O Fim do Eco

O Fim do Eco

A cidade estava suja e fria. As ruas, cobertas por uma camada fina de chuva e sujeira, refletiam a luz das lâmpadas de um cinza opaco. O vento cortava como uma lâmina afiada, e as pessoas pareciam caminhar sem propósito, seus passos abafados pela imensidão do silêncio. Apenas os ecos de suas próprias vidas ressoavam nas calçadas desertas.

Catarina e Miguel estavam sentados em um banco, perto de uma praça deserta, onde os arranha-céus se erguiam como monumentos ao nada. Eles se conheciam há anos, mas nem o tempo nem as palavras conseguiram preencher o vazio que os habitava.

Miguel olhou para o horizonte, onde as nuvens pesadas se arrastavam sem rumo, refletindo a mesma inércia de sua própria alma.

Miguel: “Você já parou pra pensar que estamos todos apenas esperando o inevitável? Cada passo, cada palavra, tudo... apenas ecos. Não há nada esperando por nós, Catarina. Nem mesmo a morte nos dará paz. O que resta?”

Catarina: “Eu não sei... O que é que resta, afinal? Se a morte não é um alívio, se o nada que vem depois não é um consolo... o que nos motiva a seguir? Eu vejo as pessoas, todas tão ocupadas, como se alguma coisa ainda tivesse valor. E o que conseguimos, Miguel? Nada. Nada que importe.”

Ela falava baixinho, como se não quisesse que o vento levasse suas palavras. O silêncio entre eles era espesso, quase palpável.

Miguel: “Às vezes, eu penso que talvez a única coisa que nos mantém é o medo do que viria se parássemos de lutar. Mas... e se a luta for em vão? O que se perde no fim, Catarina?”

Catarina: “A luta não nos torna mais do que máquinas tentando não parar. Vivemos por viver. Como se em algum momento tudo fosse se encaixar, como se o vazio fosse algum tipo de sala secreta, esperando ser aberta. Mas não existe essa sala, Miguel. O vazio é tudo o que há. E o que fazemos com isso? Nada. Só continuamos a rodar.”

Ela olhou para o chão, como se tentasse ver algo, mas havia apenas a lama e as folhas secas, misturadas com restos de papel e plástico. Nada mais. O vento açoitava seus rostos, como se quisesse silenciá-los.

Miguel: “E se, no fundo, estivermos buscando uma mentira? Aquela ideia de que um dia vamos ser algo mais. Como se a vida não fosse uma sucessão de momentos, mas uma escada a ser escalada. Talvez... talvez a verdadeira coragem seja encarar que não há nada depois. E que nem a dor tem algum valor.”

Catarina: “Sim... e se nós dois parássemos agora, se deixássemos tudo ir? Se não buscássemos mais respostas, mais verdades, mais 'algo'? O que seríamos, Miguel?”

Ela virou a cabeça e olhou para ele. Seus olhos estavam vazios, mas ainda assim, havia um brilho sombrio, como se algo ainda resistisse à desesperança que os envolvia.

Miguel: “Talvez seríamos apenas humanos. E talvez isso seja o suficiente. Ou talvez seja tarde demais para qualquer coisa ser suficiente. Estamos em um ponto sem retorno, Catarina.”

Ela suspirou e se recostou no banco, olhando para o céu. O cinza das nuvens se fundia com o tom das ruas e das suas vidas. Não havia lágrimas, apenas uma quietude que se estendia para além de qualquer esperança.

Catarina: “Eu sempre imaginei que, no fundo, as pessoas que buscam sentido sejam as mais corajosas. Mas agora vejo que talvez elas sejam apenas as mais tolas. Porque o sentido... não existe. E, mesmo assim, continuamos. Continuamos até que o próprio tempo nos desfaça.”

Miguel: “Sim. Continuamos até que nos dissolvamos no vento, até que os ecos se calem, até que o nada nos engula. Não somos mais do que o reflexo de uma ideia vazia, uma sombra tentando dar sentido à sua própria inexistência.”

Os dois ficaram em silêncio por um longo tempo. O vento uivava, e a cidade ao redor continuava seu curso, alheia à desesperança que se instalara no peito de ambos.

Finalmente, Catarina se levantou e, com um olhar cansado, começou a andar.

Catarina: “O que restou de nós foi o vazio. E no fundo, sabemos que nada vai mudar. Então, só... siga. Não há mais por que parar.”

Miguel a observou, e, após um momento de hesitação, seguiu seus passos, caminhando ao lado dela pela estrada de concreto fria e sem sentido.

O mundo continuava a girar. Eles continuavam a caminhar. Mas, no fim, havia algo mais sombrio do que o silêncio.

O eco.

(Eduardo Andrade)
Enviado por (Eduardo Andrade) em 25/12/2024
Código do texto: T8226887
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