ATORMENTADO, PERAMBULANDO PELAS TREVAS
> Texto intrinsecamente relacionado ao Fantasma da Ópera;
> Uma breve releitura;
> Contém spoilers.
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Dentro da escuridão densa dos bastidores silenciosos, a sombra taciturna e perturbada vagava clandestina. A sua capa pesada produzia um farfalhar medonho, que quando captada pelos ouvidos de outros mortais, causava arrepios e espanto. Pelas dependências dali, caminhava mudo, quando não havia olhos para presenciarem seu andar tristonho. Mas coitado daqueles que por ventura cruzassem seu caminho por acidente, a alma só faltava abandonar-lhes o corpo pálido e pasmo. Por isso escondia-se. Miserável, atormentado ser, outrora gênio! Lá dos tempos passados de sua glória. O seu viver e morrer parecia estar fadado àquelas penumbras solitárias. Oh Deus, tenha piedade deste pobre fantasma!
Estaria, de fato, fadado à solidão? Pois, a perspectiva de sua miserável vida foi mudada quando o canto angelical daquela que se tornaria sua almejada salvação, guiou-o ao caminho de sua tão procurada iluminação. Os olhos fantasmagóricos, desejosos, nunca haviam de ter pousado em tão preciosa criatura. Christine!
O que a mente maquiavélica do fantasma solitário não planejaria para ganhar o coração de Daaé… Com os ouvidos grudados às paredes, camuflado, ouviria aos diálogos e preces que a cantora dedicava ao pai falecido. Uma informação aqui e outra ali. Sem escrúpulos ousaria de usar das artimanhas mais diabólicas guardadas no fundo de sua mente engenhosa. Não obstante de já servir de lenda temível por toda à Ópera, tornaria-se criatura e mentoria celestial aos olhos de sua cobiçada amada. Erik se transformaria no Anjo da Música e Mestre de Christine, a fim de lhes roubar o coração, amor e adoração. Mas mal colocou os planos em ação e os obstáculos já começariam a aparecer. Inferno! Maldição! Será que um homem não tinha o direito de viver de uma história de amor sem empecilhos para atrapalhar?! Fosse quem ou o quê, que se metesse no caminho de sua felicidade, final feliz o maldito não teria.
Fantasma, Diabo, Anjo, Mestre, e logo, carrasco da mulher querida. Sua vida parecia destinada à trágica sucessão de fatos agourentos, funestos. Pobre criatura, pobre homem! O plano poderia ter sido o mais brilhante, mas ainda assim, não conseguiu conquistar o amor de Christine. Pensou que seria capaz de tomar o amor dela mesmo que à força.
Pobre fantasma! Viu seu plano arquitetado ir por água abaixo. Que benefícios obteria de manter-se preso a alguém cujo coração não pertencesse a ele? O que poderia aquela situação lhe trazer? Certamente, dor e amargura! Manter Christine cativa só traria angústia a ela, e a ele. De certo que detestaria a si mesmo todos os dias ao ver sua tão amada, abatida. Quem afinal teria a coragem de conviver com um monstro feito ele?!
O pequeno resquício de humanidade, que nem mais parecia existir dentro de si, foi resgatado pela gentileza de Daaé, quando num momento de vulnerabilidade e misericórdia abaixou-lhes a máscara e o beijou. Feito tão simples, porém, causador de tórrida redenção.
"Ah, vais Christine, vais embora. Por Deus, tudo isso foi um tremendo erro!"
Daaé partiu junto de Raoul. Enquanto que o mísero fantasma permaneceu enfurnado nas trevas, aceitando amargamente seu destino de solidão e sofrimento. Morreu sonhando com cenários em que Christine oferecia de seu amor por livre e espontânea vontade. O amor era salvação, mas também destruição. E ele lamentou-se nas sombras até seu último suspiro.
"Perdoe-me, Senhor. Apenas desejei ter para mim uma companheira, uma esposa, amante, confidente a quem pudesse viver o resto desta minha vida miserável! Alguém que fosse meu lar, amasse-me de todo o coração, me aceitasse, não temesse este rosto meu desprovido de beleza! Apenas tive o desejo que todo homem tem nesta vida: uma mulher amada, a quem eu pudesse amar e dedicar às mais belas canções, e que no fim ela apenas me retribuísse com amorosidade. Afinal, debaixo desta monstruosidade, há um coração humano que desejava nada além de carinho e afeto."