso e do mais forte dos animais que existe em toda selva africana.

----Desculpe-me Sr. Leão, não era a minha intenção despertá-lo de seu sono real, porém humildemente peço-lhe que me ajude a salvar o meu filhinho que caiu dentro de um poço e eu não consigo tirá-lo de lá.

----Oras, ínfima criatura, procure alguém que seja tão inferior quanto a você para ajudá-la, pois para mim seria humilhante desprender qualquer tipo de auxílio a alguém que não possua a mesma nobreza da qual eu e toda a minha família somos possuidores.

E sem dar a mínima para Dona Marreca, o poderoso leão virou-lhe as costas, ajeitou-se sobre o manto de sua arrogância e voltou a dormir o seu sono real.

Não demorou quase nada e eis que surge, desta vez, Dona Coelha saltitando toda apavorada.

----Sr. Leão! Sr. Leão! Acuda-me pelo amor de Deus.

E mais uma vez o leão despertou exalando sua ira por todos os lados.

----Oras, seu animal cretino, deveria devorá-la pela ousadia de despertar o mais nobre, o mais belo, o mais poderoso e o mais forte dos animais que existe em toda selva africana.

----Perdoe-me majestade! É que eu preciso urgentemente de sua ajuda. O meu filhotinho ficou com as patinhas presa sob o tronco de uma velha árvore que com os fortes ventos veio abaixo e eu não estou conseguindo tirá-lo de lá. O pobrezinho está sentindo muita dor.

----Te vira animal insignificante! Dê seus pulos! Não vês que estas diante do rei da selva. Como ousas pedir-me ajuda.

----Mas Sr. Leão...

----Cala-te! Suma da minha frente seu animal petulante! Procure alguém inferior igual a você para que possa ajudá-la.

E da mesma maneira como havia feito com a Dona Marreca ele o fez agora com Dona Coelha. Virou-se lentamente sob o peso de sua arrogância e voltou a dormir novamente.

Passaram-se alguns minutos e eis que surge desta vez Dona Raposa correndo feito um corisco e berrando pelos quatro cantos.

----Socorro!Socorro! Acudam-me!

De tão apavorada que estava não percebeu o Sr. Leão dormindo debaixo daquela árvore e acabou dando uma tremenda trombada com ele. O leão de imediato saltou para trás e posicionou-se para atacar. Ergueu suas enormes garras, abriu sua bocarrona cheia de dentes afiados e rugiu tão alto que quase derrubou as árvores a sua volta.

----Perdão majestade! Perdão! Eu não vi que o senhor estava dormindo debaixo desta árvore!

Gritou a pobre raposa tentando se explicar.

----Oras seu verme! È muita ousadia de sua parte acordar-me dessa maneira! Justo eu o mais nobre, o mais belo, o mais poderoso e o mais forte de todos os animais que existe na selva africana.

----Peço-te mil perdões, ó meu rei, mas é que devido ao meu desespero eu não percebi que vossa majestade deleitava-se dos bálsamos reconfortantes desta frondosa árvore. –

Justificou-se a raposa.

----Desespero do que? Sua retardada! Será que hoje todo mundo resolveu tirar o dia para irritar-me com essa mania de desespero!

----Mais uma vez eu te peço perdão por esse meu ato desastroso, mas é que o meu pobre filhinho ficou preso a uma cerca de arame farpado construída pelo homem e por mais que eu tente não consigo desenroscá-lo de lá.

Explicou-lhe a pobre raposa.

----E o que eu tenho a ver com isso? Se está pensando que vou ajudá-la estas redondamente enganada. Eu o rei da selva, o mais poderoso dos animais, não vou me rebaixar ao ponto de prestar auxílio a um animal tão insignificante como você. O máximo que posso fazer por vossa pessoa è dar-lhe a honra de servir-me como jantar. Agora suma da minha frente antes que eu a devore com uma só abocanhada.

E como fizera das outras vezes acomodou-se sob a sombra da frondosa árvore e continuou seu majestoso descanso.

E a tardezinha, quando o sol anunciava o crepúsculo vespertino de mais um dia, tingindo a abóboda celeste de um tom avermelhado tão intenso, que dava a impressão de que o céu se consumia em labaredas, eis que o leão, o senhor de todos os mais, resolveu levantar-se de seu recanto aconchegante. Colocou-se em pé majestosamente, espreguiçou-se como se fosse o mais poderoso de todos os reis e sobre a nobreza de seus passos musculosos afastou-se dali morosamente.

Não muito adiante encontrou-se com Dona Marreca, Dona Coelha e Dona Raposa, todas com seus filhotes, que através da união entre elas conseguiram salvar seus pequeninos. O leão empinou o nariz, franziu a testa e passou por eles sem dar-lhes a menor atenção.

Não havia caminhado quase nada quando se ouviu por toda a floresta um urro de dor tão alucinante que ecoou por todas as planícies, montanhas e vales dos domínios Africanos.

Pobre leão, andava tão absorto em sua arrogância, vestido ridiculamente com o manto da prepotência, que nem percebeu a armadilha colocada por caçadores em meio a uma das trilhas da floresta.

Quase teve a perna decepada. Fora abocanhado de surpresa pelos dentes de aço da maldade humana.

Dona Coelha, Dona Marreca, Dona Raposa, e seus filhotes, sem pensarem duas vezes correram em auxílio ao Senhor Leão.

----Pelo amor de Deus me libertem desse troço.

Suplicou desesperado o pobre leão.

O sangue vertia de sua perna tingindo o chão, que ficou tão vermelho quanto ao céu em seu entardecer daquele dia abrasador.

Num esforço quase descomunal os três animaizinhos e seus filhotes conseguiram desarmar a armadilha e libertar o pobre leão daquela situação desumana.

Assim que se viu livre o leão cambaleou feito bêbado tentando procurar o seu refúgio. Porém desabou pesadamente sobre seu próprio corpo. A dor fora tão grande que o Rei Juba, o senhor de todos os mais, prostrou-se desmaiado ao solo.

Dona Marreca deu a idéia de improvisarem uma maca. Assim que terminaram de construí-la com alguns galhos secos, que seus filhotes conseguiram encontrar pelas proximidades, puseram o leão sobre ela e com muito esforço levaram-no para um lugar seguro.

Acordou somente no outro dia quando o sol derramava os seus primeiros raios matinais sobre a relva molhada da floresta.

Atordoado, abriu os olhos vagarosamente e com a visão ainda meio turva conseguiu distinguir com muita dificuldade os animaizinhos que o haviam salvo. As mesmas criaturinhas a quem ele, arrogantemente, havia negado auxílio.

Pela primeira vez o Rei Juba baixou os olhos para alguém. Nunca sentira tanta vergonha como sentia naquele momento. A dor que agora o envolvia era ainda maior que a própria dor do seu ferimento.

----Porque vocês me ajudaram se eu lhes neguei ajuda. Se não fosse por vocês certamente a esta hora eu estaria preso em alguma jaula ou quem sabe talvez estaria prestes a me tornar um troféu para a sala de algum granfino inescrupuloso.

----Nós apenas aplicamos um dos ensinamentos do evangelho de Jesus: "Ajudar alguém sem olhar a quem." --- Rebateu Dona Coelha.

----Não existe valor maior do que a humildade. E nem prazer algum que se compare ao ato do amor ao próximo. A caridade nos faz evoluir, e fora dela não existe salvação! ---Ressaltou Dona Marreca.

----A nós é dado o livre arbítrio para lutarmos pela melhoria de nossas condições materiais aqui na terra. Porém quando não existe respeito e humildade e, no lugar dessas virtudes, nós optarmos pelo orgulho, pela prepotência e pela arrogância, com certeza estaremos a centenas de milhas da perfeição e nunca conseguiremos ser o melhor em nada. –

Concluiu Dona Raposa.

O leão abaixou a cabeça ruborizado, depois olhou firmemente para as três e disse:

----Apesar de tudo o que aconteceu eu ainda continuo achando que sou o mais-mais!

----O senhor ainda pensa dessa maneira?

Indagaram as três a uma só voz.

----Penso sim! Todavia de maneira diferente! Agora cheguei à conclusão de que eu sou o mais idiota, o mais besta e o mais estúpido de todos os animais aqui da floresta.

Todos se abraçaram e começaram a rir gostosamente, pois haviam percebido que o Rei Juba, o arrogante, havia aprendido a lição.

E naquela manhã, que prenunciava a chegada da primavera, o sol exalava fulgurante seus caridosos raios benevolentes sobre a selva Africana. Borboletas aos bandos revoavam graciosamente sobre as flores multicoloridas que enfeitavam as planícies e os vales verdejantes. Um doce aroma de jasmins e violetas bailava ao sabor da brisa que acariciava a relva ainda umedecida pelo orvalho da madrugada. Enquanto isso os beija-flores, numa coreografia excitante, beijavam apaixonados os lírios e as avencas que floresciam exuberantes pelas ravinas africanas. Uma paz de espírito sem tamanho envolvia os riachos, os lagos, os rios e as nascentes de toda a floresta como que querendo dizer: “Ninguém é mais perfeito que a mãe natureza, pois ela sim é a maior obra de Deus”.

FIM