O acompanhante

Maisie Tregoning havia se atrasado na volta para casa naquele fim de tarde, e perdeu o último ônibus que vinha de Odgers' Marsh. Pegar o transporte era necessário menos pela distância até sua casa, do que pelo ermo que teria que atravessar pelos campos até ela. A região era escassamente povoada e cercas de propriedades rurais e renques de árvores margeavam a estrada de terra; normalmente, não se via vivalma, o que de certa forma era um alívio para a jovem que caminhava só.

O crepúsculo já havia caído quando viu o animal deitado à margem duma curva da estrada. Parecia descansar e ergueu a cabeça quando ela se aproximou: contra a areia branca, destacava-se negro e imenso, como uma besta de presas brancas e olhos amarelos. Maisie parou no meio do caminho, pensando que, se corresse, o animal a pegaria em dois saltos; todavia, ele não parecia hostil, apesar da aparência medonha. Maisie recomeçou a caminhar, devagar.

- Bom garoto, - murmurou à medida em que se aproximava - bom garoto...

Não havia lobos naquela região há séculos, mas a criatura lembrava um, apesar de nunca ter visto algum pessoalmente. O animal ergueu-se vagarosamente, abriu a bocarra e arqueou o lombo, espreguiçando-se. Maisie parou novamente, sentindo a tensão percorrê-la de cima a baixo. O animal então dirigiu-se a passos lentos para o meio da estrada, à frente dela, e olhou para trás.

- Posso continuar? - Indagou Maisie, baixinho.

O animal abanou a cauda e começou a andar, sossegadamente. Maisie seguiu-o, um pouco menos apreensiva; pelo menos, a criatura estava indo na mesma direção que ela...

Lá pelas tantas, com as primeiras estrelas no céu, Maisie avistou um grupo de rapazes, provavelmente trabalhadores de alguma propriedade próxima, sentados numa cerca à beira da estrada, bebendo cerveja e falando ruidosamente. O animal olhou para trás, como que para ver se Maisie o seguia, e continuou avançando imperturbável. A conversa morreu quase que de imediato; os rapazes apenas olharam em silêncio para a garota e seu acompanhante, enquanto eles passavam.

Quando as luzes da vila finalmente estavam a poucas centenas de metros de distância, o animal olhou pela última vez para trás e depois mergulhou silenciosamente no mato à margem da estrada. Maisie virou-se e suspirou, aliviada: ninguém a estava seguindo.

Sem sombra de dúvida, graças ao seu imprevisto guardião.

- [24-02-2022]